*O Purgatório existe?

O Purgatório existe?

Para início de conversa, a resposta seria: sim e não. Mas como poderíamos ficar estáticos diante dessa bifurcação, sem saber decidir qual ala escolher?

A primeira sugestão seria que o leitor tivesse em mãos uma bíblia autêntica. Desgraçadamente, hoje, temos edições bíblicas para todos os gostos, seitas, interesses e finalidades, a exemplo, da “bíblia gay”, que suprimiu da original todos os versículos que condenavam as práticas homossexuais.

Noutras, ocorreram mudanças sutis, como por exemplo, deslocamento de vírgulas (,,), alterando, substancialmente, o sentido de muitos textos.

Como exemplo, cito a passagem onde Jesus fala com um dos crucificados: “Em verdade, eu te digo, hoje estarás comigo no Paraíso.”

Nas bíblias piratas, a vírgula foi deslocada e o texto aparece assim:

“Em verdade eu te digo hoje, estarás comigo no Paraíso.”

Isso foi feito, para justificar a tese da “dormição”, que afirma que todos os mortos estão aguardando a segunda vinda de Jesus.

Sugiro, portanto, a versão Bíblia de Jerusalém, ou qualquer outra que tenha o “Imprimatur” de um Bispo Católico. A minha, apenas como adendo, tem a assinatura de Dom Paulo Evaristo Arns.

O segundo caso a ser considerado é que Teologia é assunto de fé, podendo fugir, completamente, de fatos históricos ou científicos. Acreditar ou não acreditar é do foro de cada um.

Para os religiosos fundamentalistas, basta ter fé, para se alcançar a vida eterna. Nesse caso, qualquer pessoa entrará no céu “nas carreiras”, sem burocracia alguma, como se o céu fosse a casa da mãe Joana. Em contrapartida, o Purgatório seria apenas uma descabida invenção católica.

Para os Espíritas, esse assunto é ainda mais inaceitável, pois, segundo eles, as pessoas se purificam, através de reencarnações sucessivas. O Purgatório seria aqui e agora.

Nesse caso, a afirmação católica seria pura ficção e o sacrifício do Cristo apenas uma peça de teatro mal ensaiada, com final trágico.

O terceiro caso a ser mencionado é que, de fato, não existe na Bíblia a palavra “purgatório”. No entanto, sua existência não passa despercebida aos olhares mais atentos.

O assunto foi discutido, pela primeira vez, no Concílio Ecumênico de Florença, em meados do século XV, e é dogma da fé católica.

Quando eu era garoto, tive a visão do Purgatório na sua forma mais lúcida e real, contudo, só fui entender anos depois...

Teresina, hoje, já virou um polo de referência em saúde, graças a Deus, mas nem sempre foi assim. Na década de 60, minha mãe foi para o Rio de Janeiro fazer um tratamento cardíaco, pois seu coração estava crescendo (cardiomegalia). Coração de mãe tem disso e por isso, sempre cabe mais um!

Após seis meses, ela retornou sem prévio aviso. Eu estava jogando bola no campinho, quando um dos coleguinhas me avisou que ela estava descendo de um táxi. Imediatamente, larguei tudo e fui correndo para casa.

Minha mãe trajava um vestido meio longo, de saia rodada, muito usado na época e apropriado para a sua índole, branco como as nuvens de verão.

Ao ver-me correndo ao seu encontro, simplesmente, ela abriu os braços sorrindo…

Eu estava melado de suor e terra, imundo para qualquer evento. A cena que se apresentava era de um contraste infinito. As pessoas nos olhavam perplexas, já antevendo o desastre que iria acontecer.

Eu fui o primeiro a gritar:

–Mãe! Agora não! Vou tomar banho primeiro!

Não sei como fiz aquilo. Passei por longe dela, tomei banho, coloquei uma roupa limpa, passei perfume e voltei para o melhor abraço do mundo!

Isso, pra mim, é o Purgatório.

Não cabe na minha cabecinha de prego, que uma pessoa queira ultrapassar, conscientemente, a linha da tosca pretensão de se achar tão pura e santa, sem mácula alguma, a ponto de entrar no céu e se abraçar com Jesus, como se isso lhe fosse até um direito adquirido. Isso contraria a afirmação de que muitos serão chamados, mas poucos serão os escolhidos.

Na linguagem soteriológica, sem levar em conta a razão espaço e finitude, o Purgatório é uma espécie de banheiro, onde quem não morreu em pecado mortal, terá que passar, obrigatoriamente, por uma limpeza geral. Não me parece que esse assunto seja de total alheamento ao mais incipiente raciocínio.

O Purgatório é um local de purificação. Sem medo de engano, podemos dizer que ele é, sim, a antessala do céu. Estar no Purgatório já é uma garantia de salvação.

Vale destacar que algumas correntes judaicas acreditam também na purificação das almas após a morte, como os Sucedeus que, nos tempos de Jesus, desacreditavam em muitas coisas.

Eu nem irei falar no primeiro Livro dos Macabeus, para não melindrar ninguém, mas cito a Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios, 3:11-15, que diz: “As obras de cada um passarão pela prova do fogo”.

Ora, então não será apenas e tão somente pela fé que seremos avaliados.

Os Evangelhos sinóticos falam de um “pecado que não será perdoado nem nesta vida nem na outra”. Logo, abre-nos a expectativa de que, ainda que tenhamos uma vida reta, algum expurgo será necessário no outro século. Isso é a purgação.

Claro que respeito todas as correntes de pensamentos e conclusões adversas, entretanto este é o ensinamento da Santa Madre Igreja Católica e Apostólica Romana.

PS.: Antes de ser publicado, este artigo foi visto pelo Bispo auxiliar de Salvador-BA, Dom Marco Eugênio G. Leite de Almeida, que me devolveu sem cortes ou recomendações.