QUEM FINANCIA O S.U.S.?
Problemas na área de saúde vão além da falta de investimentos. É preciso, também, melhorar a eficiência gerencial
Nas duas últimas semanas, o que se viu nos noticiários foi a informação de que os governadores do PSB, comandados pelo presidente do partido, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, defendem a volta da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta pelo Congresso em 2007. Enquanto foi cobrada, a CPMF era a principal fonte de realocação de recursos do Governo Federal para ajudar os estados e municípios a manter os serviços oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
A polêmica sobre a recriação da CPMF - ou da instituição de mais um imposto, a exemplo da Contribuição Social para a Saúde (CSS), em tramitação no Congresso desde 2008 - divide parlamentares e desagrada empresários, entidades de classe e a população, que são contra a criação de mais um tributo. Aliás, a principal alegação é de que a 'extinta' CPMF nunca ajudou a manter o SUS, porque enquanto esteve em vigência, os recursos arrecadados (algo em torno de R$ 40 bilhões) nunca foram destinados à saúde na sua totalidade. Somente 57% do imposto eram gastos com saúde. O restante era repassado para socorrer outros setores da máquina federal.
O secretário estadual de Saúde, Frederico Amâncio, diz que o governador Eduardo Campos foi mal interpretado e não defendeu a recriação da CPMF. “O que o governador defende é a discussão de novas formas de gestão e financiamento para a área de saúde. O que se quer é reunir todos os atores envolvidos, governos federal, estaduais e municipais para discutir melhorias e saídas para o setor”.
Frederico Amâncio afirma que o problema da saúde não se restringe apenas a investimentos em hospitais, equipamentos e pessoal. “Quanto mais ofertamos serviços, mais serviços novos são demandados e a procura aumenta. Os investimentos têm crescido. Estados e municípios têm aumentado os gastos na área, multiplicando os números de atendimentos e consultas e melhorando os indicadores de mortalidade infantil e de expectativa de vida da população. Mas, por outro lado, os recursos federais não chegam na mesma proporção”, queixa-se.
Essa falta de recursos federais é refletida diretamente na precariedade do atendimento nos hospitais e principalmente nas unidades de saúde dos municípios de todo o país. Não é a toa que um contingente significativo de prefeitos é favorável à volta da CPMF, preocupados com as suas necessidades específicas, afinal de contas são os municípios que devem prestar um serviço de assistência básica de boa qualidade à população.
GESTÃO
Na verdade, o SUS não precisa da CPMF ou da ajuda de qualquer outro imposto para se manter. O que necessita é de uma nova forma de gestão. "É uma visão equivocada querer resolver o problema da saúde colocando em primeiro plano a criação de impostos. A falta de recursos tem que ser discutida num contexto mais amplo, como o ajuste de gestão e a reorientação dos gastos", defende o senador eleito Armando Monteiro Neto (PTB).
"Há sim, um subfinanciamento crônico da saúde, atualmente, e a discussão sobre a recriação da CPMF ou instituição da nova CSS tem o mérito de mostrar a urgência de se identificar fontes novas para esse problema velho", afirma o deputado estadual Clodoaldo Magalhães (PTB), que é médico e preside a Comissão de Saúde e Assistência Social da Assembléia Legislativa.
SAIBA MAIS:
Era CPMF, agora poderá ser CSS
O pontapé para a rediscussão da recriação da CPMF foi dado recentemente, mas desde 2008 tramita no Congresso um projeto de lei complementar criando a Contribuição Social para a Saúde (CSS). Aliás, o projeto chegou até a ser discutido e voltado.
A CSS nada mais é do que a CPMF com uma nova roupagem. O projeto de lei prevê que o novo imposto será permanente - diferentemente do anterior - e que os recursos arrecadados serão destinados à saúde, na sua totalidade.
A outra diferença diz respeito à alíquota. Se aprovada, a mordida no bolso do contribuinte será menor: ao invés dos 0,37% que a CPMF levava, a CSS ficará com apenas 0,1% de qualquer movimentação financeira. Os trabalhadores com renda mensal de até R$ 3,08 mil estarão isentos.
