Proteção Infanto-Juvenil
Proteção Infanto-Juvenil
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Publicado em 24 de maio de 2017
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Milton Biagioni Furquim
Milton Biagioni Furquim
Juiz Direito Vara Civil Infância e Juventude na TJMG
Proteção Infanto-Juvenil - Justificativa
Por certo medidas como a portaria de proteção infanto-juvenil e combate às drogas, o só fato de despertar acirrada discussão, seja apoiando-a, seja criticando-a, pode ser tida por altamente positiva. Toda e qualquer discussão sobre determinado tema, seja jurídico ou não, é muito salutar, pois oportuniza as pessoas ter acesso a entendimentos e posicionamentos de modo a contribuir com o conhecimento sobre determinados temas.
Voltando a questão da Portaria, há os que criticam pelo excesso de conservadorismo; visão retrógrada, arbitrariedade, violação ao direito constitucional de ir e vir, etc. Por outra, há os que defendem-na por entenderem que não há solução outra para fazer com que a família reassuma a rédea e a autoridade impondo-lhes respeito e limites.
Uma das características do adolescente é sentir-se dono do mundo, pois tudo sabe, sempre tem razão. Sabemos que regras e proibições costumam provocar os mais diversos comportamentos rebeldes nos jovens. Contestar opiniões, querer inovar e começar a pensar no futuro são atitudes que estão relacionadas à fase em que o adolescente passa por uma importante mudança cognitiva - a conquista do pensamento abstrato - e redefine conceitos fundamentais para a formação da identidade. Essa conquista não está relacionada simplesmente à maturação biológica e à idade cronológica, mas também aos estímulos que cada indivíduo recebe.
Acentuada nessa fase de adolescente, quando eles precisam se sentir superiores , acham que já cresceram e não precisam de orientações. Todas as pessoas que convivem com adolescente passam por isto. A verdade é que há diversas razões para que isso aconteça. Não é apenas um motivo ou situação que desencadeia a agressividade nesses adolescentes. "A violência é um fenômeno de múltiplas causas", define Rose Miyahara, coordenadora do Centro de Referência às Vítimas de Violência do Instituto Sedes Sapientiae. "Pais violentos, privações materiais ou afetivas, valores culturais que induzam à discriminação e ao preconceito estão associados e resultam nesse tipo de comportamento", completa.
A cada dia os jovens buscam mais a liberdade, especialmente dentro de casa. Que adolescente gosta que o pai ou a mãe fique ligando o dia todo para investigar seus passos? Seja pela falta de tempo, pois ficam o dia todo fora de casa, no trabalho, ou para passar a imagem de "modernos", os pais estão cada vez mais liberais. Isso não quer dizer que a atitude seja de todo errada, apenas que é preciso dosar o quanto de autonomia se deve dar aos adolescentes.
"De fato hoje os pais têm menos tempo disponível para os filhos, o que gera sentimento de culpa. Os excessos são observados quando pai ou mãe agem de forma extremamente permissiva, ou são exigentes demais e tornam os poucos momentos de união cheios de cobranças", explica Carolina Nikaedo, psicóloga da Equipe de Diagnóstico e Atendimento Clínico (Edac), de São Paulo. Geraldo Possendoro, professor de Medicina Comportamental da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), chama a atenção para a atitude que alguns pais têm atualmente.: "Cada vez menos dizem 'não' aos filhos. A família não estabelece limites, da infância à adolescência".
Outra reação errada da família é achar que tudo o que o jovem faz é parte da rebeldia típica da fase. "Todos veem a adolescência como um período passageiro e natural, esperando que um dia ela termine e os problemas sejam resolvidos", explica Ana Bock, psicóloga e professora titular da PUC-SP. É preciso estar atento a tudo o que rodeia o adolescente. Isso porque há diversas influências que podem incliná-lo à violência. "O grupo de amigos e suas formas de cultura são importantes, assim como o modo de se relacionar com os parentes. O alerta mais importante é: para que os jovens sejam violentos é preciso que ele viva em uma cultura na qual esse tipo de comportamento é oferecido como possibilidade", argumenta Ana.
De outro norte sabemos das angústias e, pior, da sensação de frustração e de culpa dos pais por não conseguir transmitir aos filhos os valores maiores para a vida. Por não conseguir impor-lhes limites e regras na convivência em família e na sociedade; por não despertar nele o sentimento de respeito aos pais e autoridades. No entanto deveriam mostrar-lhes que o termo ‘sempre tem razão’ só deveria ser usado para atitudes que façam-lhe bem e ao próximo para que cada dia se torne uma pessoa responsável pelos seus atos.
Educar não é, com certeza uma tarefa fácil, pois filhos também são seres humanos que necessitam de limites, orientações, educação para se tornarem pessoas boas e no futuro entender que comportamento arrogante, desrespeitoso não leva a lugar nenhum, ao contrário fecha a mente para aprender coisas novas e boas.
Não pretendo sustentar a liberdade absoluta para os jovens ou para qualquer outra pessoa. Defendo a liberdade com responsabilidade, uma vez que essa última resulta da existência do homem em sociedade e submeter-se às regras e limites, e não por ser livre. Portanto, aos adolescentes que cometerem atos infracionais, em qualquer horário do dia ou da noite, devem, após o procedimento apuratório de sua responsabilidade, sofrer a sanção legal adequada, com a finalidade de se evitar a reincidência e formar sua cidadania.
