BELO SORRISO OU SORRISO BELO?

A necessidade de nos sentirmos protegidos por meio da afeição física, aliada à nossa cultura do consumo, denuncia uma postura sem contornos nítidos diante do espelho. Isso porque esses contornos são tão virtuais quanto à publicidade que prega cirurgias plásticas como solução para um mundo no qual histórias reais cedem lugar a máscaras.

Pensar a beleza física sob o pretexto da sobrevivência explica o porquê de os meios de comunicação enfatizar o tema de modo a comprometer conceitos e valores. Vinicius de Morais, em frase célebre, dizia que as muito feias que o perdoassem, mas beleza é fundamental. Esse excerto se inscreve dentro do nosso contexto quando a noção de sobrevivência constitui mero subterfúgio para o desejo de sobrepujança. Estarmos insatisfeitos com alguma parte do nosso corpo é uma forma de mostrarmos que a aparência física virou uma questão de honra coletiva e, o que é pior, sem nenhum pedido de perdão, mas de forma competitiva e individualista. Os exemplos são os excessos, a nossa expectativa tênue do elogio alheio, nosso personalismo que percorre desde a escolha de uma vestimenta exclusiva ao padrão físico representado pela garota alta e magérrima da televisão. Dessa forma, não medimos esforços para nos aproximarmos do institucionalizado conceito de belo, vendido nas prateleiras de uma sociedade na qual o que os olhos compram o coração vende.

Vale ressaltar ainda o “jeitinho brasileiro” quando queremos resolver nossos conflitos menos abstratos. Um novo visual como esconderijo da tristeza, da frustração, da idade nos motiva à utopia de que a lei do menor esforço supre lacunas e multiplica o que, inertes, diminuir-nos-ia o sucesso por mérito e esforço árduo. A possibilidade de desafio não reflete nosso crédito na continuidade da vida, mas um risco que preferimos remover ante uma visão panorâmica em que os heróis conquistam, vencem com seus corpos cinematograficamente esbeltos. Nesse sentido, o obstáculo é visto como uma insuficiência física, sinônimo de desvantagem e aliviado com um estético elogio de quem nem sempre propõe reciprocidade de valores como respeito e amizade.

O conceito de belo e de feio decide, pois, a nova forma de manuseio do bisturi em clínicas especializadas em vender nosso desejo adotivo de beleza. Desse modo, o sorriso belo, associado a status, a prestígio, substitui o belo sorriso. Este, sincero e capaz de energia própria. Aquele, o espelho que reflete a face distante da nossa auto – reconciliação.

G Monteiro
Enviado por G Monteiro em 13/02/2009
Código do texto: T1437830