Educação de berço

Nunca esteve tão atual a frase “educação vem de berço”. Nunca foi tão necessária uma atuação consciente e enérgica dos pais na formação do caráter de seus filhos.

As primeiras décadas deste novo milênio serão determinantes para os rumos a serem tomados pela humanidade, visto que chegamos à tão anunciada encruzilhada que apontam os dois caminhos possíveis. Um é o da redenção dos muitos erros já cometidos pela nossa raça em prol dos ajustes necessários para que o planeta se recupere de todas as nossas agressões. O outro é o mesmo em que nos encontramos, percorrido desde a Revolução Industrial, na segunda metade do século 18. Ao passo em que avançamos nas mais intrincadas tecnologias, perdemos todo o respeito pelo bem-estar coletivo, pela nossa morada maior.

Essa resumida constatação em dimensão planetária é, na verdade, um processo desencadeado na dimensão individual. O Existencialismo (corrente filosófica que ganhou força no século 20) tem como principal mote a teoria de que o ser humano é totalmente responsável pela sua existência. Ou seja, tudo que ele faz a si e ao outro é de sua inteira responsabilidade. Nesta perspectiva, e usando um ditado bastante popular, cada um colhe o que planta.

No surpreendente episódio do último fim de semana, quando forças de segurança do Estado invadiram um dos principais quartéis generais do tráfico de drogas do Rio de Janeiro, dá para supor que nada daquilo aconteceria se décadas atrás as ações deste mesmo Estado tivessem sido diferentes. Suposição semelhante pode ser feita com relação à educação familiar que tiveram os traficantes na infância e na adolescência – fases de consolidação dos valores elementares para qualquer indivíduo.

Os filósofos existencialistas enfatizam o peso das escolhas individuais, mas elas não são tão individuais assim se levarmos em conta a gigantesca influência que exercem o meio social e o outro na existência de uma pessoa. Aí entra a tal educação de berço, que pode fazer a diferença ao longo de toda a vida.

Na semana passada, na repercussão dos problemas ligados à versão 2010 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), foi divulgada a notícia de que uma professora de Remanso-BA, que estava aplicando a prova, teve acesso a um texto de apoio da redação e o repassou ao filho. Ela teria ligado para o marido, que fez uma pesquisa na internet sobre o tema "O trabalho e a escravidão" e avisou ao filho, que fazia o exame em Petrolina-PE. O candidato, então, consultou professores que estavam no local de prova, perguntando como escrever sobre o assunto. Foi exatamente um destes professores quem denunciou o fato.

A professora e o marido, que foram indiciados por violação de sigilo funcional, podem ser condenados a até seis anos de prisão, se constatada a armação. Por sua vez, o filho do casal foi eliminado do Enem.

Esse é um exemplo muito simples (e corriqueiro, infelizmente) da falta de berço. Com a desculpa esfarrapada de que vale tudo para ajudar seus filhos, pais dão a eles o pior exemplo: o da falta de ética e de limites na trajetória que leva à realização legítima dos projetos de vida. Para uma criança ou um adolescente a lógica é simples: se meus pais dizem que certas atitudes são corretas, por que não praticá-las? Este é um dos pilares que dão base à perpetuação dos erros.