Deixa-me tirar o anel
    A um ser de outro espaço que não este do Recanto



Eu já não me sei poeta
tu já não sabes da musa
nem daquela antiga seta
que tal destino confuso

há...séculos nos traçou.
Meu rosto do teu espelho
amigo, se evadiu
e também já não me olho

no meu espelho onde eu via
os sonhos que nos sonhavas
dos nossos corpos, entradas
entradas... e se partia

em voos de nunca mais.
Hoje, quando nos olhamos
já não lembramos de nós
daqueles de nós, que fomos

nem da vida que não foi.
Sei que nunca esquecerei
do que foi êxtase e luz
nos mundos que nos sonhei

eu, que de ninguém esqueço...
Tu não te esqueces também...
Nosso fado reconheço
e o reconheces, e assim

até o fim desta vida
eu te olho, tu me olhas,
ninguém nos sabe e as falas
e os silêncios, ah, perdidos

para sempre, amigo meu.
Deixa-me tirar o anel
de mim, sempre e tão fiel
ao sonho que já morreu

e deixa que morra a dor
a dor que ainda restou.
Amigo, o tempo passou
ainda que a nossa flor

exista em algum olhar
de nós...que não se partiu
que esse destino sem par
ímpar fado... nos deixou.

Deixa que eu tire este anel
que a meu modo, e tu o sabes,
te serei  sempre fiel.
Que em outro mar eu nade

ainda que eu nade só
que talvez já não me caiba
nada mais senão ser só
nada senão esta lida...

Quisera eu ser mesmo só
por poucas horas, que fora,
mas, sou de sonhos o pó,
e sei que ninguém me sonha.