Rebelião da Almas
Rebelião da Almas
Fortuna crítica: Moura Lima *
O contista Francisco Miguel de Moura é um exemplo de dedicação ao mundo das letras, que se notabilizou pelo país afora, como um grande escritor e crítico literário da terra de Mafrense, ao escrever o ensaio “Linguagem e Comunicação em O.G. Rego de Carvalho” e, posteriormente, com o romance “Laços de Poder”, obra prefaciada pelo festejado romancista João Felício dos Santos, autor dos imortais romances “João Abade” e “Ganga-Zumba”.
Na sua bem elaborada arquitetura verbal, prima pela unidade, coerência e ênfase. Com efeito, dirão os amantes da boa crítica (uma espécie terminal) que o zelo sacrossanto do brilhante estilista é análogo a uma legítima faca de aço Pajeú, de gume sutil e cortante, em ação nas regiões abissais do pensamento, de onde traz à tona uma aura a Flaubert, Proust, Dostoievski e Thomas Hardy. E assim, a meu ver, o escritor Francisco Miguel projeta-se para o futuro como um clássico moderno da Literatura do século XXI.
Para dizer a verdade, a sua prosa é transparente e escorreita, de eficácia impressionante, sem maquinações nem tergiversações cavilosas dos hipócritas não confessados. Acima de tudo é um hino de libertação e, ao mesmo tempo, de denúncia contra os abusos e as injustiças sociais.
Francisco Miguel de Moura é um profundo e arguto observador da problemática do homem, do seu destino, onde viu e sentiu frente a frente com o sofrimento dos despossuídos e explorados da sociedade.
E o seu extrato social? São palavras verdadeiras?
Sim, são-nas.
Radiografou tudo; inclusive mostrando as nuanças da alma humana, como um imenso calabouço de angústia, neuroses e de conflitos existenciais. Aí está o segredo e a grandeza de sua arte, que como um verdadeiro escritor filósofo, quer como sociólogo ensaísta.
Assim impõe-se o dedicado romancista pela autenticidade do talento, talento moderno e vigoroso, como convém, expresso em quadros sociais brutais, mas sempre de um escritor engajado e nunca de um fariseu das letras. Bem como radicaliza o esforço criador realista, sem cair no vazio dos visionários.
E numa cosmovisão analítica de sua vasta produção, sentimos intrinsecamente que aponta na direção dos questionamentos introspectivos de Jorge Luis Borges, quando, do alto do seu vislumbre luminoso da eternidade afirmou convicto:
- “Nenhuma doutrina filosófica (ou religiosa) detém a palavra final do ser.”
Por conseguinte, todo o inventário de sua escrita é um misto de ensaio de romancista-contista-cronista e poeta, de quem viu e sentiu a dor das almas peregrinas na alongada travessia do sonho para a realidade brutal.
O seu novo livro de contos “Rebelião das Almas” atesta a sua maturidade de escritor bem-sucedido e senhor do seu ofício. O universo contístico da obra é voltado, como toda a sua produção literária, para os conflitos existenciais do homem e a ânsia de libertação do mundo opressivo. Este horizonte sombrio é corroborado no conto “Tetim está só, sim senhor”. Já no conto “Ele Campeava as Estrelas” mostra as sutilezas do realismo fantástico. Para aliviar a tensão do leitor, inseriu o conto “O pescador e sua mãe”, que narra as façanhas e origens do monstro fluvial piauiense Cabeça-de-Cuia. Mas, também ressuscitou para a literatura brasileira, o gênero da fábula, tão bem cultivado por Humberto de Campos e esquecida entre nós, com o conto “A Fábula do Preguiçoso”.
A obra vem enriquecida de outros contos, que revelarão aos leitores brasileiros diferentes ângulos do notável escritor piauiense, um mestre da metáfora e da sátira social contundente, que vem pontilhada de angústia dos males humanos, no murmúrio da rebelião das almas.
*Moura Lima é membro da Academia Tocantinense de Letras e autor dos romances “Serra dos Pilões” e “Chão das Carabinas” e dos livros de contos “Mucunã” e “Vered