DEPOIS DA TEMPESTADE

DEPOIS DA TEMPESTADE

Rangel Alves da Costa*

Não há mal que não traga um bem, assim a máxima tão conhecida. Ou, noutras palavras, não há mar revoltoso que mais tarde não se aquiete em calmaria. Depois de tudo, da aflição e do sofrimento, a lição aprendida. Conhecido o mal, será preciso evitá-lo, conhecido o mar, será preciso respeitá-lo. Assim a vida numa linha do Eclesiastes: o que é agora não mais será adiante. E nisto vejo o momento brasileiro ou a realidade difícil que aflige a todos da nação. Menos aos culpados, logicamente.

Acaso se confirmem os ditados e as máximas, há de ser no chicote que virá o amansamento, há de ser na ferroada que surgirá a mansidão. Infelizmente será na dor e na sangria que surgirão os aprendizados das tempestades que açoitam o Brasil nos últimos tempos. Mesmo que secularmente já venham se acumulando os vícios das roubalheiras, das espertezas insidiosas e dos conchavos lamacentos, chegaria o dia de a limpeza começar a ser feita. E é isto que vem acontecendo na pátria aviltada.

Nos últimos tempos, nas páginas dos jornais, nos noticiários televisivos, nas mídias, nos diálogos entre as pessoas, alguns termos surgiram repetidamente e ainda ecoam sem perspectiva de silenciar. Corrupção, lamaçal, roubalheira, sonegação, improbidade, evasão, propina, fraude, desvio e uma infinidade de outros termos inescrupulosos, estiveram na percepção das pessoas como termos corriqueiros. Tanto surgem que já não espantam mais.

E todos como consequência de outros termos que apareceram com estardalhaço a partir de operações comandadas pela Polícia Federal: Mensalão (esquema ilegal de financiamento político para compra de votos a favor do governo Lula), Lava Jato (esquema de desvio e lavagem de dinheiro na Petrobras), Petrolão (desmembramento da Lava Jato, esquema usado para desviar dinheiro da Petrobras, através de contratos superfaturados e dinheiro sujo para beneficiar políticos), Zelotes (esquema de sonegação fiscal), Erga Omnes (oriunda da Lava Jato, voltada para os atos de corrupção comandados pelos empreiteiros). Alguém se recorda da Operação Navalha, da Satiagraha e da Hurricane?

Em Sergipe, mesmo não sendo necessária uma súbita operação da Polícia Federal, recentemente surgiu o Escândalo das Subvenções, nome dado ao esquema de repasse e uso irregular de verbas públicas. Alguns deputados direcionavam verbas para associações e outras entidades e destas obtinham o retorno de vultosas quantias. Segundo o Ministério Público Federal, houve desvio para fins eleitoreiros de verbas que deveriam ser destinadas a instituições filantrópicas. Parlamentares já foram condenados pelo TRE/SE a pagamento de multa, perda de mandato e inelegibilidade. Na esfera criminal, se apura as práticas de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa, dentre outros crimes.

Será preciso morrer para renascer, eis uma assertiva apropriada para ser utilizada nestes dias de turbulências e desesperanças. Como uma esperança reversa, foi preciso colher no sofrimento a perspectiva de um futuro melhor e mais honrado não só para Sergipe como para o Brasil. Significa dizer que os abusos e absurdos tiveram de chegar a tais patamares para que as escavações começassem. E o lamaçal saído desse poço fétido e profundo logo será visto como redenção. Pérolas surgirão desse emaranhado de lama e lodo.

Não há como pensar diferente. A cultura da corrupção estava tão enraizada no Brasil que ninguém imaginaria que pudesse algum dia ser combatida. Muito menos vencida. Ano após ano e escândalos e mais escândalos surgindo para serem esquecidos. Era fácil demais roubar dos cofres públicos, era até vantajoso demais praticar atos de improbidade e de corrupção. Ora, praticamente não havia condenação e logo tudo era devidamente esquecido. E mais adiante os mesmos meliantes dos cofres públicos voltavam a agir. E assim tudo se repetindo.

Mas será que agora tudo vai ser diferente, ou o que mudou para que se imagine um novo Brasil sem corrupção nem corruptos? Não se afirma acerca da absoluta moralidade e honradez do político, do governante ou do homem público. Logicamente que outros escândalos surgirão. O vício no roubo faz reincidir, o costume sujo nunca lava as mãos. Mas uma verdade se diga: daqui em diante nada será como antes com relação à impunidade.

A nova realidade já começa a ser visível a todos e a verdade é que jamais se viu, em toda a história do país, o andamento de tantos inquéritos e processos para apurar a roubalheira desenfreada. E muitos já foram levados à cadeia, em cujo caminho ainda muitos outros seguirão em procissão de condenados. Políticos renomados foram colocados atrás das grades, ricos empreiteiros amargam a pobreza das celas, diretores de estatais foram devidamente enjaulados. Os inquéritos e os processos continuam, as operações continuam à caça dos intocáveis, tudo num percurso sem precedentes.

Como afirmado, a corrupção, a improbidade e a roubalheira jamais deixarão de existir no Brasil. Mas a impunidade não será como antes nem as espertezas ficarão sem o devido troco. Mesmo que se imagine numa ação tardia, o que o Judiciário e a Polícia Federal vêm fazendo agora nos faz pensar em um Brasil diferente, possível, esperançoso, mais honesto e horando. Certamente que depois de todo espanto, dor e sofrimento da população. Mas um amanhã de horizonte muito menos tempestuoso. Neste sentido, as portas e janelas já estão sendo abertas à espera do sol.

Poeta e cronista

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