Espírito olímpico
Há três semanas bilhões de pessoas no mundo inteiro têm na China o melhor motivo para centrar as suas atenções. A 29a edição das Olimpíadas modernas, em Pequim, traz não apenas boas e variadas notícias esportivas, mas também informações culturais, econômicas, políticas e ambientais.
Tenho assistido, em emissoras de TV diferentes, a uma série de reportagens sobre o cotidiano chinês. Com censura ou não, tem sido possível conhecer um pouco da história e do cotidiano de um país-continente, com pessoas e costumes tão diferentes da maioria dos países ocidentais.
Somente esse aspecto do evento já é o bastante para justificar a sua existência a cada quatro anos. O espírito olímpico, que atletas dos quatro cantos do planeta vivenciam durante o tempo em que estão competindo, extrapola para cada pessoa que entra em sintonia com os jogos. Este espírito fica claro, por exemplo, ao constatarmos que dois atletas ou times da Rússia e da Geórgia são capazes de disputar uma medalha com toda garra e vigor possíveis, sem perder o respeito por seus oponentes. O mesmo não dá para dizer dos governantes dos dois países, que, em plena confraternização olímpica, impõem a seus conterrâneos e ao mundo mais uma guerra sangrenta e de proporções ainda desconhecidas.
O esporte e a arte têm muito a ensinar à economia e à política. Há quem diga que os bilhões de dólares gastos pela China na realização dos atuais jogos poderiam ser melhor empregados na melhoria de vida dos chineses. Há quem argumente ainda que uma nação que massacra outra (no caso do Tibet) não merece a honra de ser anfitriã de algo tão nobre quanto uma Olimpíada.
Ambos os argumentos fazem sentido, sim, embora o outro lado da história também deva ser considerado. Os bilhões de dólares gastos podem ser revertidos, a curto e médio prazos, em benefícios incalculáveis para os chineses, assim como a visibilidade mundial do evento possa trazer novas perspectivas sócio-políticas para o povo tibetano.
Os Jogos Olímpicos de Pequim levaram para a China milhares de profissionais e amadoras dispostos a registrar flagrantes que censura alguma é capaz de deter. Além do mais, as fronteiras comerciais já desbravadas e ansiadas pelo gigante oriental pressupõem mais contato com outras línguas e culturas, com o que elas têm de bom a ensinar.
Apesar de estar sempre antenado em todas essas questões, confesso que aproveito mesmo as Olimpíadas para curtir o seu mote principal: o esporte. Como brasileiro, torço para meu país estar lá no alto do pódio, à frente no quadro de medalhas. Sei, no entanto, que ainda temos um longo caminho a percorrer até sermos considerados uma potência esportiva – algo que pode ser traduzido como estar presente entre os primeiros de várias modalidades esportivas, e não apenas de uma ou duas dezenas delas.
Já deveriam existir no Brasil, por exemplo, centros de multi-esporte pelo menos em cada capital; locais onde atletas pudessem encontrar boa estrutura para aprender, para treinar e para competir. As escolas e as universidades, como acontece nos países desenvolvidos, deveriam ser bases para a formação de novos atletas e fomento ao esporte. Por fim, a busca de parcerias com a iniciativa privada poderia ser mais efetiva, principalmente com descontos convidativos em impostos para as empresas que investissem no setor. Medalhas e boas colocações em competições internacionais seriam conseqüências lógicas e bem menos importantes do que os benefícios sociais que certamente viriam. Infelizmente, a realidade é ainda infinitamente inferior.