PERNAMBUCOINVESTE MAIS DE 15% EM SAÚDE
Uma das esperanças para a melhoria da assistência do SUS seria a regulamentação da Emenda Constitucional (EC) 29, que normatiza os gastos em saúde e define os montantes mínimos a serem aplicados pelas três esferas do poder. A emenda está engavetada no Congresso desde 2000.
Pela EC-29, estados e municípios têm que investir 12% e 15%, respectivamente. A União se rege por uma regra temporária, que deveria ser substituída em 2005, pelo Congresso. Mas como até hoje a emenda não foi regulamentada, o Governo Federal contribui de acordo com o aumento nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Mesmo assim não cumpre. De acordo com o secretário estadual de Saúde, Frederico Amâncio, por enquanto, a maior parte das contas da saúde vem sendo paga apenas por estados e municípios.
A falta de regulamentação da EC deixa os outros entes livres para também não aplicar os percentuais definidos. Mas essa não é a regra e, segundo Frederico Amâncio, grande parte dos municípios aplicam percentual superior ao previsto. Com relação a Pernambuco, ele diz que é um dos cinco Estados do país que mais investem em saúde. “Em 2006 o investimento era de 13,2%, no ano seguinte elevamos para 14,3%, passando para 15% em 2008 e no ano passado chegamos a 15,8%.”
De acordo com o secretário, nos três primeiros anos da administração Eduardo Campos foram investidos em saúde 74,9% a mais do que nos quatro anos anteriores (2003/2006). Até o final deste ano, esse percentual deverá chegar a 197%. Os números da Secretaria também mostram que a despesa de investimentos de 2009 registrou um incremento de mais de 173% em relação ao melhor ano do período 2003-2006. “Neste ano de 2010, o investimento na área será 259% maior que no melhor ano do período 2003/2006”, garante. A rede de saúde do Estado tem 30 hospitais próprios e 11 UPAs. Além disso conta com a logística da rede privada credenciada.
DEPUTADOQUESTIONA DEMORA NA REGULAMENTAÇÃO DA EC-29
O deputado estadual Clodoaldo Magalhães (PTB) não entende porque, passados dez anos, a Emenda 29 ainda não foi regulamentada pelo Congresso Federal. Segundo ele, a mera regulamentação, amarrando percentuais de receita a serem investidos pelos entes da Federação, não cria receitas novas, apenas redefine responsabilidades, em especial à União, que vem simplesmente reajustando, pelo percentual de crescimento anual do PIB, o que investia em saúde desde 1999. Enquanto isso, os municípios já são obrigados, desde 2000, a investir 15% e estados, 12% das suas receitas em saúde.
O parlamentar diz que para melhorar a oferta de serviços de saúde é necessário melhorar a qualidade dos gastos, incorporar gestão aos processos de administração em saúde, reduzir desperdícios e aumentar receitas sem incremento de carga tributáia sobre o setor produtivo. "A discussão sobre a recriação da CPMF surgiu apenas para mostrar a urgência de solucionar o problema crônico de financiamento do setor", explica.
OPÇÕES
Na sua opinião, novas fontes de recursos perenes precisam ser criadas e a reforma tributária deve servir para esse fim. Em paralelo, é preciso investir na melhoria da gestão e na eficiência dos gastos. Entre as opções o deputado apresenta a taxação do capital financeiro especulativo, que vem aproveitar as altas taxas de juros do mercado brasileiro; a redução dos estímulos tributários ao consumo e a destinação de parte dos recursos de royalties do pré-sal à saúde.
Ele defende também a desoneração do investimento em saneamento, em medicamentos e em todas as áreas de prevenção em saúde; a redução da tributação sobre a folha de salários, que aliviaria o compromentimento da Receita Corrente Líquida (RCL) dos municípios, estados e da rede privada complementar ao SUS com pessoal. O investimento em prevenção também atenua, a longo prazo, a hipertrofia do modelo curativo e os gastos crescentes com saúde.