Encontrei no Álbum de Família
As folhas secas de oliveira eram os marcadores das folhas que contam os fatos abaixo. Um dia elas seriam validadas pela curiosidade, e esse dia chegou. Ao final da leitura, o que era curiosidade, passou ser sabedoria.
Conta-se que num velho e esquecido condado, havia um deles que representava cada classe. Trabalhando como líder, por exemplo, um louco para o grupo de loucos; um filósofo sabe-tudo, um extremista religioso, um herege para professar o caos humano e colocar em dúvida a existência de Deus.
Outro fiel representante dos pássaros empurrava a vida, assoviando e chamando a passarinhada. Outro defensor dos animais. Outro e outro...
Chico Luscufusco era representante dos loucos. Com o agravamento da suposta doença, Chico foi internado.
Tomar os medicamentos, comer, dormir, beber, fazer as necessidades fisiológicas, sujar as águas; e às vezes ser amarrados à cama, e nada mais. A vida não passava dessas coisas. Tanto os dias dele, quanto dos demais, eram tediantes. Verdadeira loucura.
O sanatório iria passar por reformas e o diretor achou por bem, colocá-los para auxiliar nos trabalhos. No dia da apresentação às autoridades locais, todos eles foram à celebração uniformizados de branco, empurrando o carrinho de mão, com uma pá e uma enxada, dentro.
Chico foi o último e apareceu ao desfile com o carrinho ao contrário, emborcado. O diretor e os organizadores do evento correram ao seu encontro; dizendo que não era daquela maneira que deveria empurrar o carrinho.
Chico ouviu atentamente e em seguida, replicou: "entendo dotô, mas fizemos um ensaio e com o carrinho do jeito que o sinhô tá pedino, vão fazê como ontem, quando encherô ele de preda. Mas o dotô tá certo: tem que empurra de boca pra cima; mas o meu de boca pra cima, vai comê mais que eu, tô comeno."
Quem inventou a arte, fundamentou-a na tese, "que a arte imita a vida"; mas o artista que não apoia-se em teorias, teses e faz arte pura, prova o contrário, ou amíude, afirma que a insanidade imita a vida; e a vida, imita a arte.
Os loucos varridos não respiram a arte. No entanto, são malabaristas e trapezistas, equilibrando o corpo e a alma nas cordas bambas da arte de viver.
Para essa trupe, cada dia é uma peça teatral diferente, jamais repetida no decorrer de sua existência.
Na insana arte de viver, sobreviver e respirar não bastam, é preciso ser criativo no criar e recriar.
Ainda que vivam 150 anos, fatos que os comuns jamais saberão o significado; e se souberem, não ousam exercitar, pois comodidade e zona de conforto é enlevo protegido por leis e Estatutos governamentais, assinados pela família, os loucos são professores.
A loucura é uma romaria de fé, a qual os loucos escondem os normais debaixo de duas constelações de estrelas, denominadas desigualdade e injustiça; cujo Ministério que regulamenta, criam e assinam as leis, é o Ministério da Mesmice.
No mundo do comuns, tudo é igual. Milimetricamente, antropofagicamente, geometricamente igual. E até no atestado de óbito, a causa é igual: causa mortis, Covid-19.
É dureza para os normais e comuns, roer ossos em terra de loucos varridos. Sobretudo, a ignorância, somada à boçalidade e as doidices dos sanos, é via de mão dupla; portanto, elasticamente até romper, vai e vêm.