O Que é Ser Português
O Que é Ser Português
Anda por aí um concurso em Curso “ O que é Ser Português” tentei me inscrever, não deu, não faz mal, vou por aqui .
O Que é ser Português
Procurei nos heterônimos de Fernando Pessoa que também tem essa intenção, procurei dentro de mim, na vida que ali vivi, nos dias e noites que passei a inventar outra vida para mim. A que havia me mostrava que ali não estava. O que é ser português? Não consigo atinar com algo comum num povo tão desigual.
Gente a aproveitar de gente. Aprender, saber mais, freqüentar uma universidade era para poucos e esses poucos iam ali refinar a arte que os pais andavam a praticar.
Frequentar uma Universidade não era se preparar para ajudar a nação, muito menos o seu povo. Voltavam mais poderosos, mais capazes de oprimir, de massacrar mais ainda um povo aviltado, sofrido, de joelhos, a pedir a Deus que não os deixasse cair ao chão.
O diploma lhe dava o direito de viver sem trabalhar, de explorar gente simples, sem maldade que facilmente caiam nas malhas das redes que a universidade lhe ensinou a tecer, aqui não vamos culpar o ensino ali ministrado, era amplo bom, mostrava com clareza princípios filosóficos que iam desde Platão ao Príncipe Maquiavel, e outras sabedorias bem explicadas, bem explanadas. O problema aqui era passar o saber para quem se ia aproveitar dele, não para o bem do povo ou da nação, mas sim para tirar proveito próprio. Disso já se queixava Camões, Eça de Queiroz, Fernando Pessoa , Saramago e outros. Passar sabedoria para gente que a ia colocar a serviço de si próprio e da sua tribo, só piorava as coisas. Antes não passasse por lá.
Ali não era nenhuma fábrica de bem querer, a filosofia que por ali se via não pregava alegria, libertação. Não havia ninguém para te dar a mão, até porque não era essa a intenção.
Era fácil muito fácil cair nas armadilhas, bem tecidas, uma vez aprisionado a sentença era fatal: condenado a ser por ricos explorado e até por pobres desprezado. Era sem perdão, sem tábua de salvação. Era um jeito muito jeitoso a serviço do todo poderoso.
Só a alma aventureira, que nunca nos abandonou, mostrava uma saída: Diabo! Ser português deve ser mais que isto.
E veio a diáspora: cada um saía como podia: ia a salto, pés na Espanha, na França, em Luxemburgo, na Alemanha, na Suíça, de barco para o Brasil, para a América e por aí ia até fincar pé no país que o acolhia. Era ali que começava a sonhar com liberdade, inclusão, cidadania. Um português sim senhor! Dono de si a mostrar o seu valor.
Quem ficou em Portugal? Os senhores daquela guerra, os donos da terra, a mandar e desmandar à vontade em nome do Salazar.
A mamar nas tetas do governo, a viver de tretas. Lá isto é ser português?
Veio o Vinte e Cinco de Abril, podia ter sido a salvação do povo e da nação, mas não foi.
Houve algumas escaramuças’; perderam-se as colônias, fizeram-se acordos desastrosos, as classes sociais sofreram alguns abalos. Até parecia um novo dia, mas não, era outra treta a enganar o povo de novo.
O que realmente fez a diferença foi a entrada de Portugal para a União Europeia, ( EU) : abriram-se as fronteiras, saímos da clandestinidade, o nosso mundo vivia agora outra hora.
Ser português começou a valer a pena, cresceu a alma pequena. Ser português não é ser fraco não.
Mas os poderosos continuavam lá, o dinheiro que chegava para alavancar o progresso era fatiado, muito foi surrupiado, mas alguma coisa se fez: Auto estradas que começavam em Lisboa e chegavam no máximo a Braga, um pouco a Vila Real, ali era o fim da linha. Era também o fim da inserção, era preciso manter uma ou outra região longe da civilização. Afinal ainda vigora por lá aquela mentalidade de se manter no poder às custas de um povo que mal sabe ler.
Abriram-se algumas escolas secundárias, depois é sair dali, achar uma vaga em uma universidade ou prosseguir na saga do imigrante, isso está longe de acabar.
Então o que é ser português agora?
Difícil achar palavras: uma alma aventureira, um corpo rasgado, remendado que eu defino assim:
Quando imigrante me tornei
metade de mim fiquei
Foi-se embora a ousadia
a vontade que sentia
A alma que tanto sonhou
pela metade ficou
e a metade que restou
já nem sabe quem eu sou .
Esquerda! Direita! Em Portugal tanto faz, são farinha do mesmo saco. Cada um puxando a sardinha melhor para o seu prato, e vendendo o melhor de Portugal . Bem vendido, mal vendido tanto faz o que importa é a propina, o que chega por baixo do pano direto para o bolso do figurão. A culpa nunca foi só do Salazar, era desses figurões que queriam mandar mais do que o Salazar e ainda continuam por lá a mandar. Muita coisa mudou sim, mas a principal mudança foi o povo a bater em retirada.
Um rei só é forte quando tem a seus pés um povo que o obedece até à morte.
Esse povo vaga pelo seu deserto, apátridas sem filiação. Mesmo assim são eles os guardiões da tradição.
Querem saber o que é ser português?
perguntem aos filhos da diáspora.
Que força estranha! Que alma tamanha essa gente tem. Portugal vai ficar a ver navios enquanto não for capaz de aproveitar bem a força que este povo tem.
Lita Moniz