Disciplina não sai de moda
Vivemos uma crise de disciplina em casa e na escola. Com honrosas exceções, esta é a realidade da educação familiar e formal, que vem se desenhando no Brasil (e certamente em outros países também) nas duas últimas décadas.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) virou uma espécie de bíblia para os que defendem uma educação infanto-juvenil baseada apenas em direitos. É um equívoco do tamanho da culpa que muitos pais sentem ao dizer um não convicto a seus filhos diante de certas posturas que estes têm nas mais diversas situações cotidianas.
A mídia nacional divulgou recentemente um exemplo de ação legalmente respaldada para se trabalhar a disciplina na escola a partir de vínculos com a família. O projeto intitulado “A ação do Ministério Público na redução da evasão e violência escolar”, encabeçado pelo promotor de Justiça Sérgio Fernando Raimundo Harfouche em Campo Grande-MS, traz uma luz para esse problema generalizado.
De acordo com seu autor, o projeto tem como meta levar a Promotoria à escola, em vez do contrário. A ideia é simples, como o próprio promotor descreveu: “o projeto consiste em deslocar um membro do Ministério Público para as unidades escolares da sua área de atuação, reunindo educadores e pais (ou responsáveis) de crianças e adolescentes, fortalecendo a autoridade destes atores. Nestas reuniões apresenta-se o Estatuto da Criança e do Adolescente, não como um escudo de proteção à indisciplina, mas um instrumento do qual a escola pode dispor para promover a aprendizagem em sala de aula, destacando que o Estatuto traz não só direitos, mas também deveres a serem cumpridos pelos adolescentes. Entre estes deveres orienta-se a criança e o adolescente quanto ao respeito devido aos seus mantenedores e educadores; sua contribuição no relacionamento saudável com os colegas, bem como na preservação do patrimônio público.”
Sérgio Harfouche disse num programa de TV que já fez valer a autoridade positiva dos diretores e professores, em consonância com os pais, levando vários alunos a cumprirem medidas disciplinares, como prestar serviços na cozinha, na quadra e em outras dependências de escolas de Campo Grande. Depoimentos dos próprios estudantes dão conta do quanto as punições foram importantes para eles terem a noção dos prejuízos causados por suas ações a outras pessoas e às instituições onde estudam.
Sobre os resultados práticos desse projeto, que poderia ser assumidamente copiado em todo o país, o promotor foi enfático em sua entrevista: “a redução da evasão escolar e a manutenção de ambiente propício à educação diminui drasticamente o volume de atos infracionais, que sobrecarregam todo o sistema, desde a intervenção dos conselheiros tutelares até a decisão judicial.”
Eu, que vivenciei a infância na década de 1970, quando a família e a escola tinham uma ascendência inquestionável sobre as crianças e os adolescentes, acredito que a disciplina não seja algo tão volúvel a ponto de ter saído de moda. Dá para analisar que muitos pais e educadores que sofreram na pele algum tipo de repressão em casa e na escola naquela época fazem de tudo para não repeti-la com seus filhos e alunos. Para isto optam por modelos de educação e de escolas que se baseiam na liberdade de expressão das crianças e dos adolescentes, na sua criatividade e na possibilidade de escolha dos seus próprios caminhos.
Tais propósitos são absolutamente coerentes com o que há de melhor na formação de uma pessoa saudável. O problema está na confusão que muitos adultos fazem entre oprimir e castrar seus filhos e alunos com a falta de limite, respeito e disciplina, que boa parte deles faz questão de ostentar.