PERFUMES, ENJOOS, TRANSPIRAÇÕES E ESTAFA

Luciana Carrerro

A rigor não existem pessoas para serem chamadas de poetas. Ninguém é poeta o tempo todo. A poesia não é somente como um vidro de perfume francês, que se usado e abusado se torna repugnante, mas o que se faz com o perfume, de modo dosado. Uma ideia poética não sobrevive sozinha. Precisa de um contexto. O contexto é o próprio texto, alegórico ou não, metafórico ou não, podendo até ser prosaico, mas gentilmente recebendo umas gotas de poesia. Poesia pura pode ser indigesta e faz efeito contrário quando não bem utilizada. Ninguém toma banho de perfume. Toma-se banho com água. O perfume é o toque mágico, após... E, não é exercitando haicais, aldravias e outros bichos mais que vai formar-se um poeta. O indivíduo precisa ter o dom, a inspiração, a mediunidade. Ninguém ensina a ser poeta. Poesia é transcendência e liberdade. Alguém precisou ensinar poesia ao Mário Quintana? Entretanto, pode um homem experiente trazer dicas importantes, aos pretensos poetas, em forma de tutoriais, mas se o "cara" não é poeta, mesmo seguindo-as, vai ser um vate capenga. E se vai pensar que manejando palavras em configurações e figurações, encontrará poesia, estará solenemente enganado. O poeta já chega (nasce) escolhido. Não adianta alistar-se. O que se pode dizer é que somos escritores. E muitas vezes aparece uma poesia para premiar nossa produção. A pretensão de ser poeta é deplorável, uma vaidade vazia, sem explicação. A poesia é uma fada que chega e não pode ser dominada. Transpirar e fazer transpirar o poema é como malhar em academia e adquirir um formato artificial, que pode chegar a ser bizarro, se levado ao extremo. Poesia toca no coração, no sentimento e na emoção. Ninguém gosta da estiva na Arte, como um Michelangelo dependurado no teto da Capela Sistina. É deplorável, em nome da boa arte, ser um operário das letras, porque literatura é fluência, espontaneidade e não exercício estafante.