AO LEVANTAR DA TENDA
«Encerramento do Fórum Mundial 2018»
Passa a brisa bem ligeira
Nas asas do inverno agreste
Não traz notícia que preste
E esconde-me o sol da eira.
Pergunto à ribeira indolente
Que no prado vai passando
Se viu alguém esperando
P´ la sorte de toda a gente.
Há sortes e sortes, quem sabe,
Umas são de boa casta,
Outras são d´ alma madrasta
Às quais o destino se abre.
Umas e outras se movem,
Que o digam os ricos vezeiros,
Querem ser, eles, os primeiros
Pois qu´ à pobreza consomem.
Os pobres, esses coitados,
No mundo são maioria,
Seus sonhos de fantasia
Esperam-nos desamparados.
Esta brisa é brisa gelada
Das serranias helvéticas,
Aí, as palavras heréticas
Mal chegam à madrugada.
Por isso, ó brisa que passas,
Por este outeiro sem água
Tu sabes bem quanta mágoa
Leva este rio que enlaças.
Palavras, palavras ocas
Daquelas tribunas vazias,
De Vagos vão fugidias
Deixando a seca nas bocas.
Prós “média” sobram sorrisos
E inócuos apertos de mão,
Leva a brisa esta ilusão
Com promessa de paraísos.
Passa o Fórum e as alcateias
Ameaçam dias sem graça
Há sempre uma brisa que passa
Pelas trovas de mãos alheias.
Os problemas são abissais,
Serpeando em falso terreno,
Por entre a paz e o veneno
Há telhas de vidro fatais.
Todos querem sinos tocar
Nas catedrais ou capelas,
Fecham os olhos às mazelas
E não param de badalar.
O pão é escasso no mundo?
A água está a regredir?
As doenças são de fugir?
A segurança está no fundo?
Ele há dinheiro nos bancos,
E há muitas armas pra guerra,
A Vipe sorte está na berra
Com maiorais saltimbancos.
Ele há lágrimas de fome,
Há mentes que vivem de tédio,
Os grandes têm sempre remédio
Os pequenos não há quem os dome.
Há sortes que dão pra cantar,
Outras só dão pra amargura,
Algumas, sol de pouca dura,
Mas todas fazem chorar.
Se a água dos rios é turva
Turvos os que neles navegam,
As brisas qu´ há, já não chegam
Para limpar curva a curva.
Ribeiras, rios, oceanos,
Não vos deixeis iludir,
Fazei a cada hora sumir
Os presumíveis tiranos.
Ergue-se a Terra em vanglória,
Quem tem poder mais o quer,
Todo o homem, toda a mulher,
Não dorme sem fazer história.
- Paraísos do vil metal,
Que sobreviveis mascarados,
Diluviai os desgraçados
Porque é justo e é natural…
O mal anda de rua em rua
Os grandes propõem-no acabar,
Juntam-se pra conversar
Mas a miséria continua.
Co´ este “levantar da tenda”,
Haja ou não haja mais festa,
Fica a verdade que resta
Do mundo que não tem emenda.
Os direitos não são de todos,
Mesmo que o poder o afirme,
Haja fé que o determine
Para poucos há-os a rodos.
Tu, ó mundo da abastança,
Que sonhas maior qualidade,
Nas asas da liberdade
Traz-me uma nova esperança!
Frassino Machado
In TROVAS DO QUOTIDIANO