SER PROFESSOR: O OLHAR QUE TRANSFORMA
SER PROFESSOR: O PODER DO OLHAR TRANSFORMADOR DO PROFESSOR
Andrea Valentin Ramos de Moura
Débora Aparecida Morais
RESUMO
O presente artigo parte do filme Escritores da liberdade, baseado em história real, para constatar que o professor com um olhar de sensibilidade tem o poder de influenciar e transformar a vida do educando. O olhar da professora Erin Gruwell merece destaque, principalmente pela valorização da identidade do aluno e sua formação no processo ensino aprendizagem. À vista disso, com base em um projeto de leitura do livro Diário de Anne Frank, a professora pediu que os educandos elaborassem seu próprio diário, relatando de forma livre: seus pensamentos, sonhos e sentimentos. Que ao final, os alunos uniram suas histórias e produziram um livro Escritores da Liberdade, suplantando suas expectativas e transformando suas histórias de vida.
Palavras-chaves: Poder do Professor. Valorização da identidade. Olhar transformador.
INTRODUÇÃO
“O olhar de um professor tem o poder de fazer a inteligência de uma criança florescer ou murchar."
Rubem Alves
Este artigo pretende discorrer sobre o ser professor e o quanto seu olhar pode ser transformador na vida do aluno. Nessa perspectiva, começo por dizer que o professor é aquele que vai para além do ato de ensinar, ele acaba por assumir diversos papéis na vida do educando.
Atualmente tem-se aumentado o número de pesquisas sobre esse profissional e a importância do seu papel como sujeito formador.
GADOTTI (2003) diz que "A beleza existe em todo lugar. Depende do nosso olhar, da nossa sensibilidade; depende da nossa consciência, do nosso trabalho e do nosso cuidado. A beleza existe porque o ser humano é capaz de sonhar".
A partir do pressuposto podemos percorrer com mais clareza para melhor compreensão do sentido de transformação que o professor pode fazer na vida do aluno. Tendo em vista que, todo educando é capaz de sonhar, mas nem todo professor faz com que ele acredite nisso. Isso porque na prática docente é preciso muito mais do que ensinar o conteúdo, está muito além da tríplice professor, aluno e saber. Está ligado ao olhar com sensibilidade, em que o professor precisa fazer uma leitura do aluno. Isto é, perceber que a linguagem corporal diz muito sobre ele, perceber os sinais que o educando apresenta. Se é muito quieto, ou se é muito agitado, tudo isso tem um porquê, e cabe a esse profissional da educação o papel de perceber esses sinais e buscar compreendê-los, para que não caia na reprodução errônea discursiva de que o aluno não aprende porque é “burro”, ou “ele não tem jeito”. Mas sim como amparo e auxilio, a fim de que o educando transcenda para além dos muros da escola, exercendo enfim, papel protagonista na construção do conhecimento. Para tanto, é imprescindível que na prática docente o professor seja um norteador na construção dos saberes do educando:
[...] ao ensinar, não como um burocrata da mente, mas reconstruindo os caminhos de sua curiosidade – razão por que seu corpo consciente, sensível, emocionado, se abre às adivinhações dos alunos, à sua ingenuidade e à sua criatividade – o ensinante que assim atua tem, no seu ensinar, um momento rico de seu aprender. [...] (FREIRE, Paulo. 2001. p.259)
À guisa de um olhar diferenciado para com o aluno pode interferir negativamente no aprendizado do aluno. Por isso faz-se necessário que o professor faça uma leitura do seu aluno e em seguida crie uma zona proximal, ou seja, se aproxime dele a fim de conhecer melhor seu mundo. Isto é, sua convivência com a família, amigos e escola. Criar uma zona de conforto, para que o educando sinta-se à vontade a fim de permitir que o professor também se aproxime.
Em suma, esse artigo se apoiará em conceituados autores para apresentar de forma bibliográfica o que é ser professor e o quanto seu olhar com sensibilidade pode dar sentidos positivos e transformadores na vida do aluno.
SER PROFESSOR
Ser professor é basicamente ser uma aposta no futuro, você educa para o futuro. Ele é exemplo, trabalha com conteúdo, mas também trabalha como educador de uma atitude. Essa profissão é muito importante e essencial, pois se trata de ensinar humanidade aos alunos para que possam crescer e se responsabilizar pelo mundo. Deve se orgulhar do vínculo que cria com seus educandos e do comprometimento com sua missão. É necessário estabelecer uma parceria na qual ambos aprendam e cresçam.
O professor deixou de ser detentor do saber para ser instrumento que proporciona circulação do conhecimento dentro da sala de aula.
