Dotô, a parti d’agora,
Acho qui chegô a vez
De falá pra todo mundo
Sobre a minha matutez,
Ieu, sempre fui grosso e rudo,
Mim criei sem tê instudo
Já tô véi, quaje no fim,
Cá cara cheia de creca
Mulambento feito um Jeca,
Mai gosto de sê anssim.
Minha mão sempre foi grossa
Mode meu trabai pesado
Ieu nunca usei um sapato
Meus caicanhá são rachado,
Lá im casa só tem tráia
Fumo um cigarro de paia,
Minha mió diversão
É incuitá os passirim,
Pois passa longe de mim
O raido e a trelevisão.
A minha casa é de taipa
E o teiado é de capim,
Pro dotô isso num presta
Já pra ieu, nunca foi ruim,
Cumbina quesse meu jeito
E vivo tão sastifeito
Qui lhi inspricá inté posso,
Pois só visito a cidade
Conde há nissidade
De i lá comprá aigum troço.
E conde a tarde insmorece
O sol fraco e sonolento
Drome pur dentraz do monte
Donde faz seu apuzento
Pelas baxada do campo,
Dá pra vê os pirilampo
Piscano dento da mata.
O vento açoita as parmêra
E a lua bela e facêra
Instende o manto de prata.
Aqui conde o dia chega
Adispois qui a noite finda
Dá gosto mode se vê
As paisage tão linda
O sol dourano as campina
Inquanto a branca nebrina
Inxagua a cara da serra
Mostrano toda beleza
E anssim dando mais pureza
As coisa da minha terra.
Aqui vivo assussegado
Pruque nada mi aperreia
As sete da noite eu deito
Me alevanto as quato e meia
Pra vê o quebrá da barra,
E inscuitá a cigarra
Anunciano o verão,
Essa, é a vida qui cunheço,
E sempre a Deus agradeço
Pru sê fio desse chão.
Trabaio de sol a sol
E nunca fico infadado
O meu sustento é do pouco
Qui tiro do meu roçado,
Im Deus, nunca pêico a crença,
Na caima sem disavença
Sem moitim nem cara feia
Vivo im prefeita aimunia
Sem ir na delegacia
Nem nunca entrá na cadeia.
Num tenho inveja daquele
Qui robô pra inrriquecê
E hoje vevi atraz da grade
Pruque feiz pru merecê.
Ieu, num pego num tustão
Mai sô rico meu patrão!
Pois tenho a honestidade
Cuma meta a sê cumprida,
E assim revoo pela vida
Nas asas da liberdade.
Carlos Aires
08/04/2016