No dia que eu nasci
Qui a parteira pegô
Foi pegando e dizendo
É o rei dos cantadô.
Minha mãe mi jogô fora
Mas o pai de mim cuidô
Fiquei mal acostumado
Qui nem no roçado eu vô.
Um dia fui cunvidado
Para cantá cum Malaquia
Mãe dixe qui eu num fosse
Minha vó qui eu num ia.
Meu pai num falô nada
Vi qui ele cunsistia
Me ajeitei na certa
Qui naquela noite eu fugia.
Cantei na sexta e no sabo
O domingo todo dia
Vim dar vorta no cabra
Sigunda fera mei-dia.
Ganhei um bode melado
Meia cuia de farinha
Arrumei uma namorada
Que se chamava Chiquinha.
Cheguei in casa cantando
Cum ela no pensamento
Minha mãe mi isperava
Cum outro divertimento.
Quando lhe dei a bença
Ela vêi cum chiqueradô
Mi deu tanta lapada
Qui inda hoje eu sinto dô.
Quem nasce pra ser poeta
Nas banda do meu sertão
Já cresce dizendo lôa
Cantando verso e canção.
Não precisa ir pra escola
Pra mode aprender a lê
Tira o verso na cachola
Cuma todo mundo vê.
A gente vai crescendo
Na vida tumando jeito
Jogando pra fora as mágoas
Que guarda dentro do peito.
Cuma canta o sabiá
Cum voz bela e sonora
Cuma canta a mãe da lua
E a tarde a siricóra.
Eu também jogo fora
As mágoas qui tenho no peito
Assim cuma a sabiá
Vivo alegre e satisfeito.
Quando a gente nasce
Demonstrando ser poeta
Os parente mais vei diz:
Aquele cabra num presta.
Cada um pra o qui nasce
Seja pra roça ou dotô
Cordelista ou violeiro
Dentista ou agricutô.
Digo na prosa da frente
Num precisa que me assãe
Cuma qui nasce o poeta
Cuma é que nasce a mãe.