ANO VELHO, ANO NOVO

“Trovas de Fim de Ano”

Quero estas trovas cantar

Frente a frente com o espelho

P´ la saída do ano velho

Que ´stá prestes a acabar.

Durou tanto o velho ano

Por nunca encontrar renovo,

Vinho velho, vinho novo

Corra hoje no mesmo cano.

Nem tudo foi de primor,

Doze meses ao desafio,

A água que corre no rio

Foi indo de mal a pior.

Já não abundam esperanças

Pois qu´ anda tudo às avessas

O que é novo não tem pressas

Seja em adultos ou crianças.

Não se vê rosto a sorrir

Nem há bocas pra cantar

Vê-se gente a andarilhar

De mão estendida a carpir.

Os ricos, sempre mais ricos

Com dinheiro pra derreter

A justiça, não dá para ver,

E as leis disfarçam fanicos.

Os pobres, sempre mais pobres

E a cada hora muitos mais,

Não há governos nem arrais

Pois não há princípios nobres.

Os pais confundem os filhos

Pelo exemplo que lhes dão,

Os filhos estão como estão

E não passam d´ empecilhos.

Escola não tem remédio já,

Sem bom professor nem mestre

Não há ensino que preste

Nem esperanças no amanhã.

S´ há emprego é com´ aspirina,

E os patrões já são de sobra,

Não há investimentos nem obra

Mas há negócios da China.

A terra ninguém a trabalha

Quem o faz já é sortilégio,

Ter dinheiro é um privilégio

Quanto a sorte, Deus-nos-valha.

O senhor prior é o que se vê

De mão estendida pra esmola

Enquanto o povo s´ esfola

Ele, em casa, consome a TV.

Já pouco percebe de missa

E já esqueceu o breviário,

Como padre anda ao contrário:

Pouco trabalho, muita preguiça.

Dá-se bem co´ o regedor

E tem-no em suas palminhas

O povo que vá prás alminhas

E dê graças ao Senhor.

A Fé não há quem a tenha,

Dentro da igreja ou capela,

Ninguém tem urgência dela

Nem há mal que daí venha.

A aldeia é um ar que lhe deu

Co´ os fiscais sempre na ordem

Mas, porém, pouco já podem

E, se o podem, “dá cá o meu”.

Há projectos pantomineiros

No hipermercado ou na feira,

Há pedintes sem eira nem beira

E oportunos arruaceiros.

Nunca há culpa nas desgraças

E quase não há segurança

Ninguém entende tal dança

E as razões destas devassas.

Há pulhices nos tribunais,

Ministros brincam co´ a tropa,

Sem-abrigos comem da sopa

Que faz inveja aos pardais.

Há lições no Parlamento

Com sessões mirabolantes,

Não há moral como dantes

E o Poder é um cata-vento.

Em Belém mora o afecto,

Moram selfies e sorrisos,

Entre infernos e paraísos

Vai gozando quem é esperto.

O Zé odeia qu´ o tomem

Co´ ilusões e fantasias,

Mas usa as tecnologias

Para provar que é homem.

Ninguém pode cair doente

Toda a gente finge saúde,

Há mais farra do que virtude

E o futuro ninguém o sente.

Ano velho ou Ano Novo

Aconteça o qu´ acontecer

A Sorte é o que Deus quiser

O resto sobra para o Povo.

Diz o povo e tem razão

"Ano Novo, vida nova",

Mas é urgente pôr à prova

A força do coração.

Estas Trovas são o que são,

Com teatro e com ironia,

Vestem a roupa da Poesia

No que é real ou ficção!

Frassino Machado

In TROVAS DO QUOTIDIANO

FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 30/12/2021
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