AS VOZES DA CAPITAL

“Na semana de todos os festivais”

Ouvem-se as vozes de Lisboa,

Ouvem-se os fados e os cantos,

Toda a alma da cidade entoa

Trovas de Maio e seus encantos.

Em cada bairro canta o povo,

Cantam vozes duma cigarra,

Cada tema sai sempre novo

Na voz de viola ou de guitarra.

Canta a moça namoradeira

Canta pela rua o cauteleiro

Canta na praça a vendedeira

E o marialva o dia inteiro.

Canta a gaivota à beira-tejo

E o cacilheiro, além no rio,

Cantam deputados em cortejo

Suas charadas ao desvario.

Cantam sem-abrigos indigentes

Cantam polícias generosos

Cantam banqueiros prepotentes

E arrumadores presunçosos.

Canta o trânsito de sul a norte

Cantam os fadistas toda a noite

Cantam turistas à boa sorte

E os hoteleiros sem pernoite.

Cantam elevadores d´alto a baixo,

Subindo ou descendo a ladeira,

Cantam os metros por debaixo

E os eléctricos na chiadeira.

Cantam os camones pelo Chiado

Cantam curiosos pela Avenida

Canta o Marquês afunilado

E os pobres fazendo p´ la vida.

Canta a bola sobre o relvado

E as torcidas pela bancada

Canta o agiota empertigado

Nos negócios do tudo ou nada.

Cantam feirantes embalados

Cantam agentes comerciais,

Cantam os “média” enfatuados

Com promessas de festivais.

Cantam vocalistas ciumentos

Com baladas de banda em banda

Cantam fregueses d´ instrumentos

E publicistas em sarabanda.

Ouvem-se modas de rua em rua

E cantilenas bem estranhas,

Cada aedo, co´ a voz, insinua

Outro canto desafinado.

Canta o vento de voz primeira

Rodopiando no Cristo Rei

Canta a brisa madrugadeira

Nos veleiros da lusa Grei.

Cantam pardais por todo o lado

Em sinfonias de tempo ameno

Cantam os arautos de mau fado

Nas touradas do Campo Pequeno.

Cantam na Sé os sinos e o órgão

E os maestros com seus coristas

Cantam flores de mão em mão

Na voz ingénua das floristas.

Cantam viaturas e comboios

Lá para as bandas do Oriente

Cantam forasteiros e apoios

Co´ a candonga pra toda a gente.

Cantam nomes de concorrentes

Com apostas aliciantes

Cantam as letras recorrentes

Com polémicas discordantes.

Toda a Europa é grande, por certo,

Mas encaixa bem em Lisboa

Muitos cantos, um só concerto

E um só canto, cara ou coroa.

Ouvem-se na Baixa os festivais

Em anúncios de Eurovisão

Todos marcham com seus arrais

Cantando a Festa da Emoção.

E nestas vozes da Capital

Com o seu timbrado profundo

Cantam as vozes de Portugal

Desde Lisboa para o Mundo!

Frassino Machado

In TROVAS DO QUOTIDIANO

FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 07/05/2018
Reeditado em 07/05/2018
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