"Falta-lhe disciplina, não oportunidades": a ilusão da meritocracia

Em uma sociedade onde o discurso motivacional floresce, a ideia de que disciplina e motivação são os únicos elementos necessários para alcançar o sucesso parece inspiradora à primeira vista. No entanto, essa visão, muitas vezes difundida de forma simplista, ignora as profundas limitações estruturais, econômicas e sociais que muitas pessoas enfrentam. A suposição de que o sucesso é uma escolha pessoal, ancorada unicamente na força de vontade, desconsidera as barreiras sistêmicas que impactam amplas camadas da população.

Pensemos, por exemplo, em indivíduos que não têm acesso à educação de qualidade ou que vivem em regiões com poucos recursos de saúde e segurança. Em um contexto assim, o esforço individual, por mais genuíno que seja, enfrenta obstáculos que vão além da disciplina. Em muitos lugares, trabalhadores dedicados mantêm uma ética de trabalho rigorosa, mas ainda assim não conseguem avançar em virtude das desigualdades econômicas e da falta de oportunidades de emprego justas.

A disciplina, portanto, é apenas uma peça de um quebra-cabeça maior. Embora ela e a motivação sejam, de fato, virtudes importantes, o sucesso depende geralmente de fatores estruturais que não estão ao alcance do esforço individual. Infraestrutura social adequada, apoio governamental e acesso a recursos são elementos essenciais que determinam muitas vezes quem tem ou não uma chance justa de progredir.

Reconhecer essa realidade não é uma desculpa para negligenciar a disciplina, mas um chamado para entender que as histórias de superação pessoal nem sempre representam a experiência da maioria. O pensamento filosófico, ao examinar o que está além do indivíduo, nos lembra que a justiça e a igualdade de oportunidades são partes fundamentais para que cada um tenha a chance de atingir seu potencial.