_______Enquanto dormes____________
Não podes mais me embalar
calando meus medos, pai...
Como a vida assim se esvai,
feito sal jogado ao mar?
Enquanto dormes, faz frio,
sempre cinza é nosso céu;
as noites cheias de fel
invadem nosso vazio...
Por que não dorme a saudade,
se a vida dorme também?
Se há mais mal do que bem,
por que não morre a maldade?
Enquanto dormes, ó pai,
procuro um dia de paz,
se é chuva ou sol, tanto faz,
em mim, é a noite que cai...
Lutaste para viver
e ao teu pedido de ajuda
até a fé ficou muda...
Eu me recuso a entender!
Enquanto dormes, eu rogo
que o tempo passe depressa
porque, meu pai, tenho pressa
de reencontrar-te tão logo.
Sentimos tanto tua falta!
Ah, pai... a mãe chora tanto!
Em casa ecoa teu canto,
teu riso, a tua voz alta...
Por que? Há tanta revolta,
não há pergunta que baste!
Te lembras? Me perguntaste:
“Por que esse tempo não volta?”
O tempo não voltará,
mas sou ainda a criança
que tinha em ti segurança.
Ah, pai... A vida é tão má!
Enquanto dormes no pó
parece o mundo dormir:
Sem gana pelo porvir,
é tudo escuro e tão só...
Eu sei que tudo se vai,
no fim, é este o destino!
Restou guardar teu ensino,
Enquanto dormes, papai...