Obrigação de ser feliz

Para quem leva a sério as pesquisas de comunidades no Orkut há sempre a recompensa de algumas realmente interessantes. É o caso do “Café Filosófico ‘Das Quatro’”, que no meu último acesso estava com mais de sete mil membros. Esta comunidade tem a proposta de debater temas genuinamente filosóficos, sem que haja a necessidade de enfoques acadêmicos e sem o pressuposto de que os participantes dos fóruns sejam da área.

Em um de seus vários tópicos mais antigos o assunto girava em torno de uma questão realmente intrigante: “o ser humano tem a obrigação de ser feliz?” Algumas opiniões revelam o quanto é fundamental insistirmos em debates como este. São de respostas e novas indagações que, muitas vezes, encontramos saídas para problemas cotidianos aparentemente insolúveis.

Um dos participantes desse tópico acredita que felicidade é uma opção, já que existem diversos meios para se estar feliz e outros tantos apontando o contrário. O difícil, disse ele, é que a sociedade contemporânea força um padrão de eterna felicidade.

Outra pessoa, nessa mesma linha de pensamento, questiona o motivo de tanta obsessão por uma felicidade padronizada, falsa na maioria das vezes. Sua colocação seguinte é certeira e perspicaz: “poderiam até trocar o termo por ‘ter feliz’. Há uma distorção sistemática e massificada da felicidade no mundo de hoje; a maioria passa a vida tentando comprá-la a qualquer preço e morre nos juros e correções monetárias sem ter vivido o melhor dela”.

Dois participantes defendem que a felicidade permeia a vida humana e consegue existir independentemente dos rumos que ela toma. Um deles define felicidade como “um pano de fundo sereno, que não é totalmente atingido pelas vicissitudes da vida... As ondas sobem e descem, mas esse plano sereno não é atingido... Viver nessa linha de equilíbrio traz paz, traz a própria felicidade”. O outro disse acreditar que a felicidade propriamente dita não é deste mundo. “Existem, sim, muitos momentos felizes, apenas isso. São estes momentos que devem ser vividos completamente, desde que não interfiram, não prejudiquem a felicidade alheia”, opinou.

Citando o filósofo Arthur Schopenhauer, um “degustador” do café filosófico deu uma aprofundada no tema, escrevendo a seguinte frase: “viver é sofrer, não existe satisfação durável. O mal é inerente ao homem e a felicidade é temporária. Mas temos por obrigação superar as dores do mundo. Não é uma proposição coercitiva, mas uma noção de que a busca e a contemplação pela verdade nos envia ao bem, à felicidade”.

Na minha contribuição ao tópico, eu ressalto que a nossa verdadeira "obrigação" (entre aspas mesmo) é a de lapidarmos a nossa própria existência. Digo, em seguida, que se colocarmos em questão a própria palavra obrigação relacionada à felicidade teremos que definir primeiro a quem devemos a obrigação de sermos felizes.

Os que acreditam que somos criaturas de Deus talvez se sintam devedores dessa obrigação a Ele. Por sua vez, os que acreditam que tudo começa e termina aqui, sem qualquer interferência divina, talvez devam ser felizes por obrigação a si próprios. Eu acho, no entanto, que qualquer das duas opções pressupõe entender felicidade como sinônimo de uma busca por ser melhor em todos os sentidos, de uma superação contínua.

Lapidar-se, então, é tentar se superar tanto na alegria, na vitória e no prazer, quanto na dor, na tristeza e na desilusão. A felicidade aí é só o norte apontado na bússola de cada um.

Roberto Darte
Enviado por Roberto Darte em 21/05/2008
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