O CIDADÃO DE AGORA E O ELEITOR DE AMANHÃ
O CIDADÃO DE AGORA E O ELEITOR DE AMANHÃ
Rangel Alves da Costa*
No Brasil é típico que o eleitor se comporte apenas como um apaixonado votante e não como um cidadão que sente no pleito eleitoral o momento ideal para dar o troco. Quer dizer, já chega ao período eleitoral esquecido de todo o sofrimento causado pela classe política, pelas desgovernanças e pelas indignações, para se revestir de um novo sujeito: o eleitor que defende com unhas e dentes aqueles mesmos candidatos que no passado o escravizou.
É problema histórico ou desavergonhamento secular. E no Brasil parece que não tem jeito. Não são raros os escritos dando conta do povo brasileiro como uma gente passiva, inerte, conformista, acomodada, numa lassidão cidadã ao modo de Macunaíma: Aí que preguiça! Mais que contumaz na submissão, na escravização política e social, e na falta de qualquer senso crítico perante a realidade, acaba se assemelhando ao animal que vai sendo conduzido com tampão nos olhos.
Enquanto eleitor, a grande maioria dos brasileiros é, reconhecidamente, um desastrado. Suas paixões e suas escolhas, suas defesas inflamadas e suas apostas, sempre redundam em catástrofes eleitorais. Para exemplificar, não há candidato cuja integridade seja socialmente comprovada que tenha reconhecimento do voto. Por mais que o eleitor conheça o trabalho honesto e as boas intenções do pleiteante, ainda assim o rejeita enquanto candidato. É como se sentenciasse: o honesto não serve à política.
Da premissa que o honrado não serve à política é que a escolha recai nas piores escolhas. Ora, se o honesto não presta para governar ou legislar, então nenhum outro merece ser votado. É apenas uma questão de lógica ou de exercício de eliminação. Mas se faz exatamente o contrário, pois elimina aquele de serventia e chama para si o imprestável como candidato. O resultado é demasiadamente conhecido por todos, principalmente pelas indignações lançadas com pouco tempo de eleição. Sempre age assim para na eleição seguinte repetir a mesma coisa. Quer dizer, escolhe um candidato imprestável, vota, em seguida começa a criticar, depois amaldiçoa, promete que nunca mais. E depois esquece tudo.
A verdade é que aos poucos o eleitor parece que vai esquecendo sua importância no contexto político e nas transformações sociais. Ao se tornar apenas num indivíduo que se sujeita apenas aos deveres e não exige o cumprimento de seus deveres, ao se reconhecer-se somente como aquele que deve pagar impostos, se sujeitar às elevações abusivas da energia elétrica, dos remédios e dos produtos essenciais à sobrevivência, logo não deve esperar qualquer valorização por parte dos governantes. E ante o silêncio e a sujeição acomodada, então vão surgindo os absurdos que se tem agora.
É difícil dizer como o pós-eleitor deva se comportar durante o período de exercício dos mandatos daqueles seus escolhidos, principalmente porque a maioria geralmente se dá por satisfeita e daí em diante tanto faz como tanto fez. Mas é fácil dizer como não devem se comportar. Esquecer o senso de vigilância é o que mais ocorre e o que mais provoca resultados danosos. Contudo, o que mais se observa é o caráter pendular do sujeito, ou seja, ora está passivamente conformado ora está esbravejando. E o que mais ocorre: injuria, xinga, ultraja, mas depois vota novamente naquele político.
Sujeito e eleitor, que estão num só, deveriam ser mais responsáveis. Têm de chamar para si um mínimo de consciência. Hoje, por exemplo, deve refletir sobre os seus erros e saber que o país chegou à situação que chegou por causa de seu voto. Se não fosse o seu voto apaixonado pelo petismo a situação talvez fosse muito diferente. Pior impossível, e certamente mais alentadora ou mesmo de contentamento. É preciso afirmar assim por que muitos ainda levantam bandeiras e defendem com unhas e dentes o governo que aí está, afundando tudo.
A certeza que o cidadão de agora será o eleitor de amanhã é que demonstra a responsabilidade de cada um pelo futuro da nação. Que se mire nos exemplos, nos espelhos do passado, nas dores sofridas e nos tormentos acumulados na alma. Que tire a venda dos olhos e procure enxergar a realidade. Ou será que tudo vai bem, como diz a presidente? Inadmissível em quem não é insano que não se reconheça aviltado, desrespeitado, ferido na sua honra e no seu caráter. Inadmissível que não aprenda quando a palmatória do desgoverno continua ferindo a sua vida.
Entretanto, a verdade é que os monstros só existem porque as pessoas os trazem à existência. Os fantasmas só fazem ronda nas mentes que os aceitam. O ser humano é capaz de tudo. Vai atrás da fera e depois reclama de seus ataques. Assim também com o eleitor brasileiro. Como alguém já asseverou, nem a ferida sangrando faz com que o eleitor se preocupe em saber quem foi o causador do tormento. Basta que o algoz lhe dê um remédio e tudo já estará esquecido. E mais um voto garantido.
Infelizmente é assim. A casa chamada Brasil está desmoronando por causa dos alicerces governistas e ainda assim alguns colocam a culpa no vento. O medo maior é a certeza que nas próximas eleições o vento continue levando a culpa.
Poeta e cronista
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