Treinamento para Papai Noel

A proximidade do Natal trouxe à tona a lembrança de um caso verídico que sempre rende para mim boas risadas. Há alguns anos em Belo Horizonte a afilhada de uma amiga, à época com pouco mais de 2 anos, estava passeando com sua mãe em um shopping e lá viu Papai Noel sentado em sua cadeira, tirando fotos com as crianças. A garotinha, então, toda alvoroçada, insistiu para registrar seu encontro com o Bom Velhinho, a quem vinha aguardando o ano inteiro. Já no colo dele, com a mãe ao lado, foi travado o seguinte diálogo:

Papai Noel: Olá, mocinha, como é seu nome?

Garotinha: Carol.

Papai Noel: Que nome bonito! Você já mandou cartinha para o Papai Noel pedindo seu presente?

Garotinha: Já.

Papai Noel: E você tem mais irmãos?

Garotinha: Tenho, sim; eles são gêmeos.

Papai Noel: Que legal!!! E como se chamam?

Garotinha: João e Pedro.

Papai Noel: João e Pedro? Que legal!!! O meu é Antônio.

Garotinha: ??????

Mãe: ??????

Esse episódio mostra que a figura do Bom Velhinho tem ficado cada vez mais banalizada. Na minha infância ele existiu, mas era quase um mito, no mesmo rol dos anjos, das fadas, dos duendes. Acreditávamos que ele aparecia para deixar nossos presentes; chegávamos mesmo a tentar surpreendê-lo ficando acordados madrugada afora. Mas no final sempre vencia o sono profundo para, na manhã do dia seguinte, dar lugar à expressão de felicidade pelos presentes deixados ao lado dos nossos sapatos. Pelo menos a minha geração e outras que vieram antes curtiram esse Papai Noel bem mais imaginário do que real.

É fato que a situação mudou muito, principalmente nas duas últimas décadas. Na verdade, o próprio “Natal comercial” também mudou. Ele começa cada vez mais cedo para satisfazer os anseios do comércio, e em cada esquina é possível encontrar os mais diversos modelos do Bom Velhinho. Diga-se de passagem, cada um mais terrível do que o outro. É o chamado Papai Noel de aluguel, que está no mesmo time dos que se beneficiam com os empregos temporários de fim de ano. Quase nenhum tem a cara e o jeitão do Bonachão-do-Pólo-Norte, que, mesmo vindo de outra cultura, criou raízes também no Brasil.

Mesmo para mentes tão imaginativas como têm as crianças é difícil não perder a magia natalina depois de encontrar um Papai Noel como aquele de Belo Horizonte. Talvez Carol tenha prosseguido por mais algum tempo acreditando nele. Tomara que tenha conseguido, pois ainda pior do que isso é ver a desilusão no rosto dos milhões de meninos e meninas de origem humilde que, desde muito cedo, já sabem que o Velho Noel é, na verdade, Antônios, Pedros, Geraldos, Severinos, pessoas absolutamente comuns, sem destaque social, sem dinheiro no bolso e à espera de alguma alma caridosa que possa fazer a vez de Papai Noel para seus filhos.