QUANDO UM DIA EU DEIXAR DE SER VAQUEIRO...

“QUANDO UM DIA EU DEIXAR DE SER VAQUEIRO

VOU CHORAR COM SAUDADE DA BOIADA”

(Desconheço o autor do mote)

(Glosas de Carlos Aires)

Se um dia eu vier envelhecer

Sem poder montar mais meu alazão

Quando eu ver pendurado o meu gibão

Sei que perco a vontade de viver

Também sei que bastante irei sofrer

Sem poder tirar leite da malhada

Porém quando acordar de madrugada

Vou ficar lamentando o tempo inteiro

“Quando um dia eu deixar de ser vaqueiro

Vou chorar com saudade da boiada”.

Quando eu não puder mais enfrentar

Uma vaca parida ou um boiato

Nem puder correr mais dentro do mato

Vai ser muito difícil suportar

Eu prefiro sequer nem me lembrar

Pois a vida vai ser amargurada

E quem sempre viveu nessa jornada

Vai sentir-se igual um prisioneiro

“Quando um dia eu deixar de ser vaqueiro

Vou chorar com saudade da boiada”.

Quando as pernas perderem a sustança

Minha força cair pela metade

Estando a vista já na opacidade

De mim mesmo eu perco a confiança

E os efeitos cruéis dessa mudança

Faz que eu pare de vez a caminhada

Quando a vida me der essa pancada

Não serei mais risonho e prazenteiro

“Quando um dia eu deixar de ser vaqueiro

Vou chorar com saudade da boiada”.

Se eu perder o contato com o gado

O meu peito de certo fica aflito

Meu aboio saudoso e tão bonito

De repente irá ficar calado

Quando eu não der mais conta do recado

Vou sofrer por perder essa parada

E se Deus resolver fazer chamada

Vou lembrar no suspiro derradeiro

“Quando um dia eu deixar de ser vaqueiro

Vou chorar com saudade da boiada”.

Quando eu não puder ir pra cocheira

Cortar palma e capim, fazer ração

Não puder colocar boi no mourão

Pra capar, pra ferrar, curar bicheira

Isso tudo que eu fiz a vida inteira

E me ver sem poder mais fazer nada

A matéria estará debilitada

E eu tristonho sentado no terreiro

“Quando um dia eu deixar de ser vaqueiro

Vou chorar com saudade da boiada”.

Não desejo viver só de pensar

Que fui jovem tão bravo e tão forte

Eu prefiro que Deus me mande a morte

Pra que eu possa pra sempre descansar

E a tumba em que eu quero repousar

É uma vala na terra esturricada

Minha alma estará bem sossegada

Nesse clima matuto e catingueiro

“Quando um dia eu deixar de ser vaqueiro

Vou chorar com saudade da boiada”.

Carlos Aires 02/12/2012