Tiririca X Chalita
O primeiro e o segundo colocados na disputa a deputado federal por São Paulo mostram com clareza a diferença entre gozação e seriedade numa eleição. Com 1.352.173 votos, Francisco Everardo Oliveira Silva (o palhaço Tiririca) é disparado o candidato à Câmara Federal com mais votos em todo o País. Ele obteve mais do que o dobro do que conseguiu Gabriel Chalita (559.672 votos), o segundo lugar.
Bom seria se a vitória de Tiririca representasse a vontade popular de ver alguém realmente gabaritado para ocupar um cargo tão importante para os destinos do Brasil. Capacidade que, de fato, tem Chalita.
Sem desmerecer o valor artístico de Tiririca (afinal, muitas crianças devem rir de suas palhaçadas!), é difícil acreditar no que possa fazer o autor de “Florentina” no Congresso Nacional. Para justificar a minha descrença, cito só um trechinho da entrevista que ele deu à Rede Globo poucas horas depois de confirmada a sua façanha eleitoral. O repórter perguntou o que ele tinha em mente como deputado federal eleito. A resposta: “cabelo”. Em seguida, ele completou: “falando sério agora, quando eu assumir vou levar para a Câmara umas coisas lá”.
Um regime democrático que se preze deve, sim, ter representantes de todos os segmentos da sociedade. O que não quer dizer que qualquer um esteja preparado para este nível de representação. É o caso de Tiririca, por tudo que se viu durante a sua campanha. Como levar a sério um candidato que teve a coragem de, no horário eleitoral gratuito da TV, perguntar ao eleitor se ele sabia o que é feito na Câmara e responder que nem ele sabe (para, em seguida, dizer: “vote em mim que depois eu te conto”)?
Antes que alguém possa pensar em dizer algo do tipo “quem sabe Tiririca não seja mais honesto do que os deputados considerados mais preparados?”, eu respondo: ter honestidade é um pressuposto para qualquer ser humano, não uma qualidade para se colocar no currículo. Uma nação que se queira séria e respeitada se faz também com políticos preparados para ocuparem as suas respectivas funções. Se é exigida em cada profissão uma capacitação técnica que lhe seja inerente, por que para a ocupação de cargos tão importantes no Executivo e no Legislativo a “porteira” é tão escancarada?
Felizmente, é também possível ver alguém como Gabriel Chalita na Câmara Federal. Seu currículo tomaria todo este texto, mas não é necessariamente por ele que considero este filósofo de 41 anos, natural de Cachoeira Paulista-SP, alguém qualificado para ocupar uma cadeira no Congresso. Com mais de 50 livros publicados (o primeiro aos 12 anos) e uma carreira impecável como professor e palestrante, ele tem ainda na vida pública a vivência de quem foi vereador aos 19 anos, secretário de Estado da Secretaria da Juventude, Esporte e Lazer do Governo do Estado de São Paulo, secretário de Estado da Educação de São Paulo e presidente por dois mandatos do Consed (Conselho Nacional de Secretários de Estado da Educação). Sua prática está diretamente atrelada ao bem pensar, à educação que emancipa.
Chalita e Tiririca são, respectivamente, as personificações da seriedade e da gozação na política brasileira. Certa vez Charles Chaplin disse: “falei muitas vezes como um palhaço, mas jamais duvidei da sinceridade da plateia que ria”. Tomara que o deputado federal mais bem votado do Brasil possa surpreender e fazer mais do que conseguiu em “Florentina, Florentina, Florentina de Jesus”...