Minha experiência com a redação do ENEM
Frequentemente me perguntam: “Qual é o segredo para escrever bem?” ou então “Como você conseguiu tirar 940 na redação do enem 2019 sendo que foi a primeira vez que você respondeu à prova?” Ponderei muito sobre tais questionamentos e curiosidades, e cheguei à conclusão de que em respeito à educação e à escrita como forma de transformar realidades, eu devo compartilhar minha experiência.
Escrevo desde que me conheço por gente, e sempre que tenho a oportunidade, participo de concursos de escrita e redação. Escrever é para mim, mais do que uma fonte de alegria e satisfação, sempre acreditei no poder das palavras. Construí cedo em mim mesma a concepção de que a escrita não se restringe ao preenchimento de uma folha de papel, mas que ela ultrapassa os limites da análise e se estende para o campo daquilo que é concreto. Analisando a partir dessa perspectiva poética, um dos objetivos da redação da prova do ENEM, consiste justamente na competência de o estudante propor uma intervenção para o problema apresentado, o que mostra que o enem preza não apenas pela capacidade dissertativa do aluno, mas também pela habilidade de reconhecer a linguagem como um ente modificador na sociedade.
Compreendo as dificuldades que permeiam o mundo da redação, afinal, escrever é afirmar a própria língua, é pensar através de palavras com a maestria de tornar suas ideias claras. É completamente normal e aceitável que o estudante encontre obstáculos durante o percurso de seus estudos. Argumentar de forma objetiva e coerente na redação do ENEM não é uma tarefa fácil, exige treino e aperfeiçoamento. Admito que nunca tive a necessidade de me debruçar sobre materiais técnicos de estudo sobre redação, mas é fundamental estar atento às cobranças da prova, seja ela o ENEM, o vestibular ou algum concurso, pois é nas especificidades que residem as artimanhas da arte do bem-escrever.
O Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) é uma prova realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), autarquia vinculada ao Ministério da Educação do Brasil, e foi criada em 1998. Ela é utilizada principalmente como método de avaliação da qualidade do ensino médio no país, além de ser aceita como forma de ingresso em algumas universidades brasileiras. A prova é realizada em dois dias distintos, sendo que a redação ocorre no primeiro dia de provas, juntamente com as questões de linguagens e ciências humanas, o que é um bônus para o estudante, visto que as questões do mesmo dia em que a modalidade escrita ocorre, são ricas em referências e informações que podem enriquecer o texto.
A pontuação relacionada à redação do ENEM distribui-se em cinco competências, cada uma, com a pontuação máxima de 200 pontos a ser atingida. São elas e seus critérios respectivamente:
1. Demonstrar domínio da norma da língua escrita: O participante demonstra excelente domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa e de escolha de registro. Desvios gramaticais ou de convenções da escrita, neste nível, são aceitos somente como excepcionalidade e quando não caracterizam reincidência.
2. Compreender a proposta de redação e aplicar conceitos das várias áreas de conhecimento para desenvolver o tema, dentro dos limites estruturais do texto dissertativo-argumentativo: O participante desenvolve o tema por meio de argumentação consistente, a partir de um repertório sociocultural produtivo e apresenta excelente domínio do texto dissertativo-argumentativo, ou seja, em seu texto, o tema é desenvolvido de modo consistente, por meio do acesso a outras áreas do conhecimento, com progressão fluente e articulada ao projeto do texto.
3. Selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista: Em defesa de um ponto de vista, o texto apresenta informações, fatos e opiniões relacionados ao tema proposto, de forma consistente e organizada, configurando autoria, ou seja, os argumentos selecionados estão organizados e relacionados de forma consistente com o ponto de vista defendido e com o tema proposto, configurando-se independência de pensamento e autoria.
4. Demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos necessários para a construção da argumentação: O participante articula as partes do texto com poucas inadequações e apresenta repertório diversificado de recursos coesivos.
5. Elaborar proposta de intervenção para o problema abordado, respeitando os direitos humanos: O participante elabora excelente proposta de intervenção, detalhada, relacionada ao tema e articulada à discussão desenvolvida no texto. Trata-se de redação cuja proposta de intervenção seja muito bem elaborada, relacionada ao tema, decorrente da discussão desenvolvida no texto, abrangente e bem detalhada.
