Um trovador de truz: Colbert Rangel Coelho, Pitangui, MG
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O genial Colbert (texto extraído do "Trovamar-novembro/2005)
Corrigindo um velho erro,
aos brotos tecendo loas,
nem mesmo no meu enterro
quero saber de coroas...
– Era assim o Colbert, um genial brincalhão. Mineiro de Pitangui, Colbert Rangel Coelho nasceu em 1925, filho do igualmente brilhante poeta João Rangel Coelho. Mudou-se ainda muito jovem para o Rio de Janeiro, ali fazendo carreira como publicitário. Foi um dos pioneiros do moderno trovismo e chegou ao ponto de não ter mais onde guardar tantos troféus, graças ao seu extraordinário talento. Ficou famoso especialmente por suas trovas de humor, porém deixou também muitas outras, líricas e filosóficas, como esta:
1. Entre o homem e a natureza,
há contrastes sem medida:
o pôr-do-sol – que beleza!
Que tristeza o pôr-da-vida...
E outras que poderão verificar, abaixo
.......................................................................................
COMPLEMENTANDO = Colbert nasceu a 12 de maio de 1925. Sua mãe se chamava Antonia de Menezes Rangel Coelho. Entre outros, deixou os livros de trovas: "Cantigas da Madrugada" e "Enquanto a Cigarra Canta". Neste último, irreverente por tradição, Colbert abre o livro com o seguinte:
À GUISA DE PREFÁCIO
Não quis prefácio no livro
que, leitor, coloco à venda,
pois sempre fujo e me livro
de elogios de encomenda.
Faleceu muito jovem, no dia 29 de outubro de 1975, aos cinquenta anos de idade, no Rio de Janeiro.
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LÍRICAS E FILOSÓFICAS
01
Eu sigo na minha rota (3º lugar Friburgo 1960)
vencido, cheio de dor.
Causaram minha derrota
minhas vitórias de amor.
02
A todo mundo insinuas
que não mando no que é teu, (4º lugar Friburgo 1961)
mas tenho saudades tuas
e o dono delas sou eu!
03
A vida, às vezes, resume
contrastes deste teor:
só se morre de ciúme (7º lugar Nova Friburgo 1962)
quando se vive de amor.
(com as três trovas acima Colbert tornou “Magnífico Trovador em 1962)
04
"Perca a esperança", - disseste. (13º lugar em Pouso Alegre - 1961)
Cegamente, obedeci.
E tu mesma me trouxeste
a esperança que perdi.
05
Berra a esposa, o filho berra! (Venc. Cruzeiro/SP 1962)
E, apesar desse berreiro,
não troco meu lar em guerra
pela paz do mundo inteiro!
06-A
Passei a crer nos amigos (Menção Honrosa em São Fidélis/RJ - 1963)
e em bondade ainda creio,
depois que vi dois mendigos
repartindo um pão ao meio.
06-B
Nas vitrinas de brinquedos (Menção Honrosa em São Fidélis/RJ - 1963)
o meu pranto tem lavado
as marcas de cinco dedos
de um menino abandonado.
07
Se a criança, em seu fadário,
fosse educada direito,
não seria necessário
castigar-se um homem feito.
08
Velho, nas minhas andanças,
já calejado de insultos,
tenho pena das crianças
num mundo cheio de adultos.
09
Enquanto a gente recorda (5º lugar Juiz de Fora 1962)
os males que a guerra traz,
fraldas branquinhas, na corda,
lembram bandeiras de paz.
10
Naquele morro do Estácio,
com você na mesma esteira,
tinha a graça de um palácio
meu barraco de madeira.
11
Eu não sei se o sol desponta (3º lugar C. Itapemirim 1967)
ou se ainda é madrugada...
Quando estou por tua conta
não dou conta de mais nada.
12
Quando a gente perde o tino,
como perdi de repente,
uma mulher sem destino (7º lugar C. Itapemirim 1967)
faz o destino da gente.
13
Tenho tudo aqui na terra, (1º lugar Pinda 1967)
e tenho, apenas, o que?
- uma casinha na serra,
minha viola e você!
14
Dorme a serra... Em tom de prece,
vendo que a serra dormiu, (2º lugar Pinda 1967)
o "Dedo de Deus" parece
que está fazendo "psiu".
15
Por minha vida sem graça
passaste tão de repente...
Muitas vezes a que passa
é que fica eternamente!
16
Anchieta, pelo que diz (1º lugar Vitória / ES 1980 - "Anchieta")
seu evangelho de luz,
foi o FRANCISCO DE ASSIS
das terras de Santa Cruz.
17
O mais doce dos abrigos,
minha casa é uma beleza:
aberta para os amigos,
fechada para a tristeza!
