Gatilhos e detonadores
Faltariam divãs e analistas para dar conta das tantas mentes insanas existentes nos quatro cantos do planeta. Criminosos de guerra e assassinos em série; terroristas e tiranos; pedófilos e estupradores; psicopatas e homicidas a serviço do crime organizado... Há centenas de milhares deles entre nós, mas só nos damos conta quando acontecem barbaridades como o assassinato do menino João Hélio, no Rio, ou a chacina de 32 pessoas na Universidade Virginia Tech, nos Estados Unidos, promovida pelo universitário sul-coreano Cho Seung-Hui, de 23 anos.
É muito simples constatar as conseqüências dessas e de outras tantas insanidades, como as guerras que matam todos os dias ao redor do mundo. Identificar os seus reais agentes causadores é que é o grande desafio. Tanto os assassinos de João Hélio quanto Cho Seung-Hui (que cometeu suicídio após matar alunos e professores da instituição em que estudava) um dia foram bebês e vivenciaram experiências de absoluta normalidade para qualquer ser humano. Resta, então, saber em que momento de suas vidas eles começaram a adoecer psicologicamente.
Achar culpados é a primeira reação de todos. Quando um assassino é preso, a comoção popular desencadeia pedidos de punição exemplar, que normalmente passa (ainda que em pensamento) pela vontade de que ele também morra, desapareça para sempre. E quando o homicida é um homem-bomba ou, como o sul-coreano, alguém que tira a própria vida após cometer o ato insano? Fica um vazio difícil de ser preenchido; algo como uma necessidade de investigar se, por trás deles, não há pais culpados, governos omissos, sociedades indiferentes.
A meu ver, a busca deveria começar na base espiritual na qual se erguem famílias, religiões, escolas e demais instituições que sustentam nações e todas as suas tradições e valores. Dia desses recebi um e-mail intitulado “Infância Roubada”, de autoria desconhecida, que apresenta imagens e revelações chocantes sobre as muitas formas de abandono das crianças em diversos países e culturas.
O autor, já no final, constata que tudo de ruim que aciona o desprezo e a indiferença com os problemas da infância é decorrência da falta de misericórdia. Palavra originária do latim, a partir da junção de “misereo” (miséria) e “cor” (coração), misericórdia pode ser entendida como o sentimento de empatia que nos impele a colocar a miséria do próximo em nossos próprios corações. Algo como “o coração que se compadece e age”.
A razão, pura e simples, dificilmente conseguirá explicar tanto desequilíbrio no seio da raça humana. Ainda que houvesse divãs e analistas em número suficiente para atender a todos os insanos de plantão, muito provavelmente grande parte deles continuaria exatamente como é. Resta, então, assimilarmos que para certos gatilhos e detonadores mentais, somente escudos espirituais.