AQUI OU ALÉM DA BAHIA
Certa vez eu quis ver o Brasil,
Mas pensei que a Bahia me basta,
Pois aqui há um céu mais anil,
Desde quando a Chapada arrasta.
Mas é quieta numa gruta profunda,
Onde os morcegos revoam sem luz,
E até vagalumes são o que abunda,
Na margem da noite que me seduz.
Ao entrar na Chapada senti o solo,
Pois vi cor na água e dos minerais,
Corantes vermelhos e ouro no colo,
Que vêm dos regatos e são naturais.
Vi as gameleiras na borda da gruta,
Ou junto dos rios, tramando no chão,
Mostrando ter água na forma bruta,
Rompendo a encosta como o Buracão.
Aqui na Bahia temos pumas e gado,
Além da caatinga e da água quente,
Tem véu na Fumaça e o Poço Encantado,
Tem praia e restinga, peixe e gente.
Foi nessas paragens que vieram naus,
Trazendo malandros querendo preguiça,
Pois quando alguém é presa dos maus,
É porque não sabe um terço da missa.
Mas tudo que houve gerou o Brasil,
Pois antes não era de dono algum,
Foi quando a geleira aqui nos uniu,
Trazendo da origem a forja de Ogum.
Os homens se formaram em África,
Só não sossegaram, nem lá nem aqui,
Morando até no frio da Antártida,
Porque não iriam saldar com oriki?
Por causa do tempo e do espaço,
As línguas vieram para expressar,
E em cada livro tem linha e traço,
Registros da fala em cada pensar.
Se eu não me entendo com todos,
Preciso me olhar além da Bahia,
Desde que o pão difere nos fornos,
Pois há padeiro de noite e de dia.
Podemos usar os mesmos temperos,
Mas é pelas mãos que vem o sabor,
Bem como no tempo nem tudo é vero,
Pois cada ciclo tem o seu valor.