Não pensem que os adolescentes são desinformados, que desconhecem seus direitos. Eles sabem que o Poder Público não pode vigiá-los e puni-los por somente estarem nas ruas, pois tais ações cabem aos seus pais, verdadeiros titulares do poder familiar. Normas que fixam horários de estar nas ruas têm sua fonte no seio da entidade familiar, no entanto a ação do Estado é, via de regra, a de proteção às famílias.
Num mundo globalizado e tecnologicamente avançado a relação pais/filhos não pode ser mais autoritária. A democratização do processo educacional familiar tornou-se uma exigência. A divisão de tarefas, de obrigações, e, sobretudo a possibilidade dos filhos serem ouvidos e participarem na construção das normas disciplinares e de suas sanções, bem como das decisões familiares, isso tudo propicia a estes o desenvolvimento de uma responsabilidade social, muito útil para a vida em sociedade.
No entanto, a intervenção do Estado vem aumentando cada vez mais, isto para garantir a adoção da doutrina da proteção integral da criança e do adolescente e, conseqüentemente, o principio do melhor interesse dos mesmos e tal se dá em razão da falência da família.
A doutrina da proteção integral consagra que todos os direitos da criança e do adolescente possuem características específicas, devido à peculiar condição de pessoas em desenvolvimento que ostentam os sujeitos, e que as políticas básicas voltadas à juventude devem agir de forma integrada entre a família, a sociedade e o Estado. A infância deve ser a prioridade, devendo a proteção se sobrepor às medidas de ajuste econômico, resguardando os direitos fundamentais. Contudo, a proteção integral, inspirada no princípio do melhor interesse da criança, impõe que os pais ou responsáveis garantam à criança e ao adolescente cuidados especiais e, na falta deles, é obrigação do Estado assegurar tais cuidados. E de que maneira o Estado se obriga a assegurar tais cuidados? Por certo interferindo.
Quando se fala em poder familiar, há que se trabalhar com duas variáveis, com o aspecto afetivo da relação paterno-filial e o da vigilância do Estado sobre estas relações.
Aos pais cabe o exercício do poder familiar com autonomia, respeitando a licitude e a responsabilidade, alcançando o poder-dever de exigir respeito, obediência, colaboração e educação, podendo, aliás, utilizar-se de medidas corretivas necessárias, porém não exageradas, que não configurem maus-tratos, violência e opressão.
Ao Estado, com o auxílio da sociedade, cabe assegurar os direitos da criança e do adolescente, o qual deve agir diante da negativa dos pais em respeitar os direitos dos filhos no exercício do poder familiar, por meio dos órgãos judiciais e extrajudiciais, através dos quais, ao receber denúncias ou tomarem conhecimento da situação, são legitimados a aplicar as medidas corretivas ou preventivas necessárias.
Pois bem. No que diz respeito aos termos da Portaria, restou, por evidente, a intervenção do Estado, por intermédio do Juizado da Infância e Juventude, em atendimento à postulação neste sentido da própria sociedade guaxupeana, quando, em várias reuniões, participando delas, o Executivo, Legislativo, Ministério Público, Polícias Civil e Militar, Defensoria Pública, e representantes de entidades e instituições, deste Juizado solicitaram a edição da medida regulamentando as faixas etárias e horários para permanência de crianças e adolescentes circulando e permanecendo pelas vias públicas (absurda, retrógrada, conservadora, como acham uma corrente). De modo que a Portaria foi editada para atender os reclamos, a vontade, o desejo, a reivindicação da própria sociedade de Guaxupé e São Pedro da União. Enquanto Juiz da Infância e Juventude, coloquei-me na condição de instrumento dessa vontade, dessa postulação.
É preciso, também, não esquecer que não há limite de idade e horário para que crianças e adolescentes circulem pelas vias públicas a qualquer hora da noite ou da madrugada se acompanhados de seus representantes legais. Onde a proibição? Ora, não basta ser pai ou mãe, tem que participar. Não seria interessante que os pais deixassem de assistir o ‘amor à vida’ e acompanhassem seus filhos pelas vias públicas a qualquer hora da noite e madrugada?
Agora, não consigo compreender e aceitar que hajam pessoas (pais, estudiosos, críticos) que veem com naturalidade uma criança (até 12 anos), ou um menor de 16 anos, possa permanecer e circular pelas vias públicas a qualquer hora da noite e da madrugada. Ficaria imensamente grato se me convencessem com razões irrefutáveis e irrespondíveis. Ficaria, imensamente grato, se, também, não com teorias, a par das críticas, sugerissem medidas producentes, exeqüíveis e com resultados de pronto como a sociedade espera para todas suas postulações, mas que não venham com teorias a ser aplicadas com resultados a ser alcançados no outro século. Que apontem e sugiram soluções para a problemática, não para o País, mas para os Municípios de Guaxupé e São Pedro da União. Teorias, sugestões, etc. para que os resultados sejam alcançados na próxima geração não resolve os problemas atuais.
Por fim, cabe a própria sociedade de Guaxupé e de São Pedro da União, se assim entenderem, postular maior flexibilização quanto a faixa etária e horários para que menores de 16 anos possam permanecer e circular pelas vias públicas, ou, então, sugerir outras medidas.
Guaxupé, 22/10/13.
Milton Biagioni Furquim
Juiz da Infância e Juventud