NUDEZ INFANTIL: VISÕES DO PASSADO E DO PRESENTE

NUDEZ INFANTIL: VISÕES DO PASSADO E DO PRESENTE

Rangel Alves da Costa*

As visões sobre a nudez infantil, contrariando toda lógica progressista, tornaram-se cada vez mais conservadoras e até criminalizadas com o passar dos anos. Diferentemente do que ocorre com a desmoralização corporal de parte da juventude, a nudez da infância se revestiu de moralidade e pudor sem igual. E não por acaso que assim aconteça.

O fato de hoje ser assim, ou seja, de não mais aceitar com normalidade nem como ato de inocência a nudez de meninos e meninas, possui raízes na transgressão moral avistada na sociedade e nas condutas sexualmente doentias de determinados indivíduos. As crianças continuam com a mesma inocência permitida pela idade, mas o perigo reside na forma como certas pessoas procuram avistá-las. E mesmo que estejam totalmente vestidas.

Logicamente que sempre existiram as taras doentias, os desvios sexuais, os casos de pedofilia, mas não como se noticia nos tempos de modernidade. Mas talvez haja uma explicação para tal fenômeno. A sociedade depravou-se de tal modo que os jogos dos prazeres permitidos não mais atraem como antigamente. Daí que os impulsos sexualmente pervertidos passaram a ser lançados sobre pessoas indefesas, principalmente crianças.

E porque as crianças se tornaram alvos preferenciais para a satisfação de desejos reprimidos ou doentios, os pais tiveram que tomar atitudes que confrontam com as práticas de outros tempos. Se noutros idos as famílias permitiam que suas crianças praticamente vivessem sem roupa, brincando quase desnudas pelas ruas e sem qualquer ameaça, hoje impensável que isso aconteça. Eis que correrá o risco de colocar seu menor em perigo diante de tarados e pedófilos sempre à espreita.

Noutros tempos, principalmente nas cidades interioranas ou localidades menos desenvolvidas, não era difícil avistar crianças nuas correndo pelas ruas, soltando pipas, jogando bola, brincando de uma coisa ou outra. Além dos mais pequeninos que ficavam desnudos em suas portas e arredores, mexendo na terra e comendo o barro da parede, crianças já bem crescidinhas ignoravam qualquer proibição de se mostrarem completamente peladas.

As meninas sempre mais envergonhadas, mais discretas por força da idade e para não se mostrarem iguais aos meninos, usavam apenas calcinhas e pareciam vestidas de longo. Já os meninos não se importavam com nada, de mostrar o corpo magricela nem com suas minúsculas vergonhas quase sempre esquecidas. Mas tanto fazia que as meninas usassem somente calcinha e os meninos traquinassem de canto a outro completamente pelados. Era apenas a inocência abdicando das vestimentas para aproveitar a beleza da idade.

Com relação aos pais, afirme-se como verdade que sequer imaginavam que a nudez dos seus meninos pudesse alimentar distúrbios ou correr qualquer perigo. Eles haviam crescido assim, também com a pele do corpo servindo como roupa, e nunca foram importunados ou olhados com lascívias ou más intenções. Eram apenas crianças, e infantes nus vivendo suas proezas sem imaginar que um dia tal atitude tomaria rumos até criminosos.

Sou de um tempo, de um passado sertanejo, onde as chuvas e trovoadas eram os sinais para que as roupas fossem retiradas do corpo e a nudez se tornasse um festim molhado de traquinagem e inocência. E nem mais crianças pequeninas, mas já molecotes e todos completamente pelados correndo pelas ruas atrás de biqueiras, de poças d’água, de qualquer lugar onde a felicidade do instante pudesse ser vivenciada. E também o tropel desnudo correndo em direção ao riachinho para o banho nas águas da infância.

Em tempo idos, a nudez era a normalidade na criança e a roupa sempre um fardo impedindo rolar pelo chão e brincar onde bem entendesse. Mas hoje está tudo diferente. A vestimenta tomou um sentido de resguardo e preservação e a nudez infantil algo que deve ser evitado a todo custo. Afinal de contas os pais não conhecem as intenções dos que se aproximam e quais os perigos reais que rondam os seus. E são muitos os riscos e ameaças, vez que o sadismo e a perversão possuem na inocência seus alvos preferenciais.

Daí um tempo novo exigindo a infância vestida e protegida, quando o outro lado da inocência clama por tirar toda roupa e apenas mostrar sua liberdade.

Poeta e cronista

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