Intolerância e falso moralismo
O episódio da universitária Geisy Villa Nova Arruda, que recentemente quase foi linchada por colegas por ter ido à aula com um minivestido, ganhou repercussão até na imprensa internacional e continua em aberto. Depois do Conselho Superior da Uniban – Universidade Bandeirante (unidade de São Bernardo do Campo-SP) ter expulsado a estudante do primeiro período de Turismo, alegando que ela infringiu princípios morais previstos no Regimento Interno da instituição, foi forçada a voltar atrás diante da repercussão negativa que o caso teve. Para alguns agressores identificados, houve apenas uma leve suspensão.
Ainda que essa história tivesse ocorrido dentro de uma igreja, onde a roupa usada pela jovem pudesse ser apontada como uma afronta ao ambiente religioso, não justificaria as reações que o Brasil inteiro assistiu por conta do contemporâneo fenômeno do Big Brother geral. Em plena era do mundo em rede, celulares e máquinas digitais estão sempre a postos para transformar qualquer acontecimento em notícia instantânea. Há até quem forje flagrantes para ganhar espaço na grande mídia.
Assim que decidiu pela expulsão de Geisy Arruda, a Uniban publicou em jornais de grande circulação uma nota, alegando que a aluna cometeu “um flagrante desrespeito aos princípios éticos, à dignidade acadêmica e à moralidade”. Num dos trechos, apresentou os seguintes argumentos: “foi apurado que a aluna tem frequentado as dependências da unidade em trajes inadequados, indicando uma postura incompatível com o ambiente da universidade, e, apesar de alertada, não modificou seu comportamento. A sindicância apurou que, no dia da ocorrência dos fatos, a aluna fez um percurso maior que o habitual, aumentando sua exposição e ensejando, de forma explícita, os apelos dos alunos que se manifestavam em relação à sua postura, chegando, inclusive, a posar para fotos”.
Se vestido curto e exibição do corpo fossem, de fato, motivos para alguma aluna ser expulsa de uma instituição de ensino, sob alegação de desrespeito aos princípios éticos, à dignidade acadêmica e à moralidade, universidades nos quatro cantos do Brasil estariam seriamente esvaziadas. O que houve na Uniban foi uma clara manifestação de intolerância e de falso moralismo, que se agigantou pela ação covarde e previsível das ditas cabeças pensantes deste país, que adoram abrir a boca para dizer que são estudantes do ensino superior.
Superioridade só se for na arrogância e na estupidez. Provavelmente muitos dos que hostilizaram Geisy são os mesmos que assediam mulheres na rua de maneira chula e vivem em repúblicas barulhentas, que atormentam vizinhos com som alto, gritos, palavrões e festas regadas a drogas e bebedeiras. Quem mora em Viçosa-MG (como eu) ou em outras cidades universitárias conhece bem o perfil deste tipo de estudante.
Os que humilharam a jovem, chamando-a de todos os sinônimos de prostituta, são insensíveis como a “voz feminina” que aparece na gravação dizendo “dane-se” diante do “ela está chorando”, mencionado pelo colega que filmava tudo. Tenho medo dos futuros profissionais que estas pessoas se tornarão.
Não se trata aqui de dar aval ao uso de roupas curtas pelas estudantes em estabelecimentos de ensino ou em qualquer outro lugar. Até porque vivemos numa nação em que a liberdade de expressão e o direito de ir e vir estão garantidos na sua Carta Magna. No mais, a própria moda e o padrão de comportamento que prevalecem em novelas, reality-shows e outros tantos programas de TV e veículos da mídia deixam bem claro para quem quiser copiar que o corpo feminino é para ser exibido. Geisy Arruda é só mais uma que atendeu a este chamado (e certamente atenderá ao chamado da Playboy).