A guerra e a fome
Por mais que a lógica do lucro e do poder explique praticamente todas as aberrações sociais cometidas pelos seres humanos, ela continua ilógica na visão de um sábio autêntico. Um relatório divulgado há pouco tempo pela ONU (Organização das Nações Unidas) ressaltou que o número de vítimas da desnutrição grave e permanente aumentou em 12 milhões em apenas um ano, passando de 842 milhões em 2005 para 854 milhões de pessoas em 2006. Isso representa um em cada seis habitantes do planeta.
Ainda segundo fontes da ONU, em 2006 a fome matou uma criança menor de dez anos a cada cinco segundos no mundo; e a cada quatro minutos uma pessoa perdeu a vista por falta de vitamina A. O contra-senso disso está no fato de que a Terra, de acordo com cálculos de especialistas da mesma organização, tem potencial para alimentar com 2.700 calorias diárias 12 bilhões de pessoas, quase o dobro da população mundial.
Enquanto a ONU divulgava um relatório com números tão chocantes, o Instituto de Pesquisa de Paz Internacional de Estocolmo (Sipri) mencionava em seu relatório anual que em 2006 o mundo gastou por ano 1,2 trilhão de dólares (cerca de 2,3 trilhões de reais) com guerras. Uma elevação de 3,5% nos gastos militares do planeta, em comparação com o ano anterior.
Segundo esse relatório, somente os Estados Unidos foram responsáveis por quase a metade de todo o dinheiro dedicado por governos a armas em 2006, gastando 529 bilhões de dólares (cerca de 1,2 trilhão de reais) – um crescimento de 4,75% (acima da média mundial). Por outro lado, o Programa Mundial de Alimentação do Departamento de Estado norte-americano – a maior agência assistencial do mundo – possui um orçamento anual de 3 bilhões de dólares (aproximadamente 5 bilhões de reais). Dinheiro que, em tese, é usado para combater a fome em várias partes do mundo.
Antes que o texto vire um emaranhado de números e cifras, justifico a citação dos dados anteriores como uma prova cabal da insensatez dos mandatários do planeta. Não é preciso ser economista para afirmar que 1,2 trilhão de dólares por ano não somente daria para acabar com a fome das 854 milhões de pessoas que dela são vítimas, como acabaria com todos os demais itens que compõem o estado de miséria em que vivem outros tantos milhões.
Talvez alguma mente insana tente justificar a indústria da guerra como uma impulsionadora de milhões de empregos diretos e indiretos em todos os continentes. Ainda assim a idéia fugirá de toda lógica plausível a quem pense no destino da raça humana. É óbvio que quaisquer indústrias voltadas para a construção das reais melhorias de vida das sociedades e do meio ambiente serão muito mais bem sucedidas e aceitas pela maioria.
As guerras alimentam poucas bocas, ávidas por devorar tudo o que encontram pela frente. A fome, ao contrário, mata um “exército” de inocentes, incapazes de levantar um só dedo contra tamanho genocídio. Por mais conhecimento e tecnologias que a humanidade ostente como prova de sua civilização, o estado primitivo de seu espírito coletivo delata o real estágio evolutivo em que se encontra.