O mito do “fora”

Se existe uma situação desagradável pela qual todo mundo já passou ou vai passar pelo menos uma vez na vida é a de levar um “fora” de quem se ama. Normalmente todos sempre têm uma história para contar neste sentido, algumas mais amenas e até engraçadas, outras até beirando o trágico. A verdade é que o tal do “fora” (mesmo para quem dá) talvez seja um dos testes de resistência mais completos para qualquer ser humano – marcado genuinamente por muitas perdas, anseios e inseguranças.

Certa vez um amigo, conhecido por todos pelo seu jeito leve e brincalhão de lidar com tudo, levou um “fora” tão marcante que chegou a despertar sérias preocupações em sua família e em quem mais o conhecia bem. Ficou visivelmente abatido a ponto de não querer sair da cama, comer, estudar ou, sequer, conversar. Após mais de dois anos de namoro a mulher a quem amava terminou a relação dizendo que não tinha mais por ele o mesmo sentimento. Foi como uma bomba em sua vida. Felizmente, o tempo – o melhor dos remédios neste caso – tratou de trazer de volta toda sua vitalidade. Tanto que hoje ele ri do que aconteceu e define o seu estado de espírito à época de um jeito que é a sua cara: “quando me vi sem ela me senti o cocô-do-cavalo-do-bandido”.

A Psicologia tem para isso algumas definições que podem perfeitamente explicar o que se repete de forma tão parecida em pessoas diferentes, nas situações mais diversas. Os profissionais da área dizem que sendo o “fora” o final de uma relação que leva à separação do par amoroso (e como toda separação gera dor e culpa), muitas vezes não se chora apenas a separação daquele momento, mas também todas as situações de desamparo e abandono vividas algum dia e que ficaram inconscientes.

Sem falar no que vem junto, como orgulho ferido (uma variação da vaidade) e perda da auto-estima, que terminam expondo nossas inseguranças pessoais. É o que essa ciência afirma acontecer no fim de um relacionamento. Surge aí uma dor maior do que todas, que é a chamada “dor narcísica” – a nossa morte dentro do outro ou o momento quando percebemos que não significamos mais nada para o(a) parceiro(a).

Os relatos de psicoterapeutas apontam a culpa como um dos primeiros sentimentos que aparecem nessa fase. É como se em toda separação houvesse algum tipo de encenação em que se atribui a um dos envolvidos a culpa pelo término da relação. Eles dizem, no entanto, que isso não é verdade, pois foram os dois que não tiveram condições de levar adiante o relacionamento pelas mais diversas razões: seja pela falta de generosidade, de trocas, seja pelos limites pessoais de cada um, pela acomodação, desinteresse, incompetência ou desarmonia natural de ambos.

Por esse ângulo o “fora” é considerado um mito criado para explicar “o-tudo-em-um”. Afinal, quando ele acontece é porque a relação já estava com problemas; a diferença é que um dos dois teve mais coragem de resolver a situação. É preciso ao menos admitir que um dos problemas comuns em quase todos os relacionamentos amorosos é que os parceiros costumam abrir mão da liberdade, da independência (incluindo aí amigos e interesses pessoais), e por isso se tornam frágeis na hora de cada qual seguir o seu caminho.

O que talvez valha à pena incluir no pacote que envolve esse mito é a idéia de renascimento. Um “fora” pode, sim, significar uma chance de crescimento interior, de busca de novos caminhos. Mais uma vez a Psicologia oferece alguns ingredientes importantes para que isso aconteça: tentar vivenciar uma atividade profissional prazerosa, uma vida social interessante, ter amigos de verdade, permitir-se uma liberdade sexual para novas experiências e, principalmente, querer autonomia. Resumindo: não se submeter à idéia de que estar só seja sinônimo de solidão ou desamparo.

Roberto Darte
Enviado por Roberto Darte em 01/05/2008
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