Não importa em qual modalidade de ensino o professor faz parte, qualquer um deles sabe que é preciso conhecer e reconhecer o contexto de cada aluno, suas necessidades e seu repertório de vida. Conduzir seus alunos é o papel fundamental do professor, mas acima de tudo, respeitar o tempo de cada um, pois o desenvolvimento humano é constante e continuo e isso também é seu papel.
Ser professor significa, ser um sujeito capaz de utilizar o seu conhecimento e a sua experiência para desenvolver-se em contextos pedagógicos práticos preexistentes, tomar decisões pessoais e individuais para melhor transmitir seus conhecimentos.
Para ALVES (2000): “A função de um professor é instigar o estudante a ter gosto e vontade de aprender, de abraçar o conhecimento”. E não há limite para o conhecimento. Por mais que você leia livros, se atualize constantemente, sempre existe algo novo para ser aprendido. Essa construção do conhecimento é diária, faz muito mais do que apenas ensinar, mas com seu exemplo e forma de se relacionar com o outro e com o ambiente, influencia na formação de valores.
Ser professor não é uma profissão, é uma missão, é viver intensamente o seu tempo com consciência e sensibilidade. Sua missão é ensinar, escutar, orientar, motivar, desafiar, descobrir potencialidades e desenvolver as habilidades de cada aluno com quem compartilha seus ensinamentos. Seu dia a dia é alimentado pelos próprios alunos, que são curiosos, contestadores, interessados, impulsionados em aprender. É nessa relação que o professor acredita que pode fazer a diferença na vida deles e despertá-los para serem pessoas melhores, que façam a diferença na sociedade futura. “Todo professor é marcante inclusive os ruins” (Freire).
A afirmação de FREIRE (2002. p.25) nos convida à uma reflexão de que “quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado.” O professor cuidadoso transforma seus alunos todos os dias. Esse mesmo professor que transforma, também é transformado, no ensinar e no aprender.
Um professor pode ser lembrado por toda vida, ter a capacidade de transformar um aluno indisciplinado em um estudante brilhante, desde que consiga cativá-lo e conquistar sua confiança.
METODOLOGIA - FILMOGRAFIA
No íntimo da metodologia gostaríamos de citar dentro da filmografia o filme Freedom Writers (Escritores da Liberdade traduzido em português no Brasil), datado de Estados Unidos em janeiro de 2007, exatamente pela aproximação que tem a figura do professor e o quanto isso foi transformador na formação de identidade do aluno.
O filme é baseado em uma história real e aborda os desafios da educação. Conta a história de uma professora de Literatura e Inglês, Erin Gruwel (interpretada por Hilary Swank ), que leciona em uma escola de periferia em Los Angeles, Califórnia. Enfrenta grandes desafios, uma vez que sua sala de aula é composta por alunos adolescentes com diversos problemas socioculturais oriundos de uma infância marcante. Esses alunos eram de diferentes nacionalidades, muitos faziam partes de gangues, não tinham respeito entre eles e nem se interessavam pelos estudos.
Diante desta visão a professora, recém-formada, se vê questionando a sua vocação e seu papel como educadora. Porém ela muda sua atitude em sala de aula e começa a perceber que os alunos possuem muito em comum um com o outro. Propõe então atividades para sensibilizar seus alunos, desenvolvendo métodos que partem da realidade de cada aluno, expressando esse trabalho por meio da leitura e da escrita.
Seu trabalho foi muito além da sala de aula. Ela possibilitou que seus alunos tivessem outras perspectivas de mundo dentro e fora da sala de aula. Enfrentou diversos problemas em relação à coordenação, os outros professores e aos próprios alunos, mas com sua afetividade e seu olhar transformador ela aproxima os educandos, criando uma zona de conforto e respeito, propondo atividades que objetivam a interação aluno-professor, aluno-aluno e aluno-sociedade.
Seu método de ensino empático não só teve êxito no sucesso acadêmico dos educandos, mas também em suas perspectivas de vida, de tal forma que passa a ser um elemento de proteção a esses adolescentes. A ação pedagógica da professora é transformadora, pois instiga a motivação dos alunos a expressar seus sentimentos seja através de relatos, poesia ou música. Além de alvitrar um projeto de leitura do livro Diário de Anne Frank , e a partir da leitura da obra literária, solicita aos alunos que eles escrevam um diário, relatando de forma livre: seus pensamentos, sonhos e sentimentos. Tal incentivo foi um marco crucial principalmente para os alunos, visto que, além da valorização no fator identitário e formação no ensino aprendizagem, os educandos uniram todas as histórias e produziram o livro: Escritores da Liberdade, suplantando suas expectativas e transformando suas histórias de vida.
