Selfie, plástica e vaidade
Quem frequenta as redes sociais da internet deve ter percebido que aumentou significativamente o número de “selfies” – termo em inglês para designar as fotos em que fotógrafo e fotografado são a mesma pessoa. Será que isso é reflexo de algum aumento no índice de autoconfiança ou mesmo de alguma elevação na auto-estima das pessoas?
O tema é realmente instigante e abre margem para várias possibilidades de pesquisas psicológicas, sociológicas, filosóficas, entre outras áreas do conhecimento. O assunto fica ainda mais atrativo se apresentarmos dados de uma pesquisa realizada nos Estados Unidos em 2013 pela Academia Americana de Plástica Fácil e Cirurgia Reconstrutiva. Dos 2,7 mil cirurgiões entrevistados, 58% constataram um aumento no pedido de cirurgias estéticas por pessoas com menos de 30 anos. As mulheres são maioria, com 81% de todos os procedimentos realizados no ano passado.
De acordo com Edward Farrior, presidente da referida entidade, o fenômeno das “selfies” tem feito muita gente buscar cirurgiões plásticos. Ele explicou que as redes sociais (principalmente aquelas que são baseadas apenas na imagem) forçam os pacientes a olhar suas próprias fotografias com um “microscópio” e, muitas vezes, a observar-se de forma mais crítica.
Mesmo mencionando ser difícil confirmar a tese da associação americana de que o aumento do número das cirurgias está ligado às “selfies”, os membros da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica dizem que as pessoas sempre citam as suas aparências nas fotografias como motivadoras para as cirurgias plásticas. A associação informou que em 2013 foram realizadas 1,5 milhão de cirurgias plásticas no Brasil, sendo 1 milhão para fins estéticos.
Abordando o tema “Estética” em minhas aulas de Filosofia nas turmas do 2º Ano do Ensino Médio da ESEDRAT (Escola Estadual Dr. Raimundo Alves Torres), em Viçosa-MG, fiz nesta semana uma enquete rápida com cerca de 200 adolescentes. Comecei colocando no quadro a seguinte pergunta: “se pudesse, você faria uma cirurgia plástica para mudar algo no seu corpo com o qual não está satisfeito(a)?”. Confesso que as respostas me surpreenderam, já que esperava uma vitória esmagadora do “sim”. Na verdade, disseram que gostariam de fazer alguma cirurgia plástica aproximadamente 25%. Ainda assim, é uma amostragem significativa se levarmos em conta que se trata de uma intervenção cirúrgica com todos os riscos inerentes.
As redes sociais da internet trouxeram à tona uma possibilidade de autopromoção nunca antes vista na história da comunicação formal e informal. As pessoas, de forma espontânea ou planejada, estão se expondo cada vez mais, seja por interesses profissionais, por interesses afetivos ou mesmo por pura vontade de serem vistas, lembradas e de receberem elogios.
Há algum tempo li reportagens destacando que no Brasil vem crescendo o número de adolescentes que pedem aos pais cirurgias plásticas como presentes de 15 anos no lugar das tradicionais e tão sonhadas festas de debutante. A novidade já virou tema de debate entre os próprios cirurgiões plásticos, que têm opiniões divergentes sobre os perigos de se incentivarem tais presentes.
A vaidade está longe de ser algo contemporâneo. Ela acompanha a humanidade há milênios, inclusive fazendo nascer mitos como o de Narciso, que se apaixona pela própria imagem refletida na água a ponto de se achar um deus.
Que nesta era de super exposição da própria imagem possamos controlar nossos ímpetos narcisistas para olhar e fotografar mais o outro. E que este outro seja parte de projetos voltados para o bem estar coletivo. Quem faz muita “selfie” certamente encontrará motivos para se sentir vaidoso demais... Ou inseguro demais.