O estigma de Fausto
Na busca desenfreada para retardar o inevitável encontro com a derradeira fase da vida, boa parte da humanidade se preocupa mais em manter o viço da juventude do que com o amadurecimento espiritual. O cotidiano está repleto de exemplos de adultos imaturos, marcados pelo triste comportamento da infantilidade tardia. Muitos deles, inclusive, têm a incumbência de educar as novas gerações.
A ânsia pela imortalidade, que é a verdadeira corrida pelo ouro-de-tolo, é um dos temas mais fascinantes da literatura e do cinema. O mais clássico deles talvez seja "Fausto", a marcante personagem do escritor e pensador alemão Johann Wolfgang von Goethe. A obra de mesmo nome, que já foi transformada em filme e em muitas montagens teatrais, conta a história de um médico e alquimista que, já muito velho e próximo da morte, recebe a proposta do diabo de ganhar de volta a juventude em troca de sua alma.
Após ganhar o que tanto desejava, Fausto termina pagando um preço altíssimo, pois passa a viver um ciclo ainda mais angustiante e desesperador. Ele percebe que a existência eterna não é uma dádiva, mas um fardo de peso incalculável.
Nessa mesma linha o escritor inglês Oscar Wilde escreveu o livro "O Retrato de Dorian Gray" (também adaptado para o cinema). Dorian Gray, seu protagonista, faz um pacto semelhante com o diabo ainda enquanto jovem. Através dele toda a sua beleza e jovialidade são preservadas, enquanto as marcas normais de seu envelhecimento são transferidas para seu retrato, escondido por causa das mudanças que vai apresentando com o passar do tempo.
Assim como Fausto, Dorian continua com a aparência de seus 20 e poucos anos, enquanto vê todos os que ama envelhecerem. A ideia de recomeçar a vida eternamente e enfrentar todas as mazelas que isso também representa o leva a entrar num labirinto de angústia e solidão.
Em toda essa confusa sensação de carregar consigo uma centelha do perfeito, o ser humano tenta a todo custo retardar a juventude - o antídoto imaginário para a morte. Nesta corrida desenfreada contra o tempo ele se esquece de enxergar algo essencial: se há em nós algum tipo de imortalidade, certamente não é no corpo que ela reside. Cuidar dele e de sua saúde é algo sensato e oportuno, mas se tornar seu escravo é perder o foco do que realmente importa.
Não são poucos os que têm o estigma de Fausto. Não são poucos os que passam a existência amealhando dinheiro e bens materiais, tendo neles uma espécie de falsa sensação de poder, de controle de todos os aspectos da existência. Estes são os que enlouquecem ao perceber, já idosos, que nem toda a riqueza do mundo é capaz de comprar a tenra idade e a vida eterna, que, na verdade, desenham-se apenas no espírito.