“Todos somos atores de nossa vida, mas nem sempre podemos ter sua autoria. O pensar [e o escrever] favorece a autoria da existência”. (DULCE CRITELLI, 2006)
Rubem Alves reforça sobre o poder da afetividade ao dizer que “caberá ao educador em plena função, pôr em prática a sua ação de trabalhar a afetividade, pois a interação professor-aluno precisa ser realizada através do afeto, levando o aluno a uma aprendizagem significativa”. (ALVES, 2011).
ALSUBEL (1982) em sua teoria da aprendizagem significativa complementa ao dizer que “há necessidade da valorização dos conhecimentos prévios dos educandos para que os mesmos sejam capazes de construir estruturas mentais, levando-se em consideração a realidade em que o discente está inserido”.
Diante disso, o filme traz uma reflexão sobre o poder do olhar do professor e sua imagem como multiplicador, pois uma única ação do professor pode refletir para muitas pessoas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Constatamos que o professor em suas atribuições tem o poder como parte pertencente dessa atribuição, este poder faz parte de sua atuação, de sua trajetória. Ou seja, uma relação de poder. No entanto, não um poder instaurado, mas o poder de influenciar, de transformar.
Optou-se pelo poder como título desse artigo por entender conforme GADOTTI (2003) que “Ser professor hoje é viver intensamente o seu tempo com consciência e sensibilidade. Não se pode imaginar um futuro para humanidade sem educadores.”
O olhar do professor tem o poder de fazer com que o intelecto de uma criança, jovem ou adulto evolua ou regrida, o poder de estimular ou inibir a aprendizagem desse aluno. O professor tem o poder de despertar o melhor de cada aluno, mudar vidas e romper pré-conceitos.
Existem diversos filmes, com histórias reais sobre professores que conseguiram recuperar seus alunos que tinham problemas na escola, exemplo usado neste artigo como estudo o filme “Escritores da Liberdade” que mostra claramente esse poder que o professor possui. Esses filmes existem porque ao redor do mundo sempre houve e haverá professores inspiradores que promovem o bem aos seus alunos de forma diferenciada, tocante e respeitando os valores dos educandos.
[...] Mas, se ao contrário, em nossas mentes e corações, tivermos valores de otimismo, sentiremos que, em todas as situações, haverá aspectos positivos. Se o entusiasmo é o clarear de nossas mentes, perceberemos a vida em muitos tons e sons, com matizes de luzes e cores, sabores e amores. A cor e o valor do mundo dependem do nosso olhar e do nosso amar. O mundo ao meu redor são luzes dos meus pensamentos. [...] (ALVES, 2009, p. 59)
Ser professor é transformador, mas é preciso que ele saiba disso. O professor inspirador vai além do tradicional, existe a empatia e a vontade de transformar vidas, e se educar é transformar, o professor é quem tem essa missão e que faz toda a diferença, tem o poder de influenciar e de modificar a percepção a respeito da realidade.
O professor é o agente crucial na transformação social. Não dá para valorizar a educação sem valorizar o professor. Segundo Freire (1979, p.84): "Educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo". Diante disso, podemos concluir que a educação não nos transforma, ela nos move para transformação. E essa transformação é multiplicadora, visto que, educar leva a busca de saberes, e ao saber é desenvolvido no educando sua consciência crítica e analítica.
Portanto, o conhecimento é transformador e multiplicador. Mas, essa transformação só será possível, se o professor tiver um olhar com sensibilidade e empatia, o poder do olhar. Nunca esquecendo que na formação no processo ensino aprendizagem ele não é detentor do saber, uma vez que, o ensinar e o aprender é uma via de mão dupla.
[...] Começo por aceitar que o formador é o sujeito em relação a quem me considero o objeto, que ele é o sujeito que me forma e eu, o objeto por ele formado [...] (FREIRE. 2002, p.25). E essa relação aluno-professor é o marco para transformação do educando para a vida.
REFERÊNCIAS
ALVES, Maria Dolores Fortes. Favorecendo a inclusão pelos caminhos do coração: complexidade, pensamento ecossistêmico e transdisciplinaridade. Rio de Janeiro: WAK. ED,2009.
AUSUBEL, D. P. A aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo: Moraes, 1982. CRITELLI, Dulce. O ofício de pensar. In: Rev. Educação: Hannah Arendt pensa a educação. São Paulo: Segmento, n.4, 2006, p.74-83.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da Liberdade. 25. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à prática Educativa. 25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
GADOTTI, Moacir. Boniteza de um sonho: Ensinar-e-aprender com sentido. Rio Grande do Sul: Feevale, 2003.