UM "RUSSO" ACADÉMICO
«Trovas do Tónio Russo»
Chegavam os vindimadores,
Prontos pra toda a canseira,
Da vindima dos arredores
Na opulenta Casa da Beira.
Eu era pequeno demais
Pra aquela jorna habitual
Gostava de ir aos pardais
Que andavam pelo quintal.
Mas tinha a minha lição
E os deveres para fazer
E o Russo, naquela ocasião,
Era bem duro de roer.
Na herdade do primo Juca
Tónio Russo pernoitava,
Co´ ele puxava-se p´ la nuca
Enquanto a bola esperava.
As contas ficavam pró fim,
Ou até mesmo para depois,
Mas as Ciências e o Latim
Era berbicacho prós dois.
E, quanto à Geografia
Ou à História, minha paixão,
Ia-se até ao meio-dia
Depois, só a bola e o pião.
Eu, guarda-redes endémico,
O Russo, vedeta com carta,
Fazendo-se de académico
Marcava golos à farta.
A vingança era ao pião
E, por vezes, ao berlinde
Havia meças de mão a mão
E duas cavacas de brinde.
Sobrar tempo era raro
E a fisga saía do bolso
Ia-se aos tordos, pois claro,
Fazer contas era o caroço.
- Ai o Russo, ai o Russo,
Não me sai cá da memória,
Adestrou-me para um Curso
Que fosse à base de História.
Contou-me o Russo, com brio
Por ter ruiva cabeleira:
Era para ele um atavio
De raça sueva matreira.
- Estavam cá os Lusitanos,
Mais os Celtas e os Gregos
E depois, mais qu´ os Alanos,
Ficaram a mandar os Suevos.
Não quis saber de mais nada,
Memória já me não falha,
E pra rematar a jornada
Ainda jogámos à malha.
Depois da bucha e da sesta
Fomos espreitar a vindima:
- Torna, torna, vai mais esta,
Quem ma chega cá acima?
- Nas Odes de Horácio Flaco,
Por entre vindimas a rodos –
Diz Tónio, puxando p´ lo caco –
- Já se colhia destes modos.
Por falar em horas mortas
Lembrei do Russo a piada
“Bacante, uvas Ataenas portas,
Lá diz Virgílio na Eneida.”
Bela que foi esta idade,
De uma vivência distinta,
Se fosse contar a verdade
Iria correr muita tinta!
Frassino Machado
In CANÇÃO DA TERRA E DO MEU PAÍS