A DONZELA DA PENHA
«Trovas da santa Pastora»
Minha pastorinha prendada
De olhos azuis cintilantes
Cabeça rebelde e dourada
E de talentos brilhantes.
Nos ares da Penha apurados,
Numa choupana arranjada,
À luz de sóbrios cuidados
Guardavas rebanho prendado.
De túnica parda vestida,
Capa comprida castanha,
P´ lo fiel cãozinho seguida
Corrias toda a montanha.
Teu canto ao longe se ouvia,
Baladas de tradição,
Todo o viandante sentia
Essa estranha profissão.
O teu gosto p´ la natureza
Nascido desde pequena
Juntava à tua beleza
Alma singela e serena.
Vimaranes, vila-cidade
Pela planície estendida,
Era para ti de verdade
Uma paixão acrescida.
As tuas cabras e ovelhas
Como se fossem família,
Umas novas, outras velhas,
Nunca te davam quezília.
Chamavas-te Catarina
Todo o povo te conhecia,
E a tua fama cristalina
De ano para ano crescia.
Um certo dia ocorreu
Notícia, que não foi engano,
Bárbaro bando apareceu
Tendo, por chefe, um tirano.
Queriam pilhar a cidade
Daquilo que o povo tivesse
Ficou o medo e a maldade
E o muito mais que viesse.
Na negra noite brilhavam
Misteriosas luzernas
Que a larga vila cercavam
Disfarçadas de lanternas.
Tu, ó donzela, que eras
Uma previdente vigia
Não te ficaste de esperas
E preparaste a magia:
Nos chifres de todo o teu vivo
Prendeste milhares de velas
E num silêncio passivo
Desceste a montanha com elas.
Aquela faminta cambada
Pensando que era o maligno
Deu logo em debandada
Perante um gesto tão digno.
O teu estratagema valeu
Na honra do povo da vila
E toda a gente agradeceu
Ficando na paz tranquila.
O teu prestígio floriu
E no sítio da velha choupana
O bom povo ermida erigiu
Numa partilha soberana.
Foi tão bela a homenagem
Que dela nasceu no horizonte
A lição da aprendizagem
Da heróica Maria da Fonte.
Ficou de ti na lembrança
A história dum fado sublime
Pois és Protectora e fiança
Que na bela Urbe se exprime.
Foste pastora, hoje és Senhora,
E és também Virgem Maria
Todos Te cantam hora a hora
E Te exaltam em Romaria.
Não há no mundo cidade
Que tal honra assim não tenha
Qualquer que seja a idade
Todos vão à Senhora da Penha.
E esta Montanha sagrada
Será, em tua memória,
Santa Catarina chamada
Com festa, proveito e glória.
São estas as minhas Trovas,
É esta a notícia de espanto,
Em tradições velhas ou novas
Há sempre uma lenda de encanto!
Frassino Machado
In CANÇÃO DA TERRA E DO MEU PAÍS