A essência do otimismo
Realmente é um mistério saber em que recanto do ser humano reside a essência do otimismo. Quando paramos para pensar nos rumos que a humanidade tomou em termos de evolução coletiva e nos seus resultados desastrosos, é impossível não ficarmos descrentes num futuro melhor.
A não ser que o sentido maior da existência humana na Terra esteja no processo em si, e não no fim, não dá para esperarmos grandes mudanças nesta trajetória que vemos estampada, dia após dia, nas notícias de todos os órgãos da mídia. Mesmo já tendo tecnologia para visitar outros planetas, aqui no nosso ainda há bilhões sem comida, sem água e sem moradia decente. Não dá para acreditar no futuro de uma raça que deixa algo assim acontecer, apesar de todas as resoluções que temos para cada um dos nossos problemas.
Talvez esteja aí a essência do otimismo: saber que existem soluções palpáveis para as principais agruras que nos afligem. Ao contrário do que muitas pessoas pensam, o pessimismo social não nasce nos terrenos áridos das nações mais pobres do mundo. Neles os desafortunados costumam rir enquanto tiram leite de pedra. O verdadeiro pessimismo se agiganta mesmo nas bolsas de valores, entre os mega investidores que recuam diante da oscilação do dólar ou da alta no preço do petróleo.
Há algum tempo o cantor e compositor baiano Tom Zé disse numa entrevista que não acredita que estejamos numa nova era de pessimismo. Ele, que sempre foi mais reconhecido no exterior do que em sua própria terra, justificou a sua afirmação com uma análise curiosa: “(...) Parece que a nação vive até um momento otimista. O que há é um pessimismo profissional. O Brasil tem duas televisões: uma às 6h30min, otimista, que mostra o povo plantando café, resolvendo problemas na lavoura, canalizando água. A gente assiste e fica carregado de vontade de trabalhar, inflado de alegria e esperança. Mas às 11 horas acordam os especuladores, os financistas, os golpistas brasileiros e de todas as nações (...)”.
O compositor, que foi um dos ícones do movimento tropicalista na MPB, enfatiza que são estes os pessimistas: os que vivem para confabular a queda de algum governo, de alguma bolsa; aqueles que acreditam de verdade que são as guerras que fazem correr dinheiro. Quem quiser que deixe para sair em busca da própria realização depois que a tal da crise passar. Vamos todos morrer ouvindo falar em crises políticas e econômicas; em macro e micro guerras; em inflação e elevação do custo de vida.
É verdade que tudo se torna bem mais difícil com menos dinheiro, com mais dívidas e com a falta de novas oportunidades profissionais. No entanto, as realizações pessoais não podem estar atreladas apenas a este caminho. Há quem consiga estar feliz e em paz com poucos bens materiais e com aspirações que passam longe da desenfreada busca por poder e riqueza.
Antes que o leitor pense que já alcancei tais possibilidades, infelizmente não me sinto maduro o bastante para compreender a sua real dimensão. Ao contrário, ainda me vejo motivado a realizar meus sonhos a partir de conquistas bem materiais e com necessidade de alicerce financeiro. Coloco-me apenas no rol dos que têm consciência das pedras e espinhos que existem neste caminho.
A falta de desprendimento ocasiona muitas vezes um peso capaz de derrubar o mais convicto dos otimistas. Muitos são aqueles que terminam se vendo como fracassados quando, por falta de dinheiro ou prestígio social, são convidados a sair de cena. Sobreviver a golpes como este é tarefa para quem tem caráter bem formado e espírito de vencedor.
A essência do otimismo só pode residir na fé... De Deus a si próprio, há muito o que se colocar depois das reticências. É como dizem Herbert Viana e Bi Ribeiro (Os Paralamas do Sucesso) na música Alagados: “a esperança não vem do mar nem das antenas de TV; a arte de viver da fé, só não se sabe fé em quê”.