LISBOA - PORTO

«Trovas do Intercidades»

Saído da nobre capital

O meu trem Intercidades

Com horário pontual

Serve a todas as idades.

Tarde quente, hora de sesta,

Gente humilde e senhorial

Não há viagem como esta

Dentro do que é habitual.

Carruagem vinte e quatro,

No lugar de trinta e cinco,

Ambiente de bom trato

Arejado como um brinco.

Cantei um adeus a Lisboa

Pela estação do Oriente

Mas outra voz me entoa

Aquele aviso corrente:

“Srs. passageiros, boa viagem,

Tomem lugar de marcação

E quanto à vossa bagagem

Não lhe percam a visão.”

Temperatura agradável,

Uma dezena de estações

Com horizonte admirável

E requintadas sensações.

O trem vai a abarrotar,

Esgotada a lotação,

O que importa é viajar

Sem olhar à condição.

Há turistas e mais turistas,

Vão do sul até ao norte,

A alegrar as suas vistas

Com belo gosto e recorte.

Céu azul, horizonte claro,

Nuvens baixas transparentes,

Olhar singular e raro

Estendido a várias frentes.

“Srs. passageiros, há café

Na carruagem de serventia,

Lugares vagos, mas de pé

Como manda a cortesia.”

Está à vista Santarém,

Falta muito por ventura.

“Confiram se vai tudo bem

E se a bagagem está segura.”

Entraram mais passageiros,

Carruagem superlotada,

Com malas e sacos cheios

Já não cabe lá mais nada.

Neste Junho tão vaidoso

Com uns dias de poisio

Cada veraneante gostoso

Tem um ar de desafio.

Ainda não é Sto. António

Mas é o Dia da Nação

E Camões é património

Que merece distinção.

Eis agora Entroncamento,

Militares e mais militares,

De cabeça em cata-vento

À busca doutros ares.

Vai passar o trem em Fátima,

Mas não é peregrinação,

Pois o ambiente já em lástima

Quase a raiar a confusão.

Fátima não é o destino,

Aqui ninguém quer sair,

Pois que não é figurino

Pra nesta Quadra cair.

Estamos já em Pombal,

Já se ouve uma outra norma:

“Vejam se vai tudo normal

E cuidado co´ a plataforma.”

“Srs. passageiros, Alfarelos,

Ligação a Figueira da Foz.

Activem vossos desvelos.”

Todos ouvem a mesma voz.

À distância Coimbra é encanto

Por ser polo de Portugal

Com saudades ou com pranto

Salta à vista o seu choupal.

Ao largo está Pampilhosa,

Não sei se da serra, se do mar,

A minha ânsia pesarosa

É a vontade de chegar.

Nuvens brancas sobrepostas

Surpreendem o meu olhar

Sobre o cume das encostas

Que dá prazer ao admirar.

Está por perto a fresca Aveiro,

Uma urbe desenrascada

Que é o patamar derradeiro

Que dará fim à jornada.

Do Ovar azul suas campinas

Com regueiras horizontais,

Leves águas cristalinas

Passeando pelos canais.

Já se vê a esbelta Espinho,

Suas verdes envolvências,

Com canteiros de rosmaninho

E aromáticas essências.

Já pressinto ares de Gaia

E o comboio segue voando

E, antes que me descaia,

Fecho meus versos trovando.

Chegou o meu trem, por fim,

Muita gente dele saiu

Um amigo que espera por mim

Ao ver-me descer sorriu.

Era fim de tarde na Vila,

Um fresco cacimbo no rosto,

Minha saudade tranquila

Por, em criança, ali ser posto.

Levou-me o ilustre anfitrião

Pra vivenda acolhedora

Onde, por si, fez questão

De me receber agora.

Vencida foi a distância

Da capital até ao norte

Pra, amanhã, em militância

Ser evento doutra sorte!

Frassino Machado

In AO CORRER DA PENA

FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 11/06/2016
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