RETROVA A HISTÓRIA, SAMPA!

...em sincera homenagem dos olhos.

Há tempos na minha cidade

Meu verso era Ópera em versão

Do nunca se sentir saudade…

Do bom, do melhor desse chão.

Assim, eu era trova perene

Dum tempo de boa construção

Saudade a gente só sente…

Do que nós perdemos, então.

Trovei desde a periferia

Qual o punk poetado por Gil!

Depois pelo centro… e a poesia

Contrastes! A fazer versos mil!

Ali eu fazia só trovas

Da felicidade ambulante

Dos que sob o céu eram a prova

Dum digno alvorecer de Horizonte.

Há ilhas de grande progresso!

De arquitetura gigante...

Mas trovo o também retrocesso,

Da dor que se espalha ao longe...

Trovei toda a História ensinada

Do Pateo à migração dos Sertões

E tudo que ali eu trovava

Não era fruto de aflições.

Cantei a Vinte Cinco de Março

Ainda não havia arrastões…

Versei o belo do compasso

De todas as cosmos- multidões!

Trovei a multi -diversidade!

Do samba e de toda raiz…

Dancei a “street -dance” dos tempos

Na dança do querer ser feliz.

Cedi um versinho de trova

Até à nossa “fashion week”!

Sequer eu pensei por a prova

O nosso futuro em deslize.

Cantei o Ibirapuera

O parque mais lindo que existe!

Cerejeiras…a espocar em Itaquera

A beleza que imigrou com requinte!

Do Municipal ao pergolado

Das flores de todos verões

Do chá do viaduto encantado

Mirei todos os corações!

Desfilei pelas rimas mais nobres

Pela pista do nosso Anhembi!

Na ala dos ricos e dos pobres

Sambei versos que eu senti.

Trovei pelas comunidades

As dores saneei uma a uma!

Confesso...socorri insanidades:

Doenças muito moribundas!

Do centro trovei até o Bixiga

Desfrutei de toda a Liberdade...

Do Ipiranga eu fiz doces rimas

Nos gritos de toda saudade.

Provei a vasta gastronomia

Sabores de toda a cidade…

Teatro de todas as lidas

No palco tristes realidades!

A semântica que verseja o vale

Do riacho: “Anhangabaú”

Já prenunciava a vertente…

De lágrimas, de Norte a Sul.

Mercadão das excentricidades...

Arredores nos fazem chorar!

A exalar toda a "putricidade"

Das feridas que não se sabe curar.

Da tal acessibilidade?

Do direito de se "ir e vir?

Velhas pontes são calamidade!

São muitas prestes a cair.

O lixo sobe qual montanhas

Rejeitos do que se desfez

Realça o desprezo que ganha

Um verso ao que nunca se fez.

As inundações desse solo

Encharca as almas das gentes!

Correntes do vão desconsolo

Dum tempo de perdidas vertentes.

Parafraseei o Caetano

Que na mesma esquina sentiu…

Seu coração já em prantos

Com toda poesia que viu.

Não havia um verso premente

Que pudesse minha dor antever

O que eu trovaria no tempo

Dum todo prestes a morrer.

Toda violência macabra

No palco por detrás das cortinas...

É como doença que mata

Sem nunca ter sido assistida.

Dos belos casarões históricos

De arte tão abandonada!

Da invasão ao patrimônio

Da propriedade aviltada.

Como eu poderia trovar

Cenário em franca explosão…

Do tudo que só definhou

Num tempo de corrupção?

Da criança malabarista

Que perdeu seu futuro no chão

Nas esquinas de todas as lidas

Nos semáforos da solidão.

Das gentes ao meio fio

De toda fome a esmolar

Dos becos dos vis arrepios

Da vida indo...sem se salvar.

Estação " da luz" é metáfora,

Sempre pronta a reacender,

Todo breu que aos olhos escapa,

Desse tempo que os trilhos perdeu.

Como eu poderia chorar

Por minha cidade autóctone,

Se aqui era só se sonhar

E ter a felicidade em torque?

Museus que contam a História

São chamas paradoxais...

Da língua são fagulhas que clamam

A obra dos não imortais.

No quase fechar das cortinas

Da ópera que hoje retrovo

Eu deixo aqui forte rima

De amor à querida São Paulo.

Se a nossa História eu pudesse

Redesenhar com primor…

Decerto eu faria uma prece

E à Sé rogaria ao Senhor…

Que a cada dobrada dos sinos

Dos templos dessa megalópole...

Soasse meu pedido conciso:

O milagre duma boa sorte.

Que ao todo cenário inconteste

Do abandono em questão,

Doasse-nos só bençãos em teste

À nossa regeneração…

Da consciência perdida

Em meio à nossa degradação

Na praça que hoje drogadicta

Verseja o todo em compaixão.

Que a cada buraco mais fundo

Houvesse um verde a brotar

Arrependimento profundo

Por tudo só a se concretar.

Na ópera que trovei a São Paulo

Há tempos, desde que eu nasci

Refaço todo meu verso cansado…

De ter tanto mais a pedir.

Eu fecho meus olhos e consagro

Um verso de plena oração:

Eu trovo, mas não no descompasso

Da minha,da nossa Sampa em questão.

Que aos povos haja a consciência

Que o Pateo pede por redenção:

A refutar a negligência

Histórica, a que abateu nosso chão.

Que seja a cidade de todos!

Do mundo também em convulsão…

Que haja em cada verso o preposto

Dum novo chão Cidadão.