NÃO DEVO TEMER A MORTE

NÃO DEVO TEMER A MORTE

 

Eu não devo temer a morte,

Mas devo aceitá-la entre nós,

Pois não é questão de sorte,

Mas um norte para algo após.

 

Não podemos fugir das certezas,

Só assim tudo nos será natural,

Como os dias são postos à mesa,

Caso acordes com a fome animal.

 

Certo é o que há no vão sideral,

Mesmo que eu não olhe para o céu,

Como há mais no mundo abissal,

Do que enxergo através de um véu.

 

Tu não vais imaginar o que eu sou,

Se não comeres o sal junto a mim,

Mesmo que eu lhe diga que eu vou,

Mas na hora 'h', há ciúme, há sim!

 

Não é fácil entender outras línguas,

Se já nem falo comigo ou contigo,

E nem moro ao lado de elfos e ninfas,

Ou nem sonho em ter muitos amigos.

 

Se eu construo castelos e muros,

É porque tenho medo do convívio,

Ou nem fui amado e temo o futuro,

Pois assim, acho que sobrevivo.

 

Mas a vida me chama para festa,

E não me quer recluso na caverna,

Quer me ver sentir o sol na testa,

Tudo enquanto o tempo inverna.

 

E assim, numa sutil jornada,

Entre tropeços e busca no escuro,

Estarei sempre a postos na escada,

Pois os degraus me fazem maduro.

 

Se eu ando ou se fico estático,

Tudo isso me difere das rochas,

Pois a vida é do corpo linfático,

Nos dias que o sangue transborda.

 

Agora, não devo temer a vida,

Se já não tenho temor à morte,

E outra dimensão já me convida,

Sem conversas de azar ou sorte.

 

Por isso, nem sempre me ouças,

Mas se quiseres, ouça algo mais,

Fale de tudo, até mesmo de coisas,

Que não saibas de que sou capaz.

 

Estarei por aqui e por um tempo,

No aguardo de onde o vento levar,

Pois o giro da Terra é convento,

Que me intui a viver e a sonhar.