Escrever é um exercício
Não é preciso uma pesquisa formal para constatar o que é fato, ao menos, nas escolas brasileiras. Escrever é um obstáculo para a maioria dos estudantes. Melhor dizendo, para a maioria das pessoas.
Certamente esta não é uma deficiência que pode ser observada apenas nos primeiros anos de estudo. Trata-se de uma quase unanimidade verificada nos últimos anos do Ensino Médio – etapa imediatamente anterior à universidade – e mesmo nos cursos de graduação. A maioria esmagadora dos vestibulandos e dos universitários vê na redação um verdadeiro bicho-papão, um desafio que não consegue ser vencido com as fórmulas ensinadas em cursinhos, normalmente eficazes em outras disciplinas.
Saber onde começa e como se agrava um problema como esse é um sério desafio para governos, educadores, pesquisadores, pais e, em última instância, para os que precisam aprender a escrever. Não que seja uma regra, mas as pessoas que são incentivadas a ler desde criança, e não perdem este hábito ao longo da vida, têm maior probabilidade de não se intimidar com a escrita. É claro que nem sempre ler e escrever estão interligados como um exercício prazeroso com a mesma dimensão. Há quem goste de ler e não se interesse em escrever, e vice-versa. O que parece ter uma ligação direta é que a falta do primeiro pode dificultar consideravelmente a prática do segundo. E aqui, leitura não é somente de livros, mas de jornais, revistas, textos na internet... Escrever não está associado apenas a redações de escola ou de concursos, mas a cartas, textos literários, e-mails ou a conversas em sites de relacionamento.
Na infância, tanto a escola quanto a família têm um papel decisivo no incentivo à leitura e à escrita. Há pesquisas que demonstram que pais que leem para seus filhos ainda pequenos aumentam consideravelmente a chance de que eles se interessem a continuar lendo tão logo sejam alfabetizados. Nesta fase os presentes devem se revezar entre brinquedos e livros, principalmente para que estes últimos não sejam vinculados aos nem sempre sedutores livros didáticos. Em casa, leitura e lazer devem, sempre que possível, ter uma ligação próxima. O ato de escrever, no contexto familiar, pode nascer com uma troca lúdica de bilhetes cotidianos entre pais e filhos ou com o incentivo ao hábito de se escrever em diários, que também podem ser ótimos presentes.
Na escola é preciso que haja um trabalho conjunto de professores das mais diversas disciplinas para que a produção de textos não seja uma obrigação tão-somente de quem leciona Língua Portuguesa. Mesmo em disciplinas como Matemática, Física, Química e Biologia isto é possível, seja em trabalhos de pesquisa, seja em roteiros para apresentações orais por parte dos alunos.
É preciso que se crie ao longo da vida escolar uma consciência de que escrever não é uma exclusividade da área de humanas. Saber se expressar, conversando ou escrevendo, é uma necessidade profissional que abrange praticamente todas as áreas e afeta positiva ou negativamente um currículo. Sem falar que as pessoas que leem e escrevem com frequência estão, simultaneamente, organizando melhor as próprias ideias e alargando seus horizontes.
O medo de escrever vem sempre misturado com aquela vergonha de se passar por um julgamento e ser considerado inferior. Talvez uma sociedade como a nossa pouco possa julgar alguém neste sentido, já que uma fatia considerável da população é afetada por tal problema. No entanto, os vestibulares da vida não perdoam e fazem da redação uma peneira decisiva em seu processo seletivo.
Seja para se dar bem em provas de processos seletivos, seja por pura ampliação dos horizontes, escrever requer exercício. Assim como cozinhar, costurar, jogar bola e outras tantas tarefas cotidianas necessitam de dedicação para que se chegue a certo grau de excelência, a boa escrita requer vontade e empenho, mais até do que inspiração.