Costumo dizer que a raiz de toda redação está na leitura. A proposta da redação do ENEM sempre está vinculada aos textos motivadores que conduzem o aluno ao cerne da discussão que o tema propõe, visando um afunilamento diante de um tema abrangente, uma orientação mais detalhada para que o estudante consolide seus argumentos e apresente seu ponto de vista com um embasamento teórico. É imprescindível que os textos motivadores sejam lidos com atenção, pois por mais que eu não considere seguro retirar informações desses textos a fim de utilizá-las na redação, os textos motivadores podem oferecer pistas, esclarecer alguma dúvida e apresentar dados estatísticos ou siglas e órgãos reguladores. Mas acima de tudo, costumo dizer isso (que a raiz de toda redação está na leitura), pois por mais clichê que isso possa soar, ler é mais que essencial, a leitura é uma importante aliada, tanto na busca pelo enriquecimento do vocabulário, quanto no progresso do indivíduo em relação ao conhecimento que o hábito de ler proporciona. Encarar a leitura como atividade prazerosa é incorporá-la ao cotidiano e buscar fontes diversas de ampliação do repertório cultural. Ler muitas vezes é associado a manter uma rotina, mas não devemos esquecer da importância de adquirir aquilo que se chama “leitura de mundo”, que se refere à capacidade de o indivíduo em avaliar criticamente o mundo a sua volta, de tirar proveito de suas vivências como forma de aprender e saber associá-las por exemplo a músicas, filmes, peças de teatro, obras de arte, essas são algumas das inúmeras formas de expressão que aguçam a leitura e a escuta ativa, capazes de fornecer uma significativa bagagem cultural.
Para garantir uma boa nota no ENEM, não basta dominar as normas de ortografia, sintaxe e morfologia da língua portuguesa, é preciso como dito anteriormente, estar aberto ao conhecimento de mundo, manter-se atualizado e acima de tudo, saber como aplicar esses saberes. Para isso, é importante estabelecer estratégias de estruturação do texto que se adequem à todas as exigências da prova. Com o passar do tempo e com treinos constantes de escrita, cada estudante encontra a melhor forma de organizar sua redação, de modo que a estruturação se padronize aos poucos e em um dado momento, o aluno percebe uma semelhança entre seus textos, que obedecem uma forma e variam somente conforme o conteúdo abordado. A seguir, apresentarei o método que mais se aplica a mim, mas claro, relembro sempre a importância de que cada um encontra sua própria maneira de se comunicar através da escrita, não há apenas uma forma correta e mecanizada de escrever, quando falamos sobre redação, estamos justamente falando de ciências humanas e não de exatas.
Parágrafo introdutório: a introdução do texto assume um papel crucial na construção do texto, é a partir dele que o leitor manterá o primeiro contato com o que o texto pretende abordar e discorrer nos parágrafos futuros. Por esse motivo, a apresentação do texto deve ser bem elaborada. Para fugir de frases usuais que iniciam o texto como: “Na sociedade atual…” ou “O Brasil é…”, geralmente introduzo o texto por meio de uma comparação entre um conhecimento prévio que pode se relacionar no contexto do tema, como por exemplo, um filme, uma música, a citação de um pensador, um resgate histórico, e através de conectivos para associar aos dias atuais, como “de modo análogo” ou “de forma semelhante”, estabeleço a relação. É fundamental que o problema levantado pelo tema seja identificado pelo aluno e colocado em nítida evidência logo nesse parágrafo. É também na introdução que a tese, ou seja, a frase contendo o ponto de vista do aluno que norteará o texto esteja presente.
Parágrafo de desenvolvimento 1: Costumo destinar dois parágrafos para o desenvolvimento da proposta. Nesse primeiro, inicio o parágrafo com um elemento coesivo de adversidade como “Apesar de…” ou “Entretanto…” como uma forma de retomada do parágrafo anterior, que foi finalizado com minha tese, ou seja, com aquilo que buscarei defender e argumentar ao longo da redação. Em toda boa argumentação, não basta simplesmente transparecer seu ponto de vista sem considerar as posições adversas, pois a partir de então, pode-se inferir que o estudante expande seus horizontes e reconhece outros pontos de vista sobre um mesmo tema, o que consequentemente enriquece o texto. É no desenvolvimento do texto que um olhar mais aprofundado sobre o tema estará presente, a argumentação deve ser bem articulada e as informações trazidas devem ser acompanhadas de uma fundamentação. É importante notar que dados estatísticos e citações de autoridades sobre o tema garantem uma maior veracidade e um peso teórico exigido pelo ENEM. Contudo, eles não não terão seu efeito atingido se forem apenas utilizados de forma desvinculada do pensamento do aluno. O uso de informações exteriores não deve ser feito caso o conhecimento tenha a intenção única de preencher linhas, ressalto a importância dada às informações aplicadas que partem de forma natural do estudante. Dados precisos, datas e sobrenomes incomuns não serão o fator máximo que diferenciará seu texto entre tantos outros, mas sim a ideia exposta do aluno que constrói seu pensamento fundamentando-o.
Parágrafo de desenvolvimento 2: Ao meu ver, esse parágrafo deve acentuar ainda mais os desafios para a solução do problema apresentado e a partir de dados e conhecimentos que podem ser inseridos nessa etapa da escrita, frisar nas barreiras. O final desse parágrafo deve realçar a realidade do problema, posicionando-o na sociedade brasileira, oferecendo desse modo, a possibilidade de uma discussão ainda maior no parágrafo seguinte.
Parágrafo de conclusão: Diferentemente de muitos vestibulares e concursos que exigem uma conclusão do tema a partir de uma retomada dos principais pontos de sustentação do texto já apresentados anteriormente, o parágrafo que conclui a redação do ENEM deve conter uma proposta de intervenção detalhada, ou seja, uma resolução para o problema sobre o qual discorreu-se ao longo de todo o texto. Pelo fato da cobrança de ser detalhada, ou seja, busca-se que o aluno tenha a competência de encontrar uma solução palpável, não basta apenas afirmar o óbvio (ou seja, o que deve ser feito), quanto mais específico, melhor. Recomenda-se que a intervenção conte com no máximo duas propostas, pois para cada uma delas, é necessário responder algumas perguntas: “Quem?”, “Para quem?” “Onde?” “Por quê?” “Visando quais objetivos?” “De que maneira?”. É nessa fase que o aluno pode associar a responsabilidade do problema à ação de algum órgão público, ministérios, Governo Federal, agências, institutos etc ou a algum projeto específico de conscientização, por exemplo. Como forma de retomar brevemente o assunto do texto, usualmente inicio o parágrafo com “Diante dos obstáculos…” e posteriormente exponho as medidas que devem ser tomadas na busca pela solução.
Quanto ao título da redação: O título na redação do ENEM não é um critério obrigatório. Caso o estudante opte por utilizar um título, ele deverá centralizá-lo no início da primeira linha do texto e discorrer sobre o tema nas 29 linhas seguintes. Antes de definir se deve ou não ser escrito, é importante esclarecer que primeiramente o título não é sinônimo de tema. O tema da redação do ENEM 2019 foi: A democratização do acesso ao cinema no Brasil, utilizá-lo como título a fim de preencher uma linha demonstra uma falta de criatividade e de síntese, visto que o título deve ser uma frase que guie o leitor sobre o assunto tratado. Além disso, cada espaço da folha de redação deve ser bem aproveitado, é preferível que a redação não seja intitulada caso o título não tenha um impacto ou não leve o leitor à reflexão.
Por mais que a redação do ENEM seja uma das etapa da prova mais temidas por milhares de estudantes, a redação é a única fase em que o aluno tem a possibilidade de expressar suas ideias de forma direta, de ser escutado, apresentar seu ponto de vista e ser avaliado a partir de sua capacidade de interpretar, organizar suas ideias e se comunicar, Por esse motivo, encarar a redação como oportunidade para externar seus pensamentos e estruturar suas opiniões ao invés de vê-la como uma barreira é o primeiro passo para criar afinidade com a modalidade escrita.