Como Escrevi Meu Primeiro Livro
Charlles Nunes
Muitas pessoas me perguntam como comecei a escrever. Embora eu tenha tido algumas experiências positivas antes, comecei a desenvolver o hábito da escrita aos 17 anos. Mantive o diário por sete anos, e escrevi umas 1500 páginas. Mas foi só aos 30 anos que me lancei na empreitada de escrever meu primeiro livro: O Pulo do Gato.
Fizemos uma noite de autógrafos com fotos, murais, e até contratamos uma dupla de músicos! Foi a forma mais prática que encontrei para responder uma pergunta que eu já tinha respondido dezenas de vezes em sala de aula:
"Professor, como você aprendeu inglês?"
E eu sempre repetia a mesma história: que tinha sido missionário em Pernambuco entre 1991-1993, e que ao trabalhar no escritório da missão, precisei aprender inglês pra receber missionários recém-chegados. Porque comunicar só na mímica com eles, era osso.
De tanto contar essa história, resolvi escrever um livro.
Marquei a data para o lançamento - e me pus a escrever. 'O Pulo do Gato' foi escrito em 3 meses, nas noites e madrugadas da vida. Minha esposa me apoiou 100% no projeto.
Convidei um amigo para ilustrar o livro, e outro para fazer a editoração. Minha irmã ficou encarregada da revisão.
Fomos ao Salão de Humor de Volta Redonda, assistimos uma exposição de cavaletes com os desenhos do livro espostos, e copiamos tudo o que pudemos. A cor dos cavaletes, a densidade do plástico que protegia os desenhos. Imprimimos os desenhos do livro e fizemos tudo igualzinho. Convidamos as professoras que me alfabetizaram e um bocado de amigos e parentes para comer os 2500 salgadinhos.
Depois de várias madrugadas de trabalho intenso, lá estávamos nós, com 1000 exemplares do meu primeiro livro. Era algo completamente novo para nós. Mesmo sem nunca termos participado do lançamento de algum livro, nos lançamos naquela empreitada.
31 de Outubro de 2001: Uma Noite Inesquecível
Quando minha sobrinha viu as caixas e mais caixas de livros chegando para o lançamento - eram 25 caixas com 40 livros cada - ela perguntou:
"Você escreveu todos esses livros?"
Não me contive, e lasquei:
"Todos. Escrevi um por um."
Ela arregalou os olhos, como se estivesse diante de um escritor renomado. Eu deixei que o tempo me desmentisse. Fiquei curtindo a vibe daquele olhar inocente.
Ao som de violino e violão, ouvimos discursos emocionados, tiramos fotos e partimos pra cima dos salgadinhos. Naquela noite, vendemos quase 2% de todo o estoque. Pra ser mais exato, 19 exemplares. Os 981 que sobraram, bem, esses ficariam rodando pela nossa casa nos próximos 7 anos!
Como estávamos surfando na onda do otimismo, assim que encomendamos os 1000 exemplares, convidei a Martha pra procurar comigo uma casa. Pelas minhas contas, vendendo cada um por 19 reais, daria 19 mil - e com essa grana a gente ia se dar ao luxo de comprar uma casa nova!! E não é que achamos a bendita casa? Só faltou a grana mesmo.
Nos próximos anos, quase todos os meus amigos ganharam um exemplar do livro. Aparecia um aniversário, e lá íamos nós, com um exemplar bem embrulhadinho em papel de presente. De vez em quando, o aniversariante falava: "Eu já tenho o livro, Charlles. Você me deu um exemplar no ano passado!"
Como é que eu iria guardar na memória as 1000 pessoas que tinham o bendito livro?
No meu trabalho, quando chegava um visitante e a conversa permitia, eu oferecia logo um livro. Vendi um monte lá.
Até em blitz policial eu ofereci o livro - porque estava com a documentação do carro atrasada. O policial aceitou, eu fui até em casa e voltei com o livro. Isso, quase onze horas da noite, porque eu estava voltando da faculdade!
Depois que a poeira do lançamento baixou, além da história pra contar, me restava a dívida com a gráfica. Como a venda dos livros não pagava nem o custo, tive uma ideia: ofereci ao dono da gráfica alguns móveis que eu tinha em casa.
E não é que ele topou?
No dia que vieram buscar os móveis, minha filha de 5 anos estava fazendo o dever de casa na sala. Meio constrangido, eu perguntei:
"Filha, você pode terminar na mesa da cozinha? É que os moços vão precisar levar essa mesa..."
Ela se levantou e foi pra cozinha, sem entender nada. E eu fiquei com uma baita dor na consciência por colocar minha filha nessa situação.
Bem, na época foi difícil, mas é claro que a gente deu risada depois.
E de vez em quando, um amigo das antigas me manda uma foto do livro, ou eu chego na casa de alguém e me deparo com o livro quietinho na estante.
Olhando pra trás, fico muito grato por ter uma companheira que topa essas aventuras - que comemora sempre que as coisas dão certo - e que consegue rir comigo das coisas que não dão tão certo assim! (Com uma parceira dessas ao meu lado, eu posso continuar acreditando em dias melhores.)
Fica a dica: ao escrever seu primeiro livro, se contente em publicar poucos exemplares. Ou faça as contas e saia feito doido por aí procurando uma casa nova pra comprar. Às vezes, a gente tem que viver na pele pra acreditar. ;-)
Clique aqui para baixar um exemplar do livro O Pulo do Gato.