As pérolas de Roberto Carlos

Mesmo tendo passado boa parte da minha vida ouvindo críticos e artistas confiáveis alardeando maravilhas da obra de Roberto Carlos, demorei pelo menos quinze anos para saber do que eles estavam falando. Na minha infância, na década de 1970, chegava a escutar algumas das músicas que hoje sei fazer parte de uma época áurea da carreira do maior expoente da Jovem Guarda e um dos maiores da MPB. No entanto, logo entraria na adolescência e dividiria meu gosto musical entre o rock nacional e internacional (neste caso, mais voltado para a “safra” de 60/70), partilhado com a própria Música Popular Brasileira, através de Caetano, Gil, Milton, Djavan, Chico, João Bosco, etc.

Confesso que o título de “Rei”, somado ao longo período de discos recheados de homenagens a caminhoneiros, gordinhas e mulheres de óculos pouco me seduziram em conhecer com mais propriedade a obra de Roberto. Felizmente, tive o prazer de ser “reapresentado” a ela por um amigo e pude ver que sua discografia possui verdadeiras pérolas, que certamente são inéditas para a nova geração, já massacrada pela montanha de lixo que vem se acumulando no mercado fonográfico, nas rádios e nos programas de auditório da TV.

Além das excelentes letras, os arranjos melódicos das canções mais antigas de Roberto Carlos (a maior parte assinada também por Erasmo Carlos) são feitos sob medida para emocionar. Quem quiser conferir, deixo a seguir os nomes de, pelo menos, uma dezena delas, praticamente todas com sucesso absoluto nas rádios do país à época em que foram lançadas: “Quero ter você perto de mim”, “Sua estupidez”, As flores do jardim de nossa casa”, “Eu disse adeus”, “As curvas da estrada de Santos”, “Como vai você”, “O divã”, “Cavalgada”, “Menor que o meu amor” e “Detalhes”.

Sei que as aspirações e as fases na carreira de um artista mudam de acordo com as suas próprias mudanças interiores ou amadurecimento profissional. Nem sempre os fãs entendem e respeitam isto, o que leva muitos a terem uma visão egoísta e simplória daqueles a quem admiram. O que é estranho é perceber, no caso da música, que muitos deles embarcaram na onda dos apelos meramente comerciais, deixando de lado uma qualidade que era marca registrada de seus trabalhos iniciais.

A evolução pressupõe uma subida gradativa de degraus e não o contrário. Com Roberto Carlos isso é nítido! Eu desafio a qualquer crítico de música a apresentar argumentos plausíveis defendendo a tese de que os últimos vinte anos da sua discografia tenham sido melhores do que os primeiros.

Em termos comerciais é até compreensível que ele siga uma linha mais próxima do que tem sido oferecido ao grande público, principalmente no campo do “sertanejo romântico”. Seus especiais de fim de ano na Globo sempre têm uma parte dedicada ao passado, mas sempre em cima dos hits já muito regravados ou muitíssimos conhecidos. As bandas que o acompanham nestas apresentações são sempre de extrema qualidade, mas sinto falta das belíssimas músicas que poucos hoje têm o privilégio de ouvir, a não ser que corram atrás. Nem os programas de flash back, que quase todas as rádios comerciais têm, costumam tocar estas e outras pérolas deste capixaba de Cachoeiro de Itapemirim.

Registro aqui o meu oportuno e totalmente dispensável “mea culpa”, também para oferecer a oportunidade de falar do que vale a pena, mas, principalmente, para me retratar com minha própria consciência pelas incontáveis vezes que ofendi Roberto enquanto artista. Sempre é tempo de revermos nossos próprios valores e conceitos, permitindo-nos vencer as limitações e, por que não, as limitações dos outros.

Roberto Darte
Enviado por Roberto Darte em 05/05/2008
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