"Os militares colocaram ordem no país".
"OS MILITARES COLOCARAM ORDEM NO PAIS".
Colocaram sim. E mataram uma galerinha. Mas o que é matar uma galerinha, né? O que é afundar o país num obscurantismo, né? Era legal eles decidirem o que você deveria ler e ouvir. Você vivia a mercê das decisões dos militares, com uma linda liberdade vigiada. E tudo isso, amigos, era pra nossa segurança. Os militares nos carregavam no colo e, acredito, muitas vezes nos davam de mamar. Era tanto zelo que me arrepia só de pensar.
Ah, tem aquelas histórias todas, de depoimentos de ex-torturadas no filme de Lúcia Murat: Que bom te ver viva. Que eu devo ter visto umas 5 vezes nos meus 15 anos. Talvez, sei lá, talvez... por isso, por ver mulheres emocionadas, chorando, falando o quanto tremiam diante de uma lagartixa; não que elas fossem virar um jacaré, mas, pelo simples fato, de que os torturadores esfregavam o bichinho em suas vaginas. Coisa leve, né? Mas isso tudo era pra nossa segurança!
Com o AI-5 eles tiveram toda a legitimação para justificar as suas atrocidades. Era lindo! Batiam na sua casa e te pegavam pelo braço, sem ter direito a defesa e te levavam para prestar depoimento e, muitas vezes, sumiam com você, mas sempre defendendo a ordem e os bons costumes. E quando eu digo sumiam, é tipo, sumir mesmo, do mapa, inclusive. Saca Eliza Samudio? Isso mesmo.
O país devia ser uma maravilha de 1964 a 1985. Tanto que não sei porque a Alice não se mudou pra cá.
Aconteciam coisas bacanas: tipo, o pai do Marcelo Rubens Paiva ser morto. O filho da Zuzu Angel também. Ela mesmo morreu em condições controversas - ah, uma morte a mais, uma morte a menos, vai fazer diferença? O jornalista Herzog foi morto e ainda tentaram simular um suicídio, inclusive, colocando um canudinho em seu pênis porque armaram um cenário de enforcamento - ou seja, a galera era criativa também. Diversos artistas e outras personalidades foram obrigadas a saírem do país, como Caetano, Gil, Betinho, dentre centenas. Músicas foram proibidas. Arranharam, por exemplo, duas faixas de um disco da Blitz, porque as canções foram vetadas, já que "eles" supunham que aquilo não poderia ser ouvido (apenas alguns acontecimentos desse país de uma época maravilhosa). Ah, quem sabe se houver Ditadura de novo, você será proibida de ler aquele livrinho erótico no cair da madrugada. Porque se eles cismarem que você se excita com isso, você estará criando um problema para a sociedade.
Mas, segundo Zezé di Camargo, na sua sapiência de pensador sertanejo, o militarismo deve voltar para reorganizar tudo e devolver de volta um país "DECENTE" (será que mulheres poderão usar minissaia?).
Querem armas e canhões, com amor e carinho.
Em breve, acredito, depois de fechamento de Universidades (acho que estudar hoje em dia, virou um ato comunista) vão pedir a queima de livros em praça pública.
Pensar pra quê? Vamos voltar a um mundo preconizado por Orson Orwell, no livro 1984... Ah, desculpa, é um livro. Pode ser muito perigoso ler hoje em dia!
Ah, deixem-me eu me apresentar. Eu me chamo, Raul Franco, e peço que queimem este texto depois de ler (ou denunciem; de preferência, alegando alguma coisa religiosa, isso tem um poder incrível e pode surtir efeito).
OBS.: Este texto contém altas doses de cinismo moderado. Algumas mentes podem não captar o caráter abstrato de algumas metáforas.