Medo de sentir dor
Quando o assunto é suicídio normalmente se pensa em pessoas que simplesmente desistiram da vida. Olhando por este ângulo parece ser a relação mais óbvia, principalmente porque os suicidas optam exatamente por algo do qual a maioria foge com todas as forças.
No entanto, estudos clássicos e contemporâneos nos campos da psicologia e da espiritualidade apontam causas bem mais simples para a escolha da morte. Uma delas é um agudo medo da dor. Neste caso, opta-se pela morte não por falta de apego à vida, mas para se livrar da dor momentânea.
Tanto psicólogos quanto estudiosos dos assuntos espirituais costumam dizer que o suicida procura escapar de um sofrimento insuportável, real ou fantasiado, interno ou externo. Sendo assim, o ato suicida seria uma espécie de mensagem, uma maneira de chamar atenção para as próprias dores e pedir ajuda.
O medo da dor é praticamente um sentimento de todas as pessoas. Difícil imaginar alguém que não o tenha ou, pelo menos, que nunca o tenha tido. A diferença está entre as formas com que cada um lida com este medo. Uns enfrentam a dor para superá-la ou para torná-la mais suportável no futuro. É o caso dos que aceitam certos sacrifícios físicos ou emocionais, mesmo sabendo do que eles são capazes de provocar. Outros, ao contrário, sequer gostam de pensar nas situações em que tenham que encará-la. O terror que alguns têm de dentista, por exemplo, faz com que o sofrimento comece antes mesmo do tratamento.
Para o suicida a dor é um fardo pesado demais, e somente a idéia de carregá-lo já o torna intolerável. Pensar em morrer ou mesmo concretizar tal escolha parece alternativas bem mais fáceis na sua avaliação. Muitos dos que conseguiram tirar a própria vida talvez tivessem mudado de idéia se tivessem conseguido racionalizar e enfrentar o que ocasionou a sua dor. Em vários casos os problemas que motivam o suicídio são tão localizados e superficiais que podem ser resolvidos com tratamentos relativamente simples.
Outra análise do assunto nos remete a acreditar que ninguém, deliberadamente ou em sã consciência, escolhe sofrer, a não ser que tenha alguma intenção com tal sofrimento. Daí as atitudes de alguns suicidas serem associadas a certo desejo de vingança.
Há teorias que defendem que geralmente o suicida fantasia a reação dos vivos perante a sua morte, imaginando que estes serão punidos pelos sentimentos de tristeza, remorso e culpa. É como se ele eliminasse a própria vida pelo prazer de tornar real sua fantasia de vingança, de causar sofrimento aos outros. A questão é que isto não é totalmente consciente, uma vez que o resultado final de sua ação o coloca na condição de vítima.
Ainda com base nessa ótica, o suicida não deseja a morte, mas, sim, uma nova vida em que se sinta querido, importante. O final fantasiado, se possível, é o de que aquelas pessoas que ele imagina serem os responsáveis por sua dor se sintam culpadas e com remorso. Além da vingança contra os supostos inimigos, nessa outra vida ele imagina que terá amor e proteção e reencontrará pessoas queridas.
Não há receitas prontas de como lidar com o suicídio, mas é possível fazer algo pelas pessoas já na infância: prepará-las para enfrentarem seus medos, desde aqueles mais concretos, como o de sapos ou baratas, até os mais abstratos, como o do suposto fantasma debaixo da cama.