18
Sonho – punhado de areia
que a gente aperta na mão,
sem perceber a mão cheia
vazando de grão em grão.
19
Meu filho, ingênua criança,
para aumentar meu castigo,
quanto mais o tempo avança,
mais se parece comigo.
20
Aquela criatura louca,
que é razão do meu desejo,
vive tanto em minha boca,
mas nunca me deu um beijo.
21
Tão grande é minha saudade,
que voltarias, não minto,
se sentisses a metade
desta saudade que sinto.
22
Se pudesse calcular
o transtorno que me deu,
Deus que fez o teu olhar
não teria feito o meu.
23
Sinto a maior das revoltas,
talvez você não presuma,
ao ver o mundo dar voltas
e nós não darmos nenhuma.
24
Perante Deus se agiganta
e torna o mundo mais lindo
quem cresce imitando a planta
que cresce sempre florindo.
25
Eu bendigo a luz da lua
e os passarinhos nos ramos:
brilha mais em nossa rua...
cantam mais quando passamos...
26
Vingativo, por maldade,
rogo-te pragas, meu bem:
que sintas esta saudade
multiplicada por cem.
27
Minha mãe! sem presunção,
conhecendo as almas boas,
já não te peço perdão,
porque sei que me perdoas.
28
Fugindo de ti, curvado
ao meu orgulho incontido,
é sem me dar por achado
que vivo sempre perdido.
29
Éramos dois indecisos
que vagávamos sem pressa...
Um sorriso... dois sorrisos...
E uma história que começa!...
30
Passaste, triste, querida,
e uma proposta eu te fiz...
Primeira vez que na vida
a tristeza não me quis.
Eu sinto, vagando à toa,
nos derradeiros degraus,
que a vida seria boa,
se os homens não fossem maus.
3
Chegaste toda elegante,
quando eu pensava ir-me embora.
“Vou ficar mais um instante.”
... E fiquei até agora.
32
Se meu ciúme resume
a tortura dos teus ais,
tua falta de ciúme
me tortura muito mais.
33
Escondo-o com tal recato
num livrinho de novenas...
Pelo menos num retrato,
teu sorriso é meu apenas.
34
O amor seria mais brando
e o mundo seria lindo,
se Deus me visse chorando,
se Deus te visse sorrindo.
35
Invejar, ó passarinho,
vosso ninho já não posso.
Quem ama e tem um filhinho
tem um ninho igual ao vosso.
36
Senti ciúmes, ouvindo
um jovem falar de alguém...
Corpo assim, rosto tão lindo,
- só podem ser do meu bem.
37
O ciúme que reveste
a nossa história infeliz
viu coisas que não fizeste...
viu coisas que nunca fiz...
38
Quem não me perde de vista,
no seu ciúme sem fim,
me atribui tanta conquista
que sinto inveja de mim.
39
Quando o ciúme deu fim
do nosso amor, duvidei.
Não supunha que cupim
desse em madeira de lei.
40
Esse vestido de linho,
que te dei, após um giro,
se foi dado com carinho,
com mais carinho eu o tiro.
41
Viva a mulher convencida,
que se gaba, volta e meia!
Falando da própria vida,
não fala da vida alheia.
42
Moldada em versos risonhos,
a minha trova mais bela
é um sapatinho de sonhos
nos teus pés de Cinderela.
43
Mudo tanto, meu amigo,
à medida que envelheço,
que num encontro comigo
nem eu mesmo me conheço.
44
Há, desde os tempos antigos,
nos mais antigos desvãos,
irmãos que não são amigos
e amigos que são irmãos.
45
Se de fato não me amaste,
de tudo o que me fizeste,
o beijo que me negaste
foi o melhor que me deste.
46
Por mais longe que passares,
há de ver o mundo inteiro,
que o mais falso dos olhares
é o teu olhar verdadeiro.
47
Dando-me tanto trabalho,
sem me poupar um segundo,
o meu filho, esse pirralho,
é o melhor patrão do mundo.
48
Senta-te aqui ao meu lado,
ó anjo do meu desejo!
Santifica o meu pecado
com a pureza do teu beijo.
49
Meu coração, por despeito,
depois que te conheci,
vai batendo no meu peito,
enquanto apanha de ti.
50
Enquanto o sino da igreja
dobra, tristonho, a finados,
a liberdade rasteja
por entre arames farpados.
51
Se ela mostra tal candura
e nem olha para mim,
buraco de fechadura,
por que me tentas assim?
52
Nas vitrinas de brinquedos,
o meu pranto tem lavado
as marcas de cinco dedos
de um menino abandonado.
53
Percebo, na trajetória
de um romance inconsequente,
que, às vezes, a mesma história
tem o enredo diferente.
54
O cego sente desgosto
de não ver o que Deus pinta,
porque nunca viu o rosto
de uma criança faminta.
55
Em meio a tanta desdita,
tanta gente estende as mãos,
que a gente nem acredita
que somos todos irmãos.
56
Se esta existência me cansa
é porque, na minha dor,
não me sobra em esperança
o que te falta em amor.
57
Vivendo nos estribilhos
das colunas sociais,
muitos pais dão a seus filhos
noção de filhos sem pais.
58
Vejo, após anos passados
de uma história que morreu,
que, entre sorrisos trocados,
acabei perdendo o meu.
59
A gente diz: “Meu filhinho”.
Depois: “Meu filho”. E, por mais
que a expressão mude, o carinho
não muda na voz dos pais.
60
Eu não teria, talvez,
tanto ciúme, meu bem,
se os olhos com que me vês
não fossem vistos também.
61
Para enciumar-te, passei
com outra perto de ti.
Não ligaste. E só eu sei
o ciúme que senti.
62
Põe nos olhos uma venda,
se algo queres me ocultar,
porque embora não te entenda,
sempre entendo o teu olhar.
63
Bendigo minhas conquistas,
quando percebo depois
a inveja dos moralistas,
que falam mal de nós dois.
64
Eu sinto, vagando à toa
nos derradeiros degraus,
que a vida seria boa,
se os homens não fossem maus!
HUMORÍSTICAS
01
Prisioneiro, na verdade,
de suas curvas revoltas,
não posso ter liberdade
com você vivendo às soltas.
02
Bebe-se tanto, meu chapa, (1º lugar Juiz de Fora 1964)
aguardente no Brasil,
que até mesmo o nosso mapa
tem a forma de um funil.
03
Essas pílulas medonhas,
que "madame" acha um sossego, (2º lugar em Nova Friburgo - 1972)
deixaram muitas cegonhas
procurando novo emprego...
04
Com aquele rebolado
que é tão fora do comum,
a mulher do delegado
também prende qualquer um...
05
Desce o viúvo ao jazigo
e uma voz familiar
repete o sermão antigo:
- Isto é hora de chegar?
06
Beijei-te e, ardendo em desejos,
disseste (que hipocrisia!)
que era o teu primeiro beijo.
Só se foi naquele dia...
07
Se, ao confessar-se, a Teresa
disse tintim por tintim,
o vigário, com certeza,
sentiu inveja de mim.
08
"Enxuta!" -- Que maravilha...
"Enxuta" como ela só!
- Quando amamentava a filha
só saía leite em pó!
09
Quando te vejo passar,
vou pensando, sem querer,
que não posso nem provar
o que a terra vai comer...
10
Eu quis, na cara ou coroa,
saber se és minha ou do Zé.
Fiquei na mesma. Esta é boa!
- O níquel caiu em pé!
11
Noivado, no mundo inteiro,
foi sempre assim entre os dois: (1º lugar C. Itapemirim 1967)
o noivo espera primeiro;
a noiva espera depois...
12
Eu, sentado na beirada,
ela, junto da janela.
- Graças às curvas da estrada,
vou sentindo as curvas dela!
13
Neste Salão elegante,
para ficar diferente,
mesmo a mulher inconstante
manda fazer... permanente...
14
Corrigindo um velho erro,
aos brotos tecendo loas,
nem mesmo no meu enterro
quero saber de “coroas”.
15
D. Juan que, volta e meia,
mulher casada procura,
tem um pé na casa alheia
e outro pé na sepultura.
16
A mulher quando se arruma,
quanta roupa! Já notou?
E foi sem roupa nenhuma
que Teresa se arrumou.
17
Tenho dó do linguarudo
que, por gosto ou por maldade,
de nós dois já disse tudo
- e não sabe da metade.
18
Por diabruras e um rebento,
naquele eterno noivado,
a festa do casamento
foi depois do batizado.
19
Surpreendido de mansinho,
sem a fibra dos heróis,
naqueles lençóis de linho
eu me vi em maus lençóis.
20
O confessor da capela
foi confessar-se depois...
Os pecados que ouviu dela
eram todos deles dois.
21
Neste mundo de badernas,
para viver sossegado,
vou segurar tuas pernas
até contra mau olhado.
22
Nos teus seios posso ver
um contorno tão perfeito
que até me orgulho de ser
o teu amigo do peito.
23
Hoje a mocinha moderna,
que tem coisas na cabeça,
não quer vacina na perna,
com medo de que apareça.
24
Com tanto gringo passeias
e, de fato, nem supões
que a liga das tuas meias
virou Liga das Nações!
25
Doutor - peço que me ajude
nesta dúvida inclemente:
Se isto é Casa de Saúde,
como pode ter doente?!...