Um tal de Sinhô
Vamos mudar de assunto? Vamos deixar a copa de lado? Vou falar de um tal de ‘Sinhô’...
UM TAL DE SINHÔ
- E aí cumpade?
- Bão.
- Vamo apostá quem tira a tarefa primêro?
- Vamo.
- Quem perdê vai pagá o quê?
- Vai tê de contá uma história que nóis num cunhece.
- Tão tá bão.
- Vamo fazê um paiêro primêro pra ispantá os mosquito.
- Vamo.
Depois de capinarem milho por duas horas sem parar o cumpade Zé Mutreta perdeu a aposta. Beberam uma água fresca no ribeirão, sentaram debaixo de um pé de jatobá, fizeram mais um paieiro, tomaram um golo de café e o compadre Zé começou a pagar a aposta.
- Hoje cê perdeu hein cumpade?
- Foi pro caso da mardita da inxada que desincavô.
- Será?
- Foi.
- Tá lembrano da aposta?
- Tô. O pió que tô num aperto danado proquê toda história queu sei cê tamém sabe.
- Aposta é aposta, quem perde tem que pagá.
- É.
- Mais café cumpade prá clareá as idéia.
- Daí.
- Cê sabe que se num pagá a aposta no dia que fô arrudá capiná meu mio vai tê de tirá duas tarefa.
- Tô lembrano aqui um causo que meu falecido pai contava dum tar de Sinhô. Meu pai falava que a profissão do home era passeá, pescá e contá mentira.
- Porisso que tem o ditado de que todo pescadô é mentiroso né cumpade.
- É. Diz que teve um dia que o Sinhô saiu de casa bem cedo e falô pra famía que ia caçá lá pas banda do Retiro Véio no leitêro do Sô Quinzinho. Diz que quando o leitêro parô nas terra do Florentino, cumpade dele, o Sinhô apiô do caminhão, ajudô o home tratá das vaca e foi ajudá a cumade fazê frango caipira. Meu pai falava quele contô história e cumeu frango caipira o dia intêro. Dispois de durmi um mucado, falô pro cumpade dele que tinha quimbora proquê tava escureceno e ele tinha que tentá pegá carona.
- Pegô cumpade?
- O home além de sê boa vida era de sorte. Dizia meu pai que quando ele chegô na incruziada já passô um carro e deu carona prele.
- Vai tê sorte, hein? Nessas istrada de roça a gente num arruma carona assim não.
- É, mais a sorte dele num foi tão grande não. Pegô carona cum guarda frorestar que tinha um sítio porali.
- E aí cumpade?
-O tar de Sinhô cumeçô a contá vantage. Falava pro guarda vestido queném nóis quele chamava Sinhô, o maió caçadô da região. Só naquele dia tinha matado déis capivara, oito marreco e um dourado na desova quele num deu conta de carregá. O frorestar foi dano prosa. Preguntô pro Sinhô quele fazia na cidade e ele respondeu quera aposentado cumo caçadô profissionar. Se o home preguntasse prá todo mundo ia sabê que foi ele que tinha matado a última ema que andô por essas banda. O Frorestar preguntô prele se tinha achado bão matá a última ema e o Sinhô respondeu que foi sem graça proquê deu um tiro nela no ninho, chocano seus ovinho.
- E aí cumpade?
- Dispois de iscutá tamanha sacanage, o cara parô o carro, rancô um distintivo do borso e falô pro Sinhô quele era um guarda florestar.
- E aí cumpade?
- O Sinhô cumeçô a ri, tamém infiô a mão no borso, tirô dali um canivete e um fumo de rolo, oiô prum lado, pro outo e cumeçô a picá fumo.
- Cumpade, cê tá me dechano afrito! O tar de Sinhô foi preso ou não?
- Péra cumpade. Quando o guarda deu orde de prisão o Sinhô virô prele e disse: Cê num sabe cunquem tá cunversano.
- Preguntô o guarda: Cum quem? Respondeu o Sinhô morreno de rí: Sô cê num me cunhece, eu sô o Sinhô, o home mais mentiroso da terra.
- Boa cumpade.
- Uh...