Três dias que mudaram minha vida
Três dias que mudaram minha vida.
Trabalhava eu, no ano de 1961, como redator e Repórter de uma emissora de rádio na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Na época estava cursando o último ano de Técnico em Contabilidade, mas me interessava muito pelos acontecimentos mundiais. Entre estes, um me chamou a atenção em Particular, o movimento liderado pelo advogado Fidel Castro, que culminou com a tomada do governo Cubano, após as lutas travadas pelos revolucionários em Sierra Maestra, quando Fidel Derrubou o Governo de Fulgêncio Batista que havia em um golpe se declarado presidente da Ilha. O regime de Batista foi derrubado em 1959 por um ataque de forças rebeldes comandadas por Fidel Castro, Che Guevara e Raul Castro. Sendo o primeiro e o último irmãos e o argentino era um médico que lutava pelos ideais de democracia e solidificação do desejo antigo de Simão Bolívar, de unir a América do Sul (Em 1813, Bolívar invadiu a Venezuela, tomou Caracas e proclamou a segunda república venezuelana. Em 1819, fundou a grande Colômbia (atual Colômbia, Venezuela, Panamá e Equador), Bolívar foi nomeado presidente. As forças “bolivarianas” sob o comando de Antônio José de Sucre, venceu as frentes espanholas em 1822, libertando o restante do norte da América do Sul.)
Mas, deixemos a história clássica de lado, pois esta pode ser encontrada facilmente em qualquer livro do gênero. O meu desiderato é dar conhecimento dos fatos que influíram na minha formação de adulto.
Dizem que a vida nos reserva várias surpresas no decorrer da existência e modela o caráter dos indivíduos. A revolução Cubana foi um marco na história que demonstrou do verdadeiro caráter dos homens que a realizaram. Porém, dentro dessa revolução, ou melhor após a mesma, um episódio deixou suas marcas, entre eles, uma batalha sem igual na história da humanidade. Foi uma batalha de apenas três dias, onde as forças do revolucionário Fidel rechaçaram uma tentativa de invasão da ilha. Cerca de 1.400 homens invadiram os pântanos da Praia Girón, conhecida como Baía dos Porcos, no dia 17 de abril de 1961. Três dias depois, eles estavam derrotados. Ai começa a minha participação no episódio.
Aos 23 anos de idade, havia deixado o exército brasileiro, no qual havia ingressado em 1959, logo após voltar de Angola onde havia servido como voluntário na Força de Paz da ONU. Tive um treinamento especifico para lutar em campanhas contra guerrilhas, motivo pelo qual eu me julguei apto a lutar em qualquer lugar. Quando jovem, ganhei de meu pai, de presente de 15 anos um revólver calibre 44, arma essa que me disse ele, havia usado na revolução de 1923, revolução esta que foi eclodida por Assis Brasil, contra o governo de Borges de Medeiros no estado do Rio Grande do Sul.. Foi a luta entre Chimangos e Maragatos, que terminou com o tratado de Pedras Altas
Quando meu pai e deu aquela arma, perguntou se eu sabia usar. Eu respondi que sim, pois era só puxar o gatilho. Ai ele me perguntou se eu sabia como não usar. Aquela pergunta me desorientou, pois não entendi direito o que ele queria dizer. Aí, meu pai me explicou: “Olha rapaz, pois não me tratava mais de guri, uma arma pode ser uma grande amiga, como pode ser o instrumento de uma desgraça para o resto da vida. Se tu sacares no momento certo e usares com consciência, ela será tua amiga. Mas se sacares e usares sem pensar, e nem porque, poderá desgraçar tua vida como a de quem for o alvo.
Assim, quando me tornei mais adulto, me dei conta do que o “velho” quis dizer e apesar de sempre andar armado, nunca precisei usar contra quem quer que seja. Assim, como na vida civil, eu me comportei durante o tempo em que estive no exército, participando de lutas.
Na invasão da Baia dos Porcos, eu participei de muitas escaramuças contra a tropa invasora. Tinha a meu comando, uma patrulha que nos últimos momentos das refregas saímos em busca de companheiros perdidos nos pântanos, pois o local da praia de Girón era altamente pantanosa e de difícil acesso, quer do mar para a terra, como da terra para o mar. Havia ali também, muitos acidentes que foram usados pelos soldados, tanto invasores como defensores, como trincheira. Aí o motivo da incursão da patrulha por mim comandada.
Num determinado momento, tive vontade de fazer uma necessidade (urinar) e me dirigi a um acidente do terreno onde podia me ocultar, para o meu desiderato. Quando estava me aproximando, com todo o cuidado, tinha a minha Colt 45 (Pistola automática usada na época) e mais a carabina Henri de 15 tiros, e de manejo bem fácil. Ao chegar quase no local, ouvi um gemido, que me fez prevenir, pois não sabia de era um companheiro ou um inimigo. Deitei no chão para me proteger e gritei o Tradicional “Mão ao alto) primeiro em espanhol(manos arriba, de rodillas), O Indivíduo não sei se entendeu ou não, mas ajoelhou-se e levantou as mãos. Eu então olhei bem para o mesmo, e reparei que não passava de um rapazola, de seu dezoito anos ou menos, pois era imberbe e tinha espinhas no rosto vermelho indicando tranquilamente que era americano. Tínhamos ordens superiores de não fazer prisioneiros que não fossem cubanos, pois a ordem era matar outros de nacionalidades estrangeiras da ilha. Naquele momento, lembrei das palavras do meu pai, sobre quando não usar a arma. O indivíduo, me fitava espantado, e olhava para a minha carabina com uma nítida expressão de medo.
Pensei comigo mesmo. E agora, o que faço com este gringuinho. Será que se fosse ele quem me surpreendesse me pouparia ou me mataria. Olhei bem para ele, e vi diante de mim, uma mãe, uma irmã, uma namorada e vários amigos (tudo em imaginação). Então tomei uma atitude, arriscada, mas ao mesmo tempo humana. Já estava ganha a batalha, sabiá que havia centenas de mortos do lado dos invasores. Apontei a carabina e disse: Stand Up your arms. Guns in floor. (Falei no meu inglês mal aprendido no ginásio e que ele entendeu) Em conclusão eu falei “Go Home” e o soldadinho deu meia volta, deixou as armas e o cantil e saiu correndo.
Até hoje não sei quem era, como ele também não sabe quem sou eu. Mas tenho a certeza, que agi com humanidade, senso do dever cumprido com minha consciência e em favor de uma família que até hoje desconheço. Mais tarde, contei a história ao meu pai, e disse que na hora me lembrei da sua admoestação sobre saber como não usar a arma.