NATAL, TRISTEZA E SOLIDÃO

NATAL, TRISTEZA E SOLIDÃO

Rangel Alves da Costa*

O período natalino tem o dom de modificar totalmente a pessoa, eis que provoca sensações que alteram os aspectos comportamentais e psicológicos. Tudo parece ser mais nostálgico e melancólico, saudosista e meditativo, angustiante e comovedor. Daí se afirmar que o natal é um tempo de tristeza e solidão.

Tristeza sim, pois a reflexão maior no período, quando o indivíduo vai sopesando suas ações, relembrando fatos e coisas, vivenciando os escondidos da alma, acaba gerando sofrimentos e aflições. A pessoa se torna mais pensativa, serena, retirada, dialogando e buscando respostas em seus tantos diários e cartas reabertas.

Contudo, a tristeza do natal é bem diferente das demais. Não causa tanto desconforto na alma e padecimento no espírito, não é tão doloroso e lancinante, deixando o ser abatido a ponto de sucumbir. É uma tristeza quase simbólica, suportável e reconhecida por muitos como uma prestação de contas com o passado. E por isso mesmo não provoca danos maiores na estrutura psicológica do indivíduo.

Mas não é raro que muitos se fragilizem a ponto de sucumbir. A fragilidade do espírito se entrelaça aos negativismos surgidos na mente e, diante da atmosfera sombria que faz emergir ao redor, de repente e é a vida que acaba pagando o preço maior. Daí que infelizmente o natal ser também reconhecido como ambientação motivadora de suicídios. Assim, o sentido de renascimento espiritual se transforma em perecimento.

Não há, pois, que duvidar ser o natal um espelho de muitas faces. O sentimentalismo do ser humano tem no seu terreno o local ideal para espalhar e colher suas sementes, ainda que contrárias ao sentido humano da vida. O homem é frágil por essência, e muitos são levados a extremos a partir de uma junção de fatores ou situações mal resolvidas. E então são levados a desacreditar da própria existência.

Tudo isso que se vê e que se tem acaba sendo muito perigoso para alguns. Muitos vivem suas tristezas de modo comedido, racional, sem se afastar do controle mental, e acabam tirando proveito da situação. E a tristeza, ainda que não apenas aparente, se transforma em mecanismo de reconhecimento dos vazios da alma para o fortalecimento espiritual.

A atmosfera natalina com seus sentimentalismos, nostalgias e reflexões, igualmente muito se aproxima do conceito de solidão. E esta como o sentimento que predispõe ao isolamento, satisfazendo-se o indivíduo com o contato que mantém consigo mesmo. É uma espécie de retiro espiritual para meditar sobre a vida.

Solidão vista ainda como sensação de distanciamento da realidade, de vazio, de falta de interação com o outro. A ilha não é exemplo de solidão, mas o ilhéu sim. Procura aquele ambiente distante e solitário porque deseja isolar-se de outras realidades, sentir-se sozinho, interagindo apenas com os próprios pensamentos.

Contudo, são algumas características próprias da solidão que tanto a aproximam do natal. Na maioria das vezes, o indivíduo busca o isolamento para questionar sobre a própria existência, para refletir sobre sua condição de ser humano, para meditar acerca de suas conquistas e inglórias.

Através da solidão a pessoa expõe todo o seu aparato emocional. Daí muitas vezes ser um estágio doloroso onde prevalecem as angústias, os temores, as tristezas, as desesperanças; enfim, todo um contexto emocional e psicologicamente dilacerante. E a pessoa tem de suportar tudo isso sozinha porque mais doloroso ainda seria compartilhar sentimentos tão pessoais e intimistas com outras pessoas.

O solitário se fecha em si mesmo para viver seu instante de fuga da realidade. O seu mundo passa a ser o seu quarto, seu recanto, seu escondido, sua ilha. E o natal não deixa de ser esse espaço de recolhimento para muitas pessoas. Quando não surge como consequência do próprio clima natalino, eis que buscado por desejo pessoal.

E tanto a tristeza como a solidão do natal, se vivenciados dentro dos limites da racionalidade, servirão como purificação da alma para os novos embates da vida. Até a próxima floração maior dos sentimentos.

Poeta